Por Hermes C. Fernandes
Entre tudo o que a presidente Dilma disse à nação em seu
discurso ontem à noite, provavelmente o que mais causou incômodo aos ouvidos
mais atentos foi o anúncio de que o Brasil estaria prestes a importar milhares
de médicos do exterior. Segundo ela, isso atenderia a crescente demanda do SUS.
A reação popular foi imediata. Bastava uma rápida checada
nas redes sociais. Dentre as muitas que encontrei, uma chamou-me a atenção pelo
seu humor: se a Dilma vai importar médicos de Cubas, queremos que o Brasil
importe políticos da Suécia.
Isso me deixou pensativo, pois revela que a população brasileira não está satisfeita com os seus
políticos.
Não vejo razão para importarmos médicos, seja de Cuba ou de
qualquer outro lugar. Talvez a motivação de Dilma seja o custo relativamente mais
barato. Algo semelhante ao que as
empresas norte-americanas têm feito transferindo suas sedes para países de
terceiro mundo em busca de mão de obra mais barata.
Políticos da Suécia também seriam bem mais em conta para os
cofres públicos! Nossos políticos ocupam
a segunda posição entre os mais caros do mundo.
Todos sabemos de onde vêm nossos médicos. Geralmente de
família abastadas, devido ao alto custo do curso de medicina nas universidades
brasileiras.
E de onde vêm nossos políticos, afinal?
O povo sai às ruas protestando contra a corrupção da classe
política. Todavia, a qualidade de nossos políticos está diretamente ligada à
estatura moral de nosso povo.
O problema da corrupção é muito mais profundo do que se pode
imaginar. A corrupção está entranhada em nossa cultura, e se expressa
eloquentemente em nosso “jeitinho brasileiro”.
Como podemos cobrar deles o que não somos? Eles são o
suprassumo da sociedade. Seu reflexo mais preciso.
Se quisermos uma classe política mais honesta, teremos que
começar da base, a família. Nossos filhos precisam aprender desde cedo o valor
da honestidade. É a família que vai fornecer à sociedade os indivíduos que
ascenderão ao poder.
Filhos que colam na escola, que se apropriam e trazem
objetos de seus colegas para dentro de casa, que não devolvem o celular
encontrado na rua, sem serem repreendidos pelos pais, serão os políticos de
amanhã.
Como os pais poderão repreendê-los e educá-los se não derem
exemplo? Pais que mentem a idade dos filhos para pagarem meio entrada no cinema,
que não devolvem o troco errado, que subornam o guarda, são um péssimo exemplo para os seus filhos.
Sinceramente, o Brasil não precisa de médicos, nem de
políticos vindos de fora. O Brasil precisa ser reeducado, e, assim, ser
reinventado.
Tomara que esta onda de protestos provoque a emergência de
uma nova consciência, pautada na honestidade, na transparência e no respeito à
coisa pública.
Devo confessar que tenho muita esperança. O Brasil vai mudar! Todavia, esta mudança não
será de cima para baixo, mas da base para o pico. Esta mudança deve começar na
família.
Fui criticado ao declarar em meu perfil no facebook que
senti-me aliviado depois do pronunciamento da presidente em rede nacional. Alguns acharam que fui ingênuo ao acreditar
em suas promessas. Permita-me explicar o que quis dizer com “aliviado”.
Havia uma expectativa no ar. Quem viveu os anos da ditadura
militar tinha razões de sobra para preocupar-se com o discurso da Dilma na TV.
Sabe aquela sensação de Déjà vu? E se ela renuncia, como fez Jânio Quadros? E
se ela resolve dissolver o congresso e dar um golpe? E se os militares resolvem depô-la, como
fizeram com Jango? Prefiro o seu “blá blá blá” insosso a ver o meu país
entrando num clima de guerra civil. Porém, dizer que fiquei aliviado não é o
mesmo que dizer que fiquei satisfeito. A diferença? A mesma entre comer uma boa
refeição e ir ao banheiro aliviar o ventre.
Só me darei por satisfeito quando vir o meu país sendo
invadido por uma onda de honestidade. Quando levantar-se uma geração de
políticos que se negue a fazer conchavos.
Décadas atrás, Dilma estava nas ruas clamando por liberdade
e justiça social. Hoje ela está no poder, juntamente com seus pares que marcharam
ao seu lado, porém, de mãos dadas com aqueles que reprimiram a sua geração.
Enojo-me toda vez que a vejo ladeada por gente como Sarney, Calheiros e Collor.
O presidente que teremos em vinte anos, provavelmente este
nas ruas esta semana. Espero que não repita o mesmo erro. Que se mantenha leal
aos seus ideais. Que não se venda. E isso vai depender diretamente da educação
que houver recebido dentro de casa. A revolução
que almejamos não começa nas ruas, mas dentro de casa.
Da próxima vez que disser “sim” ou “não” aos seus filhos, lembre-se
disso.