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Para que um gay seja cristão tem que reverter sua orientação sexual?

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Por Hermes C. Fernandes

Nesta semana, uma das mais badaladas igrejas do mundo protagonizou outro escândalo (Sim, não foi o primeiro!). Segundo uma matéria divulgada nas redes sociais, a Hillsong teria ordenado um casal de homossexuais como ministros de louvor de sua filial em Nova Iorque. Em menos de vinte e quatro horas, o pastor Brian Houston, presidente da igreja australiana, veio à público desmentir a matéria, afirmando que sua posição quanto à prática homossexual segue a ortodoxia evangélica, e que, tão logo os dois ministros de louvor admitiram seu relacionamento, foram afastados de seus postos. Fica a impressão de que, se eles não houvessem assumido sua orientação sexual e seu relacionamento não se tornasse público, teriam sido mantidos no cargo. Sem querer emitir qualquer juízo, confesso meu desconforto com posturas que beiram a hipocrisia. É cada vez mais rara uma igreja em que não haja homossexuais envolvidos diretamente com ministérios de louvor, dança ou teatro. Se eles se comportarem direitinho, ninguém vai implicar. Mas se forem atrevidos o bastante para assumir o que são, correm o risco de não apenas serem removidos do cargo, mas também serem excluídos do rol de membros da igreja. Estamos mais preocupados com a língua do povo e com a nossa reputação do que em comprar a briga deste segmento tão sofrido e discriminado.

Deixe-me relatar a conversa que tive com um colega de turma. Um rapaz com inteligência acima da média. Não raramente roubava a cena durante a aula de psicologia, explicando a matéria com mais desenvoltura que o próprio professor. Duas coisas percebi nele, mesmo antes de ter tido a oportunidade de conversar, uma pelo trejeito, e outra, pelo uso de certos jargões. Ele era gay e já havia sido evangélico. Num dia em que a professora atrasou-se para aula, tivemos a oportunidade de trocar ideias. Ele me confessou ter sido criado na igreja, chegando a ser presidente do grupo jovem. Quando percebeu-se homossexual, lutou bravamente para libertar-se (sic). Jejuou por um ano inteiro. Orou. Chorou. Participou de reuniões de libertação. Submeteu-se a sessões de exorcismo. Mas, nada. Ele continuava sentindo-se atraído por pessoas do mesmo sexo. Vendo que a igreja não se dispunha a acolher quem se assumisse como gay, ele resolveu se afastar. Aparentemente emocionado, contou-me que tentou recorrer a outras religiões. Frequentou centro de umbanda, templo budista, reuniões kardecistas, mas não conseguiu se achar. “O problema é que sou cristão”, confidenciou-me.

Desde que comecei a escrever sobre o tema em meu blog, já recebi muitos e-mails e mensagens in box de pessoas em crise por causa de sua orientação sexual. Algumas considerando tirar a própria vida, outras já teriam tentado suicídio várias vezes. É fácil julgar moralmente quando se coloca de lado o coração. Mas quando a gente se aproxima desprovido de preconceito, o coração se enternece. Principalmente quando se trata de um adolescente. “Poderia ser um filho meu”, ponderamos. O que dizer a esses indivíduos? Que não tiveram fé suficiente para se libertarem? Que não amam a Cristo o bastante para renunciar seus sentimentos “pervertidos”? Que encabeçam a lista dos que serão lançados no inferno?

Não reconheço área mais complexa da natureza humana do que a sexualidade. Quanto mais busco compreendê-la, mas percebo quão rasas são as abordagens que tentam dissecá-la. A situação se agrava quando adentramos a questão da diversidade sexual.

Respostas prontas ofendem a sensibilidade e a inteligência dos que se debruçam sobre o assunto. Já ouvi inúmeras vezes o argumento de que se Deus aprovasse a homossexualidade, não teria criado Adão e Eva, mas Adão e Ivo. De fato, só existem dois gêneros sexuais: macho e fêmea. Porém, os espinhos, cardos e abrolhos que passaram a crescer em nosso habitat desde o evento que a teologia chama de “queda”, também brotaram na própria natureza humana, afetando seus relacionamentos, seu comportamento, seu psiquismo. O mundo ideal ficou atrás do portão do paraíso. Condenados ao exílio, os humanos tiveram que aprender a lidar com as demandas de um mundo real, por vezes hostil à sua presença.

Sabiamente, Jesus nos descortina esta realidade ao abordar um dos mais delicados assuntos no campo do relacionamento humano: o divórcio. Segundo o mestre galileu, o divórcio não constava do plano original de Deus. Ele não apenas o reprova, como também o detesta (Ml.2:16). Mesmo assim, nos dias de Jesus, o divórcio havia se banalizado. Os homens estavam despedindo suas esposas por qualquer bobagem, e se justificavam na autorização dada por Deus através de Moisés (Dt.21:1).

Perguntado se era lícito ao homem divorciar-se da mulher por qualquer motivo, Jesus respondeu:

Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, e disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne?Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la?Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim.” Mateus 19:4-8

Repare na última frase: “ao princípio não foi assim”. O divórcio foi uma concessão divina em resposta a uma demanda humana em seu trânsito pelo mundo real. Não significa que Deus endosse tal prática. Porém, Jesus reconheceu a necessidade desta alternativa frente à dureza da natureza humana. Dizer que nem sempre foi assim equivale a afirmar que este não é o ideal de Deus para o ser humano. O ideal é que ele se case e continue casado com a mesma pessoa até o fim. O ideal é que o casamento seja monogâmico, indissolúvel e entre pessoas de sexos opostos. Todavia, nem sempre é isso que acontece. Temos, portanto, que tratar a situação de maneira realista.

Desde que atravessamos os portões do Éden, tantas coisas mudaram. E provavelmente, nenhum outro campo sofreu tantas alterações quanto o dos relacionamentos.

Recebi um comentário em meu blog que me chamou a atenção. Resolvi compartilhá-lo na timelinedo meu perfil no facebook para saber o que as pessoas pensavam sobre o argumento apresentado; o que acabou originando um debate que me desafiou a pensar um pouco mais sobre o tema. Reproduzo abaixo o comentário postado por um anônimo:

"Diante destas investidas satânicas, fico a imaginar: o que seria da humanidade sem o nascimento de figuras ilustres e que, de fato, trouxeram algo de bom, de construtivo para a humanidade. Figuras como Albert Einstein, maior cientista do século XX, Martin Luther King, o símbolo máximo da luta contra uma das pragas do século XX, o racismo, Henry Ford, Ludwig van Beethoven, compositor alemão, enfim, a lista é imensa e nas mais diversas áreas do conhecimento humano. Será que estas pessoas nasceram do nada? Ou nasceram de chocadeira? Com certeza que não, nasceram de um relacionamento amoroso entre um homem e uma mulher! NASCERAM no seio de uma família tradicional. Ainda dentro do meu círculo imaginário, pensei: e se a MÃE ou PAI destes defensores desta abominável aberração (DIVERSIDADE SEXUAL) tivessem optado por serem GAYS. Conclui que uma coisa seria certa, não estaria eu, neste momento, perdendo o meu tempo precioso escrevendo este texto.”

Imagino o prazer sentido pelo comentarista ao achar que estava dando a palavra final sobre a questão. Xeque-mate! Confesso que não perderia tempo respondendo a este infeliz comentário se não verificasse que é exatamente assim que muitos pensam.

Ora, o argumento usado poderia ser aplicado também em casos de esterilidade. Quem é incapaz de conceber filhos não teria o direito de se casar? Somente a concepção de uma prole justificaria nossa passagem por este mundo? E quanto aos celibatários? Quem opta pelo celibato estaria desperdiçando a vida? Convém lembrar de que o próprio Jesus era celibatário, juntamente com Paulo, João Batista e tantos outros. Portanto, se quiser combater a diversidade sexual terá que apelar a outro argumento, e espero que mais sólido.

Ademais, graças ao fato de muitos não poderem ter filhos biológicos, tantas crianças órfãs ou abandonadas puderam ser adotadas. 

Quanto à diversidade sexual em si, devemos considerar que muitos personagens proeminentes da história foram homossexuais. Não nos deixaram filhos, porém, deixaram-nos um legado valioso. Um exemplo disso foi Santos Dumont, de quem todo brasileiro se orgulha por ter inventado o avião, além do relógio de pulso (espero que ninguém resolva boicotar nenhum dos dois...rs). O pai da viação acabou se suicidando. Segundo alguns dos seus biógrafos, por ver sua invenção usada como arma na primeira grande guerra. Mas para outros, o que o teria levado ao suicídio foi uma depressão profunda devido à sua sexualidade.

Alan Turing, matemático e cientista da computação foi um dos responsáveis pela formalização do conceito de algoritmo, base da teoria da computação. Também foi o inventor da Máquina de Turing, precursora do computador moderno. Em sua condição de homossexual, Turing não deixou herdeiros, mas deixou um legado e tanto. Consegue imaginar um mundo sem computador?

Falta-me tempo e disposição para falar de tantos outros como o gênio Leonardo da Vinci, o conquistador Alexandre, o Grande, e Sócrates, o pai da filosofia clássica. Portanto, não se deve julgar o caráter ou a genialidade de um ser humano por sua orientação sexual.

Enquanto expunha tais fatos em minha timeline, surgiram várias questões. Uma recorrente é se acredito que um homossexual possa ter sua orientação sexual transformada. Em outras palavras, se um gay pode tornar-se heterossexual.

Primeiro, quero deixar claro que para Deus tudo é possível. Se Ele quiser, pode fazer nascer cabelo em careca, fazer um branco tornar-se negro ou vice-versa, e até possibilitar que um animal fale. Porém, tenho minhas dúvidas se haja n’Ele o interesse de realizar tais proezas.

O que me cansa é ver a exploração que se faz em cima do testemunho de pessoas que teriam sido homossexuais e que agora exibem seus cônjuges e filhos como prova de que foram transformadas, apesar de algumas manterem trejeitos efeminados (não há aqui juízo de valor).

É um crime impor a um gay que mude sua orientação sexual para evidenciar sua conversão. Conheço casos em que a pessoa contraiu matrimônio por pressão da igreja, e tempos depois não havia nem sequer consumado o ato. Nesses casos, acho bem mais louvável que se abdique voluntariamente de uma vida sexual ativa por amor à causa do evangelho. É mais honesto do que forjar uma transformação. Porém, isso jamais deveria ser imposto a ninguém. É desumano.

Há, todavia, casos de pseudo-homossexuais que se tornaram o que, no fundo, jamais deixaram de ser, héteros. Algumas delas se lançaram na prática homossexual devido a contingências tais como abusos sofridos na infância, influências externas como amigos, mídia, cultura, educação, etc., mas jamais perderam o desejo por pessoas do outro sexo. Muitas acabam adotando um comportamento bissexual. Porém, em boa parte das vezes, o que ocorre é que a pessoa anuncia ter sido transformada, casa-se com alguém do sexo oposto, mas segue nutrindo desejos inconfessáveis por pessoas do mesmo sexo. Não ouso por em xeque sua conversão. Elas amam a Cristo e sentem-se amarguradas por terem que lidar com tais pulsões. Se ao menos a igreja fosse mais complacente, não haveria necessidade disso.

A igreja deveria ser aquele lugar de que Paulo fala: “Onde está o Espírito de Deus, aí há liberdade”. Não se trata de liberdade para viver promiscuamente, mas para ser o que se é, sem medo de ser rejeitado, olhado com nojo e preconceito. Em vez disso, a igreja se tornou num antro de discriminação. Os púlpitos destilam homofobia, e tudo, cínica e ironicamente “em nome do amor”.

Há, ainda, uma falácia que tem sido disseminada principalmente por pregadores televisivos: a de que ninguém nasce gay. E isso geralmente é dito como se fosse cientificamente comprovado. Para quem vive refém do ambiente eclesiástico, uma declaração como esta, não influi, nem contribui. Mas quem transita por outros ambientes, principalmente o acadêmico, tem que aturar piadinhas e insinuações grosseiras por conta deste tipo de posicionamento anacrônico e infundado.  

Se não quiserem dar ouvidos às últimas descobertas científicas, que ouçam o próprio Jesus que afirma haver ao menos três classes de eunucos: os que foram feitos eunucos (castrados para que pudessem cuidar dos haréns dos reis sem se constituir ameaça à integridade da rainha e de suas concubinas), os que se faziam eunucos pelo reino de Deus (celibatários como Paulo) e os que nasciam nesta condição, isto é, desprovidos de desejo por pessoas do sexo oposto. Pesquisas revelam que os eunucos eram, em geral, homossexuais.  Portanto, segundo Jesus, a homossexualidade pode ser de nascença.

No debate que fomentei no facebook, perguntaram-me se eu não pregava contra o homossexualismo e lesbianismo (sic). Respondi que prego contra o pecado que há em nós, em nossa natureza caída, e que se manifesta tanto na vida do homossexual, quanto na vida do heterossexual. Mas me recuso a entrar nesta campanha sórdida que a igreja evangélica tem travado com os gays, e que, no fundo, tem cunho político. Descobriram aí uma mina de votos. Se amassem mais às almas do que os votos, olhariam para a causa homossexual com mais compaixão e amor, em vez de fomentarem tanto preconceito e ódio.

Repito: creio que por amor a Cristo, tanto o gay, quanto o hétero, podem ofertar sua sexualidade, isto é, renunciar suas pulsões para dedicarem-se exclusivamente à causa do reino de Deus. Porém, não me vejo capaz de impor isso a ninguém. Paulo dizia que gostaria que todos fossem como ele, porém, reconhecia que cada um tinha recebido de Deus o seu próprio dom. Portanto, acredito num celibato consciente, fruto do amor e não de imposição de terceiros. O que me recuso a acreditar é que alguém possa mudar sua orientação sexual mediante pressões externas.

E, sinceramente, creio que a existência do homossexual serve a um propósito divino: por à prova nosso amor e desafiar nossos preconceitos.

Se Deus pode mudá-los? Quem sou eu para limitar o Seu poder? Ele também podia ter removido o espinho que havia na carne de Paulo, mas não o fez, alegando que a Sua graça deveria ser suficiente. 

* Este é o primeiro de uma série de posts sobre o assunto. 

Manual de instruções para uma Igreja Construtiva - Por Martin Luther King

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Martin Luther King, Jr - (1929 - 1968) 

Por Martin Luther King

Esta manhã eu gostaria de submeter a vocês que nós, seguidores de Jesus Cristo, que mantemos sua Igreja viva e caminhando, também temos um manual de instruções a seguir. Em algum lugar por trás da névoa escura da eternidade, Deus estabeleceu seu manual de instruções. E através de seus profetas, e acima de tudo, através de seu Filho Jesus Cristo, Ele diz: “Há algumas coisas que minha Igreja deve fazer. Há um manual que minha Igreja deve seguir.” E se nós, dentro da Sua Igreja, não quisermos veros recursos da sua graça cortados de sua divina providência, temos que seguir este manual. Ele está claramente estabelecido para nós em algumas palavras proferidas pelo nosso Senhor e Mestre assim que ele, um dia, entrou na sinagoga, e fez uma leitura no livro do Profeta Isaías: “O Espírito do Senhor é sobre mim, porque Ele me ungiu para pregar as Boas Novas aos pobres, ele me enviou para dar vista aos cegos, para trazer à liberdade os que estão cativos, para pregar o ano aceitável do Senhor”. Estas são as instruções.

Veja você, a Igreja não é um clube social, apesar de que algumas pessoas pensam assim. Eles são apanhados em seus exclusivismos, e acham que ela é uma espécie de clube social com um leve viés de religiosidade, mas a Igreja não é um clube social. A Igreja não é um centro de entretenimentos, apesar de que algumas pessoas pensam que ela seja. Você pode dizer que em muitas igrejas como eles agem, revelando que pensam que ela é um centro de entretenimento. A igreja não é um centro de entretenimento. Macacos são para entreter, mas pregadores não.

Em uma análise final, a Igreja tem um objetivo. A igreja está tratando do ultimato ao homem. E por isso ele deve seguir as instruções.

Eu desejo que o tempo me permita entrar em cada aspecto deste texto, mas quero apenas fazer menção a alguns deles. Vamos primeiro pensar no fato de que a Igreja esteja seguindo seu manual, procurando curar os quebrantados de coração. Não há provavelmente nenhuma outra condição humana mais atormentadora do que um coração quebrantado. Veja você que um coração quebrantado não é uma condição física; mas uma situação de esvaziamento espiritual. E quem aqui esta manhã já não experimentou um coração quebrantado?

Eu diria que um coração quebrantado vem basicamente da experiência de uma frustração. E eu não acredito que haja muitas pessoas aqui nesta manhã sob o som da minha voz que não ficaram desapontadas por alguma coisa.

Aqui está um jovem ou uma moça sonhando com um grande carreira e pretendendo chegar na escola para tornar possível aquela carreira. Até descobrir que ele não tem faculdades mentais o bastante, a experiência técnica, para adquirir excelência naquele determinado campo. E assim ele termina por escolher a segunda alternativa de vida melhor, e por isso  termina com um coração quebrantado.

Aqui está um casal de pé diante do altar em um matrimônio que parecia ter nascido no céu, somente até descobrir que, seis meses depois ou um ano mais tarde, os conflitos e dissensões surgiram; argumentos e desentendimentos começaram a aparecer. E aquele mesmo casamento que há um ano atrás parecia ter nascido no céu, termina na justiça civil e os indivíduos ficam com um coração quebrantado.

Aqui está uma família, a mãe e um pai se esforçando desesperadamente para educar seus filhos, no caminho que eles devem andar. Trabalhando muito, para conseguir uma boa educação para eles; trabalhando duro para lhes dar um senso de direção, orando fervorosamente por sua orientação. E, de repente, a despeito de tudo, um ou dois filhos terminam por entrar em um caminho errado em direção a um país longínquo estranho e trágico. E os pais vêm a saber que aqueles filhos que eles criaram são pródigos, que estão perdidos em um país distante, e assim eles terminam com um coração quebrantado.

E depois vem aquela última tragédia, que sempre produz um coração quebrantado. Quem aqui nesta manhã não experimentou isto? Quando você fica diante do caixão de um ente querido. Naquele dia quando se fecham as cortinas da vida, aquela experiência chamada morte, que é o denominador comum irredutível de todos os homens. Ninguém perde um amado, ninguém perde uma mãe ou o pai, a irmã, o irmão, uma criança, sem ficar com um coração quebrantado. Corações quebrantados são uma realidade na vida.

E domingo após domingo, semana após semana, as pessoas vêm à Igreja de Deus com os corações quebrantados. Elas necessitam de uma palavra de esperança. E a Igreja tem uma resposta – se ela não tiver, ela não é uma Igreja. A Igreja deve dizer que, em essência, que quebrantadura de corações é um fato na vida. Não tente escapar quando você passa por uma experiência dessas. Não tente reprimi-la. Não termine em cinismo. Não fique com pena de si mesmo quando vier esta experiência. A Igreja deve dizer para este homem e para esta mulher que a "Sexta-feira da Paixão" é um fato na vida. A Igreja deve dizer para as pessoas que a queda é um fato na vida. Algumas pessoas estão condicionadas somente ao sucesso. Elas estão condicionadas apenas a realizações. Então quando as provas e os fardos da vida sobrevêm eles não conseguem se aguentar de pé com eles. Mas a Igreja deve dizer aos homens que a "Sexta-feira da Paixão" é um fato na vida, como a Páscoa. Quedas na vida são fatos muito mais freqüentes que sucessos. Frustrações são um fato muito mais freqüente que realizações. E a Igreja deve dizer aos homens para tomar seus fardos, tomar suas tristezas e olhar para elas e não correr delas. Diga esta é a minha tristeza, e eu devo suportá-la. Olhe bem duro para ela e diga: Como posso transformar este passivo em um ganho?

Este é o poder que Deus deu a você. Ele não disse que você vai escapar das tensões; Ele não disse que você vai escapar das frustrações, Ele não disse que você vai escapar das provas e tribulações. Mas o que a religião diz mesmo é que: Se você tiver fé em Deus, que Deus tem o Poder de dar a você um espécie de equilíbrio interior através da sua dor. Então não se turbe o vosso coração. Se você crer em Deus, e também crer em mim” Outra voz ecoa “Vinde a mim, todos que estão fatigados e estão sobrecarregados” Como se dissesse: Vinde a mim, todos vós que estais sobrecarregados. Vinde a mim todos vós que estais frustrados. Vinde a mim todos vós com nuvens de ansiedade flutuando sobre o céu das vossas mentes. Vinde a mim todos vós que estais quebrados. Vinde a mim todos vós que estais com os corações quebrantados. Vinde a mim todos vós que estais sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. E o descanso que Deus dá é um que ultrapassa todo entendimento. O mundo não entende este tipo de descanso, porque ele é um descanso que torna possível a você ficar de pé em meio as tempestades exteriores, enquanto você mantém a calma interior. Se a Igreja está verdadeiramente em suas , ela cura os corações dos quebrantados

Em segundo lugar, quando a Igreja está verdadeiramente dentro do manual, ela tem o desejo de pregar a libertação para aqueles que estão cativos. Este é o papel da Igreja: Libertar as pessoas. Isto quer dizer de forma simples, libertar àqueles que estão escravos. Agora se você observar algumas Igrejas elas nunca lêem esta parte. Algumas igrejas não estão preocupadas em libertar ninguém. Algumas Igrejas brancas enfrentam o fato de domingo após domingo de que seus membros são escravos do preconceito, escravos do medo. Você tem em um terço delas, a metade delas ou mais, escravos de seus preconceitos. E os pregadores raramente fazem alguma coisa para libertá-los do preconceito.

Depois, você tem um outro grupo assentado ali, que realmente gostaria de fazer alguma coisa conta a injustiça racial, mas eles têm medo das represálias econômica, políticas e sociais, assim eles ficam em silêncio. E os pregadores nunca diz alguma coisa para levantar suas almas e libertá-las daquele medo. E assim eles terminam cativos. Vocês sabem que isto também acontece nas Igrejas negras. Vocês sabem que há pregadores negros que nunca abriram suas bocas em favor do movimento da liberdade. E não apenas eles não têm aberto suas boas, com não têm feito qualquer coisa. E de vez em quando você tem alguns membros que falam demais sobre os direitos civis naquela Igreja. Eu estava conversando com um pregador, outro dia, e ele me contou que alguns membros da sua Igreja estavam dizendo isto. Eu disse: não preste atenção no que eles dizem. Porque, número 1: Não foram os membros que ungiram você para pregar. E qualquer pregador que permite que seus membros lhe digam o que deve pregar, não tem nada de pregador.

Para que estas instruções fiquem bem claras, Deus me ungiu. Nenhum membro da Igreja Batista Ebenezer convidou-me para o ministério. Você me chamou para a Ebenezer e pode tirar-me daqui, mas você não pode tirar-me do ministério, porque eu consegui o manual e minha unção do Deus todo Poderoso. E qualquer coisa que eu quiser dizer, eu vou dizer aqui deste púlpito. Isto pode ferir alguém, eu não quero saber, alguém pode não concordar com isso. Mas quando Deus fala, quem mais pode profetizar? A palavra do Senhor é sobre mim como um fogo cerrado em meus ossos, e quando a palavra de Deus vem sobre mim, eu tenho que dizê-la, Eu tenho de contá-la a todos em qualquer lugar. Porque Deus me chamou para libertar aqueles que estão no cativeiro.

Algumas pessoas estão sofrendo. Algumas pessoas estão famintas esta manhã. Algumas pessoas ainda estão vivendo em segregação e discriminação esta manhã. Eu vou pregar sobre isto. Eu vou lutar em favor delas. Eu morrerei por elas se necessário, porque eu tenho o meu manual bem claro. E o Deus a quem eu sirvo, e o Deus que me chamou para pregar, já me disse que de vez em quando eu terei que ir preso por elas. De vez em quando eu terei que agonizar e sofrer pela liberdade de suas crianças. Eu posso até ter que morrer por isso. Mas se isto é necessário, eu preferiria seguir o manual de Deus do que o manual dos homens. A igreja foi chamada para por em liberdade aqueles que estão cativos, para por em liberdade aqueles que são vítimas da escravidão da segregação e da discriminação, aqueles que foram apanhados na escravidão do medo e do preconceito.

Então, a Igreja, que está verdadeiramente dentro do manual, deve pregar o ano aceitável do Senhor. Você sabe que o ano aceitável do Senhor é o ano que é aceitável para Deus porque preencheu os requisitos do seu Reino. Algumas pessoas quando estão lendo esta passagem sentem que isto está falando a respeito de um período além da história, mas eu digo a vocês nesta manha que o ano aceitável do Senhor pode ser este ano. E a Igreja é chamada para pregá-lo.

O ano aceitável do Senhor é qualquer ano quando os homens decidirem fazer o certo.

O ano aceitável do Senhor é qualquer ano quando os homens pararão de mentir e enganar.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano quando mulheres começarão a usar o telefone para propósitos construtivos e não para espalhar fofocas maliciosas ou boatos sobre seus vizinhos.

O ano aceitável do Senhor é qualquer ano quando os homens pararão de jogar fora as preciosas vidas que Deus lhes tem dado em um viver sedicioso.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano quando o povo no Alabama pararão de matar o direito civil dos trabalhadores e o povo que simplesmente está engajado no processo de busca pelos seus direitos constitucionais.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens aprenderam a viver juntos como irmãos.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens manterão suas teologia ao lado de suas tecnologias;

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens manterão os fins pelos quais eles vivem ao lado dos mesmos meios em que vivem.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens guardarão sua moralidade ao lado de sua mentalidade

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que todos os líderes mundiais se assentarem junto à mesa de conferência e perceberem que a menos que a humanidade ponha um fim na guerra, a guerra vai por um fim na humanidade.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens converterão suas espadas de em relhas e suas lanças em ganchos e que as nações pararão de se levantar umas contra as outras, nem estudarão a guerra nunca mais.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens permitirão que a justiça role para baixo como águas e a retidão desça como uma poderosa corrente.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que nós enviaremos ao Congresso e às Assembléias estaduais de nossa nação homens que procederão justamente, que amarão a misericórdia e que caminharão humildes com o seu Deus.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que todo o vale será exaltado, e cada montanha será rebaixada, que os lugares ásperos seriam aplainados e que os os lugares tortuosos, retos, e a glória do Senhor será revelado, e toda carne verá verão isto em junta.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens farão para os outros aquil que eles querem que os outros façam para eles

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens amarão seus inimigos, abençoarão aqueles que os maldizem e orarão por aqueles os perseguem.

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que os homens descobrirão por causa do sangue Deus fez todos homens para habitarem sobre a face da terra

O ano aceitável do Senhor é aquele ano em que todo joelho se dobrará e toda língua confessará o nome de Jesus. E em todos os lugares os homens clamarão “Aleluia, Aleluia! O Reino deste mundo tem se transformado no Reino de Nosso Senhor de de seu Cristo, e ele reinará por todo o sempre. Aleluia, aleluia!”

O ano aceitável do Senhor é o ano de Deus.

Estas são as instruções do manual, e se nós apenas seguirmos o manual, nós estaremos aptos para o Reino de Deus, e nós faremos aquilo que a Igreja de Deus é chamada para fazer. Nós não seremos um pequeno clube social. Nós não seremos um pequeno centro de entretenimento. Mas estaremos em um negócio sério, de trazer o Reino de Deus para esta terra.

Parece que eu já posso ouvir o Deus do universo sorrindo e falando para esta igreja, dizendo “Vocês são uma grande Igreja, porque eu estava faminto, e vocês me deram de comer. Vocês são uma grande Igreja porque eu estava nu, e vocês me deram o que vestir. Vocês são uma grande Igreja, porque eu estava enfermo e vocês me visitaram. Vocês são uma grande Igreja porque eu estava na prisão e vocês me consolaram e visitaram. E esta é a Igreja que é vai salvar este mundo. “O espírito do Senhor é sobre mim, porque ele me ungiu para curar os quebrantados de coração, e por em liberdade os cativos, e apregoar o ano aceitável do Senhor.


Sermão pregado pelo Pastor Martin Luther King (Guidelines for a constructive Church) (Via Vencidos pelo Tempo)

Ser gay não é uma opção! - Descobertas as razões biológicas da homossexualidade

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Por Hermes C. Fernandes 

Em posts anteriores, abordei o preconceito sofrido pelos homossexuais, e defendi que a igreja deveria acolher respeitosamente a tais indivíduos. Mas a partir deste ponto, quero dar um passo além. Sei dos riscos que corro. Porém, não me vejo em condição de me acovardar ante o sofrimento de tantos por causa de sua orientação sexual. 

Como já tenho alardeado, homofobia é pecado. E quanto à homossexualidade, poderíamos dizer o mesmo? É pecado ser homossexual? O que diz a Bíblia acerca disso? O que dizem as últimas descobertas científicas? Sim, uma questão está intimamente ligada a outra, porque, se for comprovado cientificamente que a orientação sexual tem fatores biológicos, logo, teremos que rever o que tem sido dito acerca da homossexualidade em nossos púlpitos. Como Deus poderia condenar algo sobre o qual o indivíduo não tenha qualquer controle? Se o próprio Deus o criou nessa condição, que culpa lhe restaria? 

Por favor, em nome do amor, peço que leia as próximas linhas, não apenas com a mente aberta, mas, sobretudo, com o coração enternecido. Lembre-se de que poderia ser um filho seu. 

Vamos começar pela ciência. No próximo post, abordarei o tema sob o prisma bíblico. É verdade que ninguém nasce gay? Aquele papo de que não há gene gay procede? Quando alguém resolve sair do armário, ele ou ela se tornaram gay ou simplesmente resolveram assumir sua orientação sexual? Afinal, ser gay é uma opção ou orientação? Sejamos sinceros: alguém em sã consciência optaria por ser alvo de todo tipo de ódio e preconceito? Você consideraria isso uma opção razoável? A menos que, além de homossexual, fosse também masoquista. Se concluirmos que é uma opção, então, ninguém nasce nesta condição. Trata-se de um comportamento aprendido. Simples assim. Logo, Malafaia, Feliciano e Marisa Lobo estariam cobertos de razão. Tudo dependeria do ambiente e/ou da educação recebida. Porém, se concluirmos que é uma orientação, logo, teremos que admitir que se trata de uma condição inata. 

O fato de alguém ter sido violentado quando criança explicaria sua homossexualidade? Será que todo gay foi molestado na infância? E os que por ventura foram violentados, não o teriam sido por já manifestarem trejeitos que acabaram atraindo os predadores? Veja: não se trata de culpá-los pela violência sofrida. Nada justifica esta monstruosidade. O fato é que meninos com trejeitos femininos podem atrair a atenção de pedófilos, tanto como meninas. Pais que têm filhos homossexuais deveriam redobrar sua atenção e orientar seus filhos a evitar contato com pessoas que demonstrassem tal índole. Mas, afinal, o que diz a ciência?

Estudos biológicos indicam que a formação da sexualidade acontece antes mesmo do nascimento. Parte disso se deve aos genes, mas também há fatores que atuam no desenvolvimento do feto. Bem da verdade, não há nada comprovado. Entretanto, as evidências que estão surgindo a cada dia têm potencial para provocar uma revolução no pensamento científico. Se forem comprovadas, podem subverter o entendimento que temos acerca da homossexualidade, fazendo com que deixemos de encará-la como um comportamento antinatural, e, por conseguinte, pecaminoso.

Entre os séculos 19 e 20 a psiquiatria considerava a homossexualidade como um transtorno mental resultantes de uma educação equivocada. Se tal teoria fosse comprovada, então, seria plausível acreditar numa reversão da homossexualidade, bastando que o indivíduo fosse submetido a terapias baseadas em teorias de condicionamento. Em 1973, a Associação Psiquiátrica Americana decidiu tirar de sua lista de distúrbios mentais a atração sexual por pessoas do mesmo sexo. A partir daí, o termo homossexualismo foi substituído por homossexualidade, uma vez que o sufixo “ismo” denotava doença. Em 1991, o neurocientista Simon LeVay afirmou ter encontrado diferenças em cérebros de homens gays e héteros, depois de examinar o hipotálamo, zona cerebral responsável pela sexualidade, e descobrir que a região chamada INAH-3 era entre duas e três vezes menor nos homossexuais. Aquela foi a primeira evidência da origem biológica da homossexualidade. LeVay acreditava que algo acontecia ainda no ambiente intrauterino que afetaria a sexualidade do indivíduo. [1] 

Surge, então, a embaraçosa questão: o que ocorreria para definir a orientação sexual e não apenas seu gênero? Haveria um gene gay? Em 1993, o geneticista Dean Hamer, do Instituto Nacional do Câncer nos Estados Unidos, percebeu que a ocorrência de gays era maior do lado materno das famílias. Sua descoberta chamou sua atenção para o cromossomo X. Com um escâner, Hamer viu que uma região do cromossomo X, chamada de Xq28, era idêntica em muitos irmãos gays. Pode-se dizer que em vez de descobrir um gene gay, ele encontrou uma tira inteira de DNA.[2] A conexão entre a orientação sexual e os genes sugeria que ninguém escolhia ser homossexual, antes, tratava-se de uma condição congênita. Portanto, já não se podia dizer que a homossexualidade seria antinatural. Pelo menos, não à luz das descobertas científicas. 

Não obstante, pesquisas mais recentes dão conta de que a homossexualidade transcende o componente genético. A maior evidência disso é o caso de gêmeos, onde, apesar de serem geneticamente semelhantes, apenas um desenvolve a homossexualidade. Ora, se a causa da homossexualidade fosse estritamente cromossômica, os dois deveriam apresentar a mesma orientação sexual. Todavia, de acordo com os pesquisadores americanos Michael Bailey e Richard Pillard, entre gêmeos bivitelinos, quando um é gay, o outro teria 22% de possibilidade de ser gay. Já entre univitelinos, a probabilidade é maior que o dobro: 52%. Considerando que a taxa entre a população estaria entre 2% e 5%, fica provado a existência de um componente genético na homossexualidade.[3] 

Entretanto, fica igualmente provado que os genes não são a resposta para tudo nesta questão. Segundo o pesquisador Alan Sanders, os estudos com gêmeos sugerem uma estimativa de que até 40% da orientação sexual deva-se à influência genética. E quanto aos outros 60%? Uma possível resposta seria o desenvolvimento biológico do feto no ambiente intrauterino. De acordo com uma das mais promissoras pesquisas neste campo, os hormônios sexuais masculinos (andrógenos) se conectam às partes responsáveis pelos desejos sexuais no cérebro, influenciando seu crescimento, tornando o cérebro mais tipicamente masculino ou feminino. A conexão dependeria das proteínas receptoras de andrógenos. Supondo que cada célula do cérebro fosse uma casa, as proteínas receptoras de andrógenos (AR) funcionariam como o portão que controla a entrada. A quantidade e localização desses portões variam entre homens e mulheres. O hipotálamo masculino tem mais ARs que o feminino, por exemplo. Segundo esta teoria, a homossexualidade nos homens seria causada por portões que restringiriam a entrada de andrógenos nas regiões responsáveis pela sexualidade, produzindo, assim, um cérebro submasculinizado. Já nas mulheres, esses portões facilitariam entradas maiores, produzindo uma estrutura supermasculinizada. Tudo, portanto, seria consequência do número de ARs de cada feto, que possivelmente estaria relacionado à carga genética. Apesar de os cientistas admitirem que se trata de um processo complexo, o fato é que as pistas da ação dos hormônios pré-natais estão por toda a parte, revelando-se até nos aspectos físicos. É importante ressaltar que os hormônios importantes na formatação da orientação sexual não são os que circulam no sangue nos adultos, e cujos níveis são iguais entre héteros e homossexuais, e sim os hormônios que atuaram durante a gestação. 

Fica desacreditada e descartada a hipótese de que o abuso sexual na infância seria a causa da homossexualidade, como também a que sugere que haja mais probabilidade de que haja gays em lares chefiados por mulheres ou entre filhos criados por casais de homossexuais. Dean Hamer conclui que os fatores biológicos (genes e hormônios) seriam responsáveis por mais de 50% da orientação sexual. Os outros quase 50% podem ser atribuídos a fatores psicológicos e sociais. Em outras palavras, a predisposição à homossexualidade vai se manifestar dependendo das experiências de vida da pessoa. Alguns indivíduos aprendem a sublimar, outros simplesmente se abdicam de sua sexualidade por uma causa maior. Estudo feito pelo Instituto Karolinska na Suécia, publicado em 2005, detectou através do escaneamento de atividades cerebrais que homossexuais homens apresentam resposta fisiológica aos feromônios do sexo masculino igual às mulheres heterossexuais, evidenciando claramente um componente biológico na orientação sexual. 

No mesmo ano, os pesquisadores Gleen Wilson e Qazi Rahm publicaram sua conclusão de que a orientação sexual seria determinada por uma combinação de fatores genéticos e atividade hormonal durante a gestação, e que as experiências posteriores na infância, bem como o ambiente familiar, a educação e a escolha pessoal teriam pouca ou nenhuma influência no assunto. [4] De acordo com os autores, homossexuais nascem homossexuais, e a proporção de indivíduos com esta orientação sexual na população mundial parece não variar significativamente. Em 1994, a Associação Americana de Psicologia declarou que a investigação científica sugere que a orientação sexual é determinada muito cedo no ciclo da vida, possivelmente antes mesmo do nascimento. 

Homossexualidade no reino animal 

Se o comportamento homossexual fosse antinatural como defendem alguns, como explicar o fato de ser tão comum no reino animal, envolvendo desde insetos até mamíferos? Pesquisa feita em 1999 pelo biólogo canadense Bruce Bagemihl [5]  revela que o comportamento homossexual já foi observado em cerca de 1500 espécies animais, desde primatas até vermes intestinais, e foi bem documentado em pelo menos 500 delas.[6] Dados atuais indicam que várias formas de comportamento sexual homossexual são encontradas em todo o reino animal.[7] Uma revisão das pesquisas feita em 2009 revelou que este comportamento é um fenômeno quase universal entre as espécies. Bem da verdade, apesar de indivíduos de centenas de espécies manterem relações sexuais com parceiros do mesmo sexo em ocasiões isoladas, poucos fazem disso uma rotina.[8]  Seu interesse pelo sexo oposto continua ao longo da vida. Portanto, não se pode classificá-los de homossexuais na acepção da palavra. 

Somente duas espécies exibem preferência pelo mesmo sexo pelo resto da vida, mesmo havendo parceiros disponíveis do sexo oposto: a espécie humana e o carneiro domesticado. No segundo caso, até 8% dos machos do rebanho preferem outros machos mesmo quando há fêmeas férteis por perto.[9] Em 1994, neurocientistas descobriram que os machos desta espécie tinham cérebro ligeiramente diferente do resto, com um hipotálamo menor, que é a parte que controla a liberação de hormônios sexuais.[10] Isso endossa o já citado estudo do neurocientista Simon LeVay que descrevia uma diferença entre a estrutura cerebral de homens héteros e homossexuais. 

Outro animal considerado um dos mais inteligentes e que mantém relações com indivíduos do mesmo sexo é o golfinho. Em um caso que chamou a atenção de muitos pesquisadores um par de golfinhos machos manteve um relacionamento por dezessete anos. 

Nem os leões, conhecidos como os reis da selva, escapam deste curioso fenômeno. Os leões africanos geralmente mantém haréns de fêmeas e exercem sua liderança através de uma hierarquia patriarcal. Apesar disso, uma porcentagem de leões africanos machos abandonam suas fêmeas para formar seus próprios grupos homossexuais. Os leões são reconhecidamente os felinos com o maior desejo sexual, o que não os impede de desenvolver este tipo de comportamento. Entre as aves, sabe-se que mais de setenta tipos acasalam-se com indivíduos do mesmo sexo, incluindo os fascinantes pinguins. 

O certo é que enquanto a homossexualidade está presente em tantas espécies animais, a homofobia só é verificada na espécie humana, e isso, para vergonha nossa. 

No próximo post falarei sobre a presença gay na igreja evangélica e o que dizem as Escrituras. Peço ao Espírito Santo que ilumine nossa consciência para que compreendamos as angústias sofridas por homossexuais, pelo simples fato de não se aceitarem como são, ou por não serem aceitos pelos que os cercam. Peço que as feridas em seus corações sejam cicatrizadas e a hemorragia em suas almas se estanque por completo. Que se sintam plenamente amados em sua condição. Que se entreguem inteiramente a este amor, de modo que possam viver dignamente, guardados de uma vida promíscua em que sejam tão-somente usados como objetos descartáveis. Que encontrem quem os ame de verdade, sem exigir que se mutilem, tendo sua integridade dissolvida para atender expectativas puramente moralistas. E que assim, vivam para a glória d'Aquele que os criou, enfrentando valentemente todo preconceito raivoso, mesmo aquele impingido em nome da religião.


[1] LeVay S. A difference in hypothalamic structure between heterosexual and homosexual men Science, 1991 
[2] HAMER, Dean H. et al. A linkage between DNA markers on the X chromosome and male sexual orientation. Science, n. 261, 1993, p. 321-327. 
[3] BAILEY, J. Michael, PILLARD, Richard C. A genetic study of male sexual orientation. Archive of General Psychiatry, n. 48, 1991, p. 1089-1097 
[4] WILSON, Gleen, RAHM, Qazi, Born Gay: The Psychobiology of Sex Orientation, London, 2005 
[5] Bruce Bagemihl, Biological Exuberance: Animal Homosexuality and Natural Diversity, St. Martin's Press, 1999. 
[6] Harrold, Max (16 de fevereiro de 1999). Biological Exuberance: Animal Homosexuality and Natural Diversity The Advocate, reprinted in Highbeam Encyclopedia. 
[7] "Same-sex Behavior Seen In Nearly All Animals, Review Finds", Science Daily 
[8] Levay, Simon. Queer Science: The Use and Abuse of Research into Homosexuality. Cambridge, Massachusetts: MIT Press, 1996. 
[9] Levay, Simon. Gay, Straight, and The Reason Why The Science of Sexual Orientation. Cambridge, Massachusetts: Oxford University Press, 2011. 
[10] Roselli, Charles E.; Kay Larkin, John A. Resko, John N. Stellflug and Fred Stormshak. (2004,). "The Volume of a Sexually Dimorphic Nucleus in the Ovine Medial Preoptic Area/Anterior Hypothalamus Varies with Sexual Partner Preference". Journal of Endocrinology, Endocrine Society, Bethesda, MD 145 (2)

Farinha do mesmo saco! - O que a Bíblia diz sobre a homossexualidade

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Por Hermes C. Fernandes

Você se considera tímido? Então, responda-me com sinceridade: como se sente ao saber que os tímidos encabeçam a lista dos que passarão toda a eternidade sendo torturados no inferno? Pelo menos é o que lemos em Apocalipse 21:8. Confira:

“Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos que se prostituem, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte.”

Quando postei esta pergunta em meu perfil no facebook, a primeira resposta que obtive foi: “Sinto q se eu n for p o inferno de um jeito, vou de outro...rs”

Obviamente que esta resposta bem humorada está baseada na crença de que ir ou não para o inferno tenha a ver com o fato de constar de uma lista. Se depender exclusivamente disso, seria aconselhável dar uma checada noutras listas apresentadas nas Escrituras:
“Mas, ficarão de fora os cães e os feiticeiros, e os que se prostituem, e os homicidas, e os idólatras, e qualquer que ama e comete a mentira.”Apocalipse 22:15
E então, escapou desta? Você se considera um “cão”, seja lá o que isso signifique? Pratica feitiçaria? Anda se prostituindo por aí? Já matou alguém? Possui ídolos? Se prostra perante eles? Conta uma mentirinha de vez em quando? Não!? Tem certeza? Ok. Digamos que desta você escapou por pouco. Mas não termina aí. Vamos à próxima lista?

“Não sabeis que os injustos não hão de herdar o reino de Deus? Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus.”  
1 Coríntios 6:9,10

A coisa agora começou a apertar pra você, não? Já está até suando frio, hein? Mas que bom que você não é o que se poderia chamar de devasso, muito menos de adúltero... quer dizer, desde que não leve em conta aquela estória de que basta uma olhada para a mulher alheia e você já adulterou com ela...  Mas, tudo bem, né? Ninguém é de ferro. Mas pelo menos, você não é GAY! Isso mesmo! Tudo, menos isso.  Você pode até ser um maldizente (vulgo, fofoqueiro), mas não anda por aí desmunhecando. Quer saber... Deus nem vai se importar com os outros itens da lista. Desde que você não seja gay.

Está vendo como a gente trata logo de arrumar uma desculpa para salvar nossa pele? O importante é garantir que você esteja dentro e não fora, incluído e não excluído dos VIP’s que herdarão o reino dos céus.

É relativamente fácil dar uma manipulada quando nossas vicissitudes se encontram perdidas entre tantas outras. Parecem ser apenas detalhes que passam despercebidos. Mas aquela lista de Apocalipse é intragável. Pelos simples fato de ser encabeçada por uma vicissitude que julgamos ser trivial. Sete em cada dez pessoas se consideram tímidas. E agora?

Já sei. Há uma saída! Vamos vasculhar o texto em seu idioma original. Quem sabe a palavra “tímido” tenha outro significado. Talvez assim, a gente consiga salvar a pele de muita gente, inclusive a nossa.

Depois de uma breve pesquisada, a gente descobre que a palavra traduzida por “tímido” naquela passagem é ‘deilos’, encontrada em outros dois textos do Novo Testamento. Vamos dar uma conferida neles para ver se a gente escapa da lista?

Ambas as passagens relatam o episódio em que Jesus socorreu os Seus discípulos numa tempestade que quase os levou ao naufrágio (Mt.8:26, Mc.4:40). “Por que sois tão tímidos?  Ainda não tendes fé?”, repreendeu-os Jesus.  Concluímos daí que a tal timidez de que fala Apocalipse deve estar ligada à falta de fé. Não é o nosso caso, não é mesmo? Quer dizer... pensando bem, houve momentos em nossa caminhada em que nos intimidamos diante das circunstâncias. Ser “tímido” não teria a ver com ser introspectivo, calado, ter pavor de falar em público, e sim com sentir-se intimidado diante de uma situação. Então, sinto em lhe informar que por mais que nos desdobremos para fazer uma exegese que livre a nossa cara, estamos todos numa situação delicada.  Então, que tal colocar tudo isso na conta da misericórdia divina? Se Jesus pôde sair em socorro daqueles discípulos, certamente se compadecerá de nós e não nos deixará de fora.

Concordo plenamente. Só não concordo quando usamos duas medidas. Uma para livrar nossa pele, e outra para condenar os que consideramos indignos de desfrutar da mesma salvação. Esquecemo-nos de que estamos todos no mesmo barco, enfrentando a mesma tempestade. Somos humanos. Falíveis. Vulneráveis. Desesperadamente carentes da graça de Deus.

Reparou que numa das listas que apresentei acima encontramos os “efeminados” e “sodomitas”? É baseada nesta lista que afirmamos com convicção de que homossexuais são indignos de serem alcançados pela mesma graça que nos alcançou.

Que tal sermos honestos para fazer o mesmo tipo de exegese que fizemos para tentar salvar a pele dos tímidos?

O termo grego traduzido por “efeminados” é “malakoi”, que pode ser literalmente traduzido como “mole”, “macio”, “suave ao toque” (algo como “molengão”).  Alguém sem fibra, que se entregava facilmente diante de uma situação de pressão. Em época de implacável perseguição contra os cristãos, o mínimo exigido de um seguidor de Cristo é que fosse firme. O termo “malakoi” aponta para uma inaceitável fraqueza de caráter. Por que traduziram este termo como “efeminado”? Porque nas culturas antigas, a feminilidade era vista como sinônimo de fragilidade. Seria mais ou menos como dizer a um filho hoje em dia: Seja homem! Não seja uma mulherzinha! É óbvio que o objetivo de quem usa tal expressão não é diminuir o valor da mulher, mas encorajar o filho a portar-se varonilmente.  

Dicionários teológicos associam malakos (singular de “malakoi”) a um homem afeminado, mas reconhecem que o termo pode significar pessoas promíscuas, isto é, dadas aos prazeres da carne, tanto homens, quanto mulheres.  Porém, há estudos que relacionam malakoi com a prostituição masculina praticada na época de Paulo, principalmente em Corinto, cidade famosa por sua depravação sexual.

Já o termo “arsenokoitai”,  traduzido como “sodomita” na versão de Ferreira de Almeida, só passou a se referir a prática homossexual a partir da Alta Idade Média. Etimologicamente, o radical linguístico “arsen” significa macho, enquanto “koitos” significa leito. Bem da verdade, “arsenokoitai” é um termo de significado obscuro, que não possui qualquer registro na literatura clássica grega. O que levou alguns a considerar tratar-se de neologismo do próprio Paulo. Convém lembrar que há uma enorme quantidade de vocábulos do grego clássico usados para designar o comportamento homossexual, porém, Paulo não lançou mão de nenhum deles.  Logo, podemos deduzir que o apóstolo estivesse falando de algo bem particular e não propriamente da homossexualidade. A Bíblia de Jerusalém, considerada uma das melhores traduções das Escrituras, traduz o termo “arsenokoitai” como “pessoas de costumes infames”.

É plausível crer que Paulo estivesse se referindo à prática da prostituição cúltica tão disseminada no império romano, onde homens, independentemente de sua orientação sexual, tinham relações tanto com pessoas do mesmo sexo, quanto com do sexo oposto, atribuindo a isso um valor devocional.  

Festas religiosas como a dedicada a Dionísio, deus do vinho (conhecido também como Baco; daí o termo “bacanal”, festival de Baco) eram verdadeiras orgias, onde famílias inteiras se entregavam aos prazeres desenfreados da carne, julgando com isso estarem cultuando ao seu ídolo.

É também neste contexto de idolatria que Paulo expressa seu repúdio no primeiro capítulo de sua epístola aos Romanos, onde denuncia aqueles que, “dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. E mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis”(Rm.1:22-23). Razão pela qual “Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador”(vv.24-25). Repare que tudo começa na idolatria. Este é o contexto imediato. Como juízo, Deus os entrega a si mesmos, como se dissesse: É isso mesmo que vocês querem? Então, lá vai...

A partir deste ponto, Paulo descreve as tais “paixões infames” às quais Deus os abandonou.
“Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro.” Romanos 1:26-27
Interessante notar que, se a interpretação que tem sido feita está correta, é a primeira vez que encontramos nas Escrituras qualquer menção à homossexualidade feminina. Em Levíticos 18:22 lemos sobre a proibição de homem deitar-se com outro homem como se fosse mulher, mas não vemos nada acerca da mulher que se relaciona sexualmente com outra.  Acho que isso mereceria certa atenção. Porque se o assunto é, de fato, homossexualidade, então, não se poderia deixar de fora as mulheres. Há quem acredite que Paulo teria corrigido isso.

Será que Paulo estava falando de homoafetividade? Ou estaria falando de uma prática diretamente ligada à idolatria?

Imagine homens de orientação heterossexual mantendo relações homossexuais só para agradar a uma divindade pagã! Pois era justamente isso que acontecia naquela sociedade. Nada mais antinatural. Por isso, eles se embriagavam e usavam máscaras. A embriaguez era para tomar coragem e desafiar sua própria natureza. A máscara era para proteger o anonimato, e assim, ajudá-los a lidar com a culpa e a vergonha. Não se tratava de homossexualidade propriamente, mas de orgia, de promiscuidade elevada ao mais alto grau. Seres humanos reduzidos a objetos de prazer. Tudo em nome do culto a uma divindade pagã.

Assim como é antinatural a um homem ter relações com outro homem, sendo ambos héteros, também é antinatural forçar um homossexual a casar-se com alguém do sexo oposto para suprir as expectativas da sociedade de prima pela hipocrisia.

Mas digamos que a exegese apresentada aqui não o tenha convencido. Você prefere crer que homossexuais estão fadados a serem punidos para sempre no inferno, desde que sua própria timidez seja alvo da misericórdia divina.  Que tal se avançarmos um pouco na leitura de Romanos 1?

A severidade com que Deus julgará os idólatras, também julgará os que não se importaram de ter conhecimento de Deus (e aqui, o apóstolo mira sua metralhadora giratória para os judeus), que, mesmo não praticando tais coisas, aprovavam os que a praticavam (v.32). Por isso, o mesmo Deus que entregou os gentios às suas próprias paixões, também os entregou “a um sentimento perverso,  para fazerem coisas que não convêm; estando cheios de toda a iniquidade, fornicação, malícia, avareza, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade; sendo murmuradores, detratores, aborrecedores de Deus, injuriadores, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais e às mães; néscios, infiéis nos contratos, sem afeição natural, irreconciliáveis, sem misericórdia” (vv. 28-31).

E por falar em lista, sabe o que mais me chama atenção nesta em particular? O último item.  De que adiantaria escaparmos de todas as listas apresentadas nas Escrituras, mas cairmos justamente no último item desta?

A falta de misericórdia nos faz inescusáveis perante Deus. Não foi à toa que Jesus disse que bem-aventurados são os misericordiosos, pois alcançarão misericórdia. Sinceramente, espero ser contado entre estes. Se tiver que pecar pelo excesso, que peque pelo excesso de misericórdia e não de juízo.

O objetivo de Paulo nos primeiros capítulos de Romanos é mostrar que todos somos farinha do mesmo saco. Judeus e gentios, héteros e homossexuais, homens e mulheres, só escaparemos do severo juízo divino se formos tão misericordiosos com os outros quanto somos condescendentes conosco mesmos.  “Portanto”, arremata o apóstolo, “és inescusável quando julgas, ó homem, quem quer se sejas, pois te condenas a ti mesmo naquilo em que julgas a outro”(Rm.2:1). 

Quando vejo o sofrimento de milhões de seres humanos, reputados como escória pelo simples fato de serem gays, meu coração é tomado de misericórdia. Não me vejo à vontade diante de um discurso odioso, que, direta ou indiretamente, fomenta o preconceito. Quando recebo e-mails e mensagens in box de seres humanos dispostos a tirar a própria vida por não se aceitarem, ou por não conseguirem lidar com a pressão social, meu coração se enternece. Foi o que senti ao assistir ao vídeo postado por Viviany Beleboni, a transexual que encenou a crucificação na Parada Gay deste ano em SP, que em prantos denunciou a agressão sofrida por alguém que a chamava de "demônio" e dizia "Você não é de Deus!" Com o olho roxo e feridas à faca abertas no rosto e no braço por uma faca, Viviany lamentava o episodio. Como ela, muitos têm sido agredidos e até mortos por causa de sua orientação sexual. Espero que este singelo texto ajude a desarmar espíritos e conduzir-nos pelas sendas da compreensão, do amor e da misericórdia. 

Por que há deficientes?

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Por Hermes C. Fernandes

Sou pai de uma linda menina portadora de necessidades especiais. Rayane, hoje com vinte e quatro anos, sofreu uma lesão cerebral ocasionada pela falta de oxigenação na hora do parto, afetando tanto a fala, quanto o desenvolvimento motor e cognitivo. Graças à uma intervenção divina, ela veio andar aos seis anos, contrariando o prognóstico médico. Eu, minha esposa e meus outros filhos nos sentimos privilegiados por termos sido escolhidos por Deus para acolher este ser maravilhoso que tanto nos tem ensinado acerca do amor e da força de vontade em superar limites. Definitivamente, não seríamos os mesmos sem Rayane.

Pesquisando pela internet, percebo quão raro é encontrar literatura cristã tratando do assunto. Seria este um tabu entre os cristãos? Quantas mensagens já ouvimos sobre o tema em nossos púlpitos? Por que outras tradições religiosas como o espiritismo kardecista se debruçam sobre ele sem qualquer recato, enquanto as igrejas preferem varrê-lo para debaixo do tapete?

Pior do que ignorar é oferecer respostas carregadas de preconceitos e pressupostos simplistas. Enquanto uns preferem espiritualizar a questão, atribuindo qualquer deficiência à atuação demoníaca, outros preferem fazer uma leitura moralista, como se o portador de necessidades especiais fosse um castigo divino aos erros de seus progenitores.

O que as Escrituras têm a nos dizer?

Começando pelo Antigo Testamento, a primeira coisa que percebemos são as restrições à participação dos deficientes físicos ou mentais em atividades sacerdotais. Para alguns, fica a impressão de que o Deus dos hebreus não tem qualquer apreço por estas criaturinhas indefesas. Veja, por exemplo, o que diz Levítico 21:16-24:
“Falou mais o Senhor a Moisés, dizendo: Fala a Arão, dizendo: Ninguém da tua descendência, nas suas gerações, em que houver algum defeito, se chegará a oferecer o pão do seu Deus. Pois nenhum homem em quem houver alguma deformidade se chegará; como homem cego, ou coxo, ou de nariz chato, ou de membros demasiadamente compridos, ou homem que tiver quebrado o pé, ou a mão quebrada, ou corcunda, ou anão, ou que tiver defeito no olho, ou sarna, ou impigem, ou que tiver testículo mutilado. Nenhum homem da descendência de Arão, o sacerdote, em quem houver alguma deformidade, se chegará para oferecer as ofertas queimadas do Senhor; defeito nele há; não se chegará para oferecer o pão do seu Deus. Ele comerá do pão do seu Deus, tanto do santíssimo como do santo. Porém até ao véu não entrará, nem se chegará ao altar, porquanto defeito há nele, para que não profane os meus santuários; porque eu sou o Senhor que os santifico. E Moisés falou isto a Arão e a seus filhos, e a todos os filhos de Israel.”
O que será que Deus teria contra esses indivíduos? Por que os proibiu de ser sacerdotes? Seria este um juízo moral?

Alguns exegetas afirmam que a perfeição física exigida aos sumo-sacerdotes apontaria para a perfeição moral de Cristo, o Sumo-Sacerdote da Nova Aliança. Uma vez que, segundo Paulo, a Lei contenha a sombra de uma realidade que só se revelaria sob os auspícios da Nova Aliança, há de se supor que tal interpretação possa estar correta. Porém, não encerra toda a verdade.

Primeiro, devemos ressaltar que estas regras só se aplicavam ao cargo de Sumo Sacerdote. Somente o ele poderia atravessar o véu e chegar-se ao altar para oferecer o sacrifício. Àquela época, ninguém se tornava sacerdote por escolha própria. Apenas os descendentes de sacerdotes podiam exercer o sagrado ofício. Portanto, independente de sua condição física, um descendente de Arão era alçado à posição sacerdotal. Todavia, se possuísse qualquer deficiência física ou mental, não poderia ser um Sumo Sacerdote. Um anão, por exemplo, não conseguiria abater um animal oferecido em sacrifício, nem tampouco alcançaria as hastes da Menorah que media mais de três metros de altura para acender as luzes do lugar santo, atividades que ele deveria exercer sem apelar para ajuda de ninguém. Imagine agora um sacerdote coxo tendo que ficar de pé entre sete e catorze horas encabeçando o ritual de abatimento de animais. E como um cego poderia identificar as veias certas do animal a ser degolado, evitando um sofrimento desnecessário? Como alguém com defasagem intelectual poderia julgar os delitos cometidos pelas pessoas?

Portanto, tais regras não visavam excluir os portadores de deficiência, mas poupá-los de um trabalho para o qual não estavam habilitados devido à sua condição.

Ninguém, em sã consciência, confiaria a um cego a direção de um carro. Porém, isso jamais deveria ser pretexto para que subestimássemos a capacidade dos portadores de necessidades especiais. Se não podem exercer uma ou outra atividade, certamente são plenamente capazes de tantas outras. Alguns chegam mesmo a nos surpreender, desenvolvendo habilidades notáveis.

Permita-me usar os termos “deficientes” e “portadores de necessidades especiais” de maneira intercambiável, sem qualquer juízo de valor e sem me preocupar em ser politicamente correto. Minha preocupação é de ser compreendido. Por isso, vou evitar termos técnicos e conceitos desconhecidos pelo senso comum. 

Em todas as sociedades, tais indivíduos sempre foram alvo de preconceito. Em algumas delas, como a grega, apesar de seu avanço no campo da filosofia e das artes, os deficientes eram descartados assim que nasciam, por serem considerados um peso extra. Se não pudessem lutar pela cidade numa eventual invasão inimiga, logo, não tinham o direito de viver.

Basta uma olhada mais atenciosa no Antigo Testamento para verificar que, graças às instruções contidas na lei, o povo hebreu experimentou um avanço na compreensão da dignidade que deveria ser atribuída ao deficiente. O respeito com que deveriam tratar os deficientes revelaria o grau de temor e reverência que tinham para com Deus. Repare a ênfase do mandamento:
“Não amaldiçoes o surdo, nem ponhas tropeço diante do cego, mas temerás o teu Deus. Eu sou o Senhor.” Levítico 19:14
Era como se Deus dissesse: Quem mexer com eles vai se ver comigo! Ainda que o surdo jamais ouça os xingamentos e maldições lançados sobre ele, nem o cego veja o tropeço posto em seu caminho, Deus toma tais ofensas como se dirigidas a Ele próprio. Como todo mandamento, há sanções aplicadas àqueles que desrespeitam o deficiente: “Maldito quem desviar o cego do seu caminho”(Dt.27:18).

É característica do justo o tratar bem o portador de necessidades especiais. Por isso, Jó declara, ao relembrar de seus tempos áureos, que costumava ser “os olhos do cego e os pés do coxo” (Jó 29:15), o que evidenciava a pureza de seu caráter.

Apesar dos avanços patrocinados pela lei entregue por Deus a Moisés, ainda restava um ranço de preconceito contra os deficientes entre os hebreus. Prova disso é o injustificável ódio que Davi nutria contra esses indivíduos durante uma fase de sua vida. Tente não sentir-se constrangido diante do relato abaixo:
“Em Hebrom reinou sobre Judá sete anos e seis meses, e em Jerusalém reinou trinta e três anos sobre todo o Israel e Judá. E partiu o rei com os seus homens a Jerusalém, contra os jebuseus que habitavam naquela terra; e falaram a Davi, dizendo: Não entrarás aqui, pois os cegos e os coxos te repelirão, querendo dizer: Não entrará Davi aqui. Porém Davi tomou a fortaleza de Sião; esta é a cidade de Davi. Porque Davi disse naquele dia: Qualquer que ferir aos jebuseus, suba ao canal e fira aos coxos e aos cegos, a quem a alma de Davi odeia. Por isso se diz: Nem cego nem coxo entrará nesta casa.” 2 Samuel 5:5-8
Como alguém dotado de sensibilidade ímpar como Davi seria capaz de odiar indivíduos indefesos? Que bom que, como todo ser humano, Davi teve a oportunidade de rever sua postura extremamente preconceituosa.  Tanto que ao tomar conhecimento da existência de um filho deficiente de seu saudoso amigo Jônatas, mandou buscá-lo em casa e o constituiu príncipe em seu reino. Davi sustentou a Mefibosete até o fim de sua vida, mesmo sendo neto de seu arquirrival Saul (2 Sm.9:13).

Davi jamais poderia imaginar que séculos depois, um deficiente visual que mendigava à margem da estrada foi o primeiro a enxergar o que ninguém parecia ter notado: Aquele jovem galileu que arrastava multidões por onde andava era ninguém menos que o Descendente prometido por Deus a Davi e que assumiria seu trono para sempre.

É um consolo ler que as Escrituras buscam resgatar o valor do deficiente. Porém, isso não responde a mais das intrigantes perguntas: por que existem deficientes?

Esta pergunta também intrigava os discípulos de Jesus. O que os levou a perguntar a razão pela qual um homem era cego desde que nascera. Ecoando crenças difundidas entre os judeus, indagaram a Jesus se sua cegueira teria sido causada por seus próprios pecados ou pelos pecados cometidos por seus pais. Sem titubeios, Jesus lhes respondeu: “Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus” (Jo.9:3).

A crença articulada pelos discípulos atribuía qualquer deficiência física ou mental congênita ao pecado,  quer por parte do próprio portador (talvez numa vida anterior), ou por parte dos seus progenitores (neste caso, a deficiência seria uma espécie de maldição hereditária). Jesus desfere um golpe neste tipo de raciocínio raso e perverso. A graça por Ele revelada subverte a lógica do carma.

Em vez de um juízo moral, Jesus prefere enxergar naquela deficiência a oportunidade para a manifestação das obras de Deus.

Ora, que “obras” Deus poderia manifestar ao mundo através desses indivíduos? Nesse caso em particular, Jesus restaurou-lhe a visão.  Será que tais obras se limitariam à realização de milagres? Caso seja, então, por que nem todos os cegos são curados? Por que a maioria dos deficientes segue em sua débil condição mesmo depois de conhecer o amor de Cristo revelado no Evangelho?

São questões inquietantes, responsáveis pela postura equivocada adotada por muitas igrejas. Se o milagre não acontece, logo, conclui-se que a glória de Deus não se manifestou, restando-lhe uma alternativa: atribuir aquela condição à falta de fé do indivíduo ou daquele que intercedeu. Para eles, a glória de Deus só se manifesta se o paralítico saltar da cadeira de rodas e sair andando, se o mudo soltar a língua e falar, se o surdo ouvir perfeitamente e o cego puder descrever a aparência do pregador. É lamentável ver quantos destes deficientes já foram vítimas de todo tipo de sensacionalismo por parte dos que se apresentam ao mundo como a solução de todos os problemas.

Recentemente deparei-me com um anúncio publicado no facebook em que um autodenominado apóstolo se apresenta como ex-síndrome de down, que teria ido ao inferno sete vezes e morrido cinco vezes. Como se não bastasse, o sujeito cobra uma considerável quantia em dinheiro para assistir às suas palestras e receber sua oração. É este tipo de coisa que atenta contra a credibilidade da igreja atual. Quanta esperança falsa está sendo alimentada no coração dos incautos. Espero que da próxima vez que ele for ao inferno, ele fique por lá. Mas parece que nem o diabo caiu no seu conto e resolveu devolvê-lo com casca e tudo. Perdoem-me o sarcasmo. Mas só assim para aturar este tipo de coisa sem dizer impropérios. Ele deveria estar na cadeia.

Que Jesus segue curando, não tenho a menor dúvida. Minha filha é uma prova disso. Desenganada pela medicina, ela passou a andar em pleno culto dominical, sem que ninguém mandasse. Porém, ela não deixou de ser portadora de necessidades especiais.  Se quiser saber com detalhes, assista ao vídeo em que relato o testemunho de como conheci a graça de Deus através da minha filha. O vídeo está disponível em meu canal do youtube e na lateral do meu blog.

Todavia, as obras de Deus não se manifestam nestes indivíduos apenas através de um eventual milagre.

Vejamos, por exemplo, o caso de Mefibosete. Este era paraplégico. Não de nascença, mas por causa de uma queda sofrida quando ainda era um bebê. Que “obra” Deus manifestou ao mundo através dele? Que milagre o Senhor teria feito? Nele, nenhum. Pelo menos, não um milagre físico e aparente. Mas através dele, Deus operou um grande milagre no coração de Davi. Como vimos algumas linhas acima, Davi odiava “cegos e coxos”. Para que pudesse ser, de fato, um homem segundo o coração de Deus, Davi teria que aprender a amar o que Deus ama, sem jamais desprezar o que Deus não despreza.  Convidar a Mefibosete para que ocupasse lugar de honra em seu reino foi um enorme salto na vida de Davi. Ouso dizer que o preconceito que teve que vencer em si mesmo foi um gigante muito maior do que Golias.

Portanto, concluo que os portadores de deficiência são canais através dos quais a graça de Deus nos é ministrada. A maneira como lidam com suas limitações nos enternece o coração e nos desafia a enfrentar nossos próprios limites.

Vejamos, ainda, o caso de Moisés.
“Então disse Moisés ao SENHOR: Ah, meu Senhor! eu não sou homem eloquente, nem de ontem nem de anteontem, nem ainda desde que tens falado ao teu servo; porque sou pesado de boca e pesado de língua. E disse-lhe o SENHOR: Quem fez a boca do homem? ou quem fez o mudo, ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o SENHOR? Vai, pois, agora, e eu serei com a tua boca e te ensinarei o que hás de falar.” Êxodo 4:10-12
Já ouvi argumentos afirmando que Deus não seria responsável pelo nascimento de pessoas especiais. Porém, nesta passagem, Deus toma pra Si a responsabilidade. Foi Ele quem as criou, e as fez com um propósito.

Não sabemos ao certo qual seria a deficiência de Moisés. Cogita-se que ele fosse gago. Ainda assim não sabemos se sua “gagueira” teria origem emocional ou neurológica. Mas Deus o envia ao homem mais poderoso da Terra, a fim de confrontá-lo e libertar Seu povo da escravidão.

Ele faz uso de pessoas com deficiência, seja física ou mental, para dar exemplo de vida para quem aparentemente é saudável (Leia 1 Co.1:25-29). Quantos exemplos de pessoas que mudaram radicalmente sua postura, depois de ver ou ouvir testemunhos de superação de pessoas com algum tipo de deficiência. Emocionamo-nos quando percebemos o legado de pessoas como Stephen Hawking, o famoso físico que do alto de sua cadeira de rodas ocupa a cátedra que um dia foi ocupada por ninguém menos que Isaac Newton. Emocionamo-nos quando tomamos ciência de que algumas das mais lindas sinfonias foram compostas por um deficiente auditivo. Refiro-me a ninguém menos que Ludwig Van Beethoven.

A pior deficiência não é a de ordem física ou mental, mas a de caráter que se manifesta principalmente através do preconceito.

Consola-nos saber que tais deficiências não se constituem numa sentença irrevogável.  Nossas limitações, sejam quais forem, são temporárias. Paulo diz em 1 Coríntios 15:53 que “é necessário que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade e que isto que é mortal se revista da imortalidade.” Um dia, quando Cristo despontar no horizonte celeste, os deficientes serão plenamente restaurados. “Então os olhos dos cegos serão abertos, e os ouvidos dos surdos se abrirão. Então os coxos saltarão como cervos, e a língua dos mudos cantará; porque águas arrebentarão no deserto e ribeiros no ermo. E a terra seca se tornará em lagos, e a terra sedenta em mananciais de águas; e nas habitações em que jaziam os chacais haverá erva com canas e juncos. E ali haverá uma estrada, um caminho, que se chamará o caminho santo; o imundo não passará por ele, mas será para aqueles; os caminhantes, até mesmo os loucos, não errarão” (Isaías 35:5-8).


Enquanto não chega este dia, convém-nos lutar pelos direitos da pessoa portadora de qualquer deficiência, sem subestimar seu potencial de superação, mas também respeitando suas limitações sem jamais nos esquecer de nossas próprias. 

Se você tem um destes seres especiais em sua casa, sinta-se um privilegiado. Deus só dá pessoas especiais para famílias especiais. Trate-os, não apenas como portadores de necessidades especiais, mas como portadores de uma mensagem do céu para você, sua família e toda a humanidade. 

Resposta às críticas severas de um tal Severo

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Por Hermes C. Fernandes

Fui surpreendido ao entrar em minha fanpage e deparar-me com o link de uma matéria escrita pelo senhor Julio Severo acerca de minha opinião sobre a homossexualidade. Não é a primeira vez que este senhor escreve para confrontar meus posicionamentos. Ele, como um “guardião da verdade”, não poderia deixar passar em branco um artigo tão “grave” quanto o que escrevi cerca de uma semana atrás.

Primeiro, ele tenta desmerecer os estudos científicos que apresentei lançando mão de um livreto (ou seria um panfleto?) publicado por um ministério americano chamado “Focus on the Family", um dos porta-vozes mais eloquentes na defesa dos valores morais cristãos.  Um ex-líder deste ministério John Paulk, que também era presidente da Exodus (aquele ministério da cura gay), protagonizou um escândalo de repercussão internacional ao ser visto e fotografado num bar de gays em Washington DC.  Inicialmente, Paulk negou frequentar o estabelecimento, apesar da prova fotográfica, logrando com isso o apoio do fundador e líder da Focus,  Dr. James Dobson.  Mas em seguida, Paulk confirmou, por escrito, que havia mentido e que, de fato, teria estado naquele bar.

Ted Haggard, outro pregador de renome, amigo do fundador da Focus, admitiu ter recebido massagem de um homossexual e de ter comprado metanfetamina.  Ted , que era presidente da NAE (Associação Nacional dos Evangélicos), declarou, inicialmente, que teria sido apenas uma massagem, sem qualquer conotação sexual. Posteriormente, após ter sido declarado culpado pela diretoria da igreja e afastado de suas atividades pastorais, Ted veio à público do púlpito de sua igreja e admitiu ser “culpado de imoralidade sexual” , confessando ser “um enganador e mentiroso”.  James Dobson, o presidente da Focus afirmou que continuaria sendo seu amigo, e que pretendia ajudá-lo na restauração de seu casamento e de sua reputação. Tempos depois, Dobson voltou atrás, afirmando que não pretendia mais participar do longo processo de restauração de Ted Haggard. 

Por que estou expondo isso aqui? Não é para descredenciar a fonte usada por meu oponente para tentar desacreditar estudos científicos sérios, mas tão-somente para demonstrar o perigo que é adotar uma postura inflexível, desprovida de misericórdia. Por trás de todo discurso moralista pode haver muita coisa escondida. Eu disse, “pode haver”, e não que necessariamente haja.

Se agirmos com misericórdia, no momento em que dela precisarmos, ela não nos será negada. Mas se agirmos com intransigência e impiedade, elas igualmente nos alcançarão.

Sei de pastores flagrados em relação sexual com obreiros no gabinete pastoral. Homens cujo discurso moralista era inflamado.  Não se trata apenas de hipocrisia, pregando uma coisa enquanto se vive outra. Não. Em muitos casos, acredita-se piamente que combater o mal encontrado em si mesmo atenuaria sua culpa perante Deus.

Julio Severo me acusa de fazer um “saneamento científico” da Bíblia. Seria isto o mesmo que Galileu tentou fazer ao dizer que nosso sistema era heliocêntrico? Ora, se a ciência é este bicho-papão que pintam, por que insistem em usufruir de suas conquistas? Seria mais coerente com o seu discurso se se isolassem do mundo como fazem algumas comunidades menonitas que vivem como se vivessem dois séculos atrás, sem eletricidade, sem água encanada, sem telefone, sem veículos automotivos, etc. São discursos retrógrados como o de Severo e cia que rendem à igreja críticas tão severas por parte dos que percebem sua incongruência.

A Bíblia não precisa ser reescrita, sr. Severo. Nós é que precisamos lê-la sem as lentes de nossos preconceitos.  Se você acredita que ela é tão incisiva quanto à homossexualidade, explique-me a razão por que entre mais de 31 mil versículos, apenas 6 abordam o assunto, enquanto mais de 2 mil falam de justiça social. E ainda assim, todos eles são passíveis de interpretação, como expus em meu último post sobre o tema (talvez não tenha lido). A propósito, você poderia alternar os assuntos em seu blog.  Fica parecendo que você tem fixação naquilo. É só um palpite.

Meu caro, não me considero bispo. Fui sagrado bispo pelas mãos de oito bispos de tradição anglicana e pelas mãos do fundador da igreja a que sirvo.

De onde você tirou que fico “satisfeito e excitado”  toda vez que aparece um estudo “científico” que dê suporto aos meus “sentimentos e paixões”? Seria isso uma insinuação acerca de minha sexualidade? É isso mesmo?

Meu caro, sou casado há vinte e cinco anos com a mesma mulher, pai de três lindos filhos. Não preciso ser negro para defender a causa do negro, por séculos oprimido por gente da minha cor. Não preciso ser mulher para defender a causa das mulheres, por milênios oprimidas por homens como eu. Não preciso ser uma árvore para defender a causa do meio-ambiente. Tampouco preciso ser homossexual para emprestar meus lábios a este segmento tão massacrado por gente impiedosa que usa suas convicções religiosas como pretexto para destilar ódio e preconceito.

Por fim, você diz que ao apelar ao amor, eu estaria lançando mão do último recurso dos covardes espirituais.  Covarde eu seria se me calasse diante do que tem sido vociferado em nossos púlpitos sob o disfarce de piedade. Covarde seria se, para proteger minha ilibada reputação, eu fizesse coro com os intolerantes.

Como se não bastasse, você ainda conclama a blogosfera apologética calvinista a um linchamento contra mim (vai bater em Hermes?). Será que seu mentor Olavo de Carvalho vai comprar esta briga também? Como esquecer do artigo que ele escreveu me detonando sem dó nem piedade no Mídia Sem Máscara

Diferentemente de você, meu caro Severo, homens com Renato Vargens, apesar de discordar de mim em vários pontos, sabe apresentar seus pontos de vista sem atacar minha honra, nem levantar suspeitas infundadas. 

Depois de toda a salada, você asperge seu amargo vinagre, tentando ligar meu nome a coisas como “sacrifício de bebês”. Conheço bem este artifício. É próprio dos que não possuem escrúpulos.

Não sou de esquerda.  Nem de direita. Nem mesmo de centro. Sou pela desideologização do evangelho.  Não defendo o aborto.  Tenho um vídeo no youtube onde confronto o bispo Macedo sobre isso.

Não sou adorador de Baal. Sou um seguidor de Cristo. Sem lenço, nem documento. Sem compromisso com qualquer ideologia. Sem ligação com movimento algum. Apesar de simpatizar-me com alguns pressupostos da Teologia de Missão Integral, não compro pacotes fechados de ninguém. E também não peço que comprem de mim. Não tenho procuração para pensar por ninguém. Prefiro examinar item por item, retendo somente o que for coerente com o que creio ser a expressão mais próxima do evangelho.

Até quando? Poucos com tanto, tantos com tão pouco!

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Por Hermes C. Fernandes


Viver numa cidade cercada de montanhas tem suas vantagens e desvantagens. A exuberância de nossa topografia tem seu lado negativo. Se quisermos assistir a um belo nascer do sol, teremos que buscar uma praia, de onde possamos vê-lo se insinuando no horizonte até rasgar o céu com seus raios. Caso contrário, as mesmas montanhas que embelezam nossos cartões postais proverão uma muralha que retardará o aparecimento do astro rei.

As Escrituras nos garantem que o Sol da Justiça há de despontar no horizonte da história, e que as trevas que hoje parecem prevalecer serão finalmente dissipadas.

Os cristãos, de modo geral, creem nisso. O bem vencerá. O amor prevalecerá. Todavia, uma parte significativa deles acha que nada haja a fazer para contribuir neste processo, senão anunciar a Cristo como o Salvador. Por isso, adota uma postura passiva, negando-se o papel de agentes do reino de Deus cuja missão é a transformação da sociedade, preparando-a para o segundo advento de Jesus.

E que tipo de transformação deve preceder a parousia?[1] Seria tão-somente no âmbito da espiritualidade? Estaríamos falando do que se convencionou chamar “avivamento espiritual”? Uma espécie de conversão em massa? Ou seria uma transformação que abrangeria as estruturas sociais, políticas e econômicas do mundo? 

Que haja algo errado, todos admitimos. Resta saber o que se pode fazer para corrigi-lo. Não basta remediar, tratar os sintomas, sem questionar as estruturas injustas que os produzem. Como pisar num lugar como o lixão de Jardim Gramacho, deparar-se com seres humanos vivendo literalmente do lixo, e não questionar o que estaria por trás disso? Seria muito fácil emitir um juízo moral, atribuindo a miséria de nossos semelhantes ao pecado, à falha de caráter, à indisposição para o trabalho. Isso, certamente, pouparia os verdadeiros responsáveis pela penúria que atinge boa faixa da população mundial. Também é relativamente fácil esconder-se atrás de um sistema que incentiva a meritocracia, que justifica a concentração de renda, enquanto desdenha da miséria alheia. Como ceder à misericórdia em nossos corações enquanto nossas mentes teimam em justificar o sistema responsável por produzir esses indesejáveis efeitos colaterais? Eis a nossa esquizofrenia

Referindo-se à vinda gloriosa de Jesus, Pedro diz que “convém que o céu o contenha até aos tempos da restauração de tudo, dos quais Deus falou pela boca de todos os seus santos profetas, desde o princípio”(At.3:21). Portanto, não estamos defendendo coisa estranha ao evangelho, mas aquilo que tem sido crido e esperado desde os primórdios, mesmo antes do primeiro advento. Nenhum dos profetas se furtou de proclamar acerca deste tão desejado tempo em que todas as coisas serão plenamente restauradas. E não só isso! Eles conclamaram os homens a arregaçarem as mangas e trabalharem desde já, preparando o caminho do Senhor.  Veja, por exemplo, o que diz Isaías:

 “Eis a voz do que clama: Preparai no deserto o caminho do Senhor; endireitai no ermo uma estrada para o nosso Deus. Todo vale será levantado, e será abatido todo monte e todo outeiro; e o terreno acidentado será nivelado, e o que é escabroso, aplanado. A glória do Senhor se revelará; e toda a carne juntamente a verá; pois a boca do Senhor o disse.”
Isaías 40:3-5

O trabalho para o qual fomos arregimentados consiste em aplainar o terreno, para que, quando o Sol da Justiça despontar, toda a humanidade possa vê-lo ao mesmo tempo.  Para nivelar o terreno, montanhas terão que ser abatidas, e vales aterrados. Não se trata de algo simples de se fazer, mas de um desafio que demandará um esforço hercúleo por parte de todos os envolvidos.

João Batista, precursor de Jesus em Seu primeiro advento, percebeu que este processo de nivelamento passava por ele também. Ninguém está imune. Por isso, ao ser indagado por seus discípulos acerca do crescimento meteórico do ministério de Jesus com coincidia com a redução de sua própria popularidade, João respondeu: “É necessário que ele cresça e que eu diminua” (Jo.3:30).Neste caso, Jesus era o vale que precisava ser exaltado, enquanto João era a montanha que teria que ser abatida.
A igreja, como precursora de Jesus em Seu segundo advento, deve estar imbuída do mesmo espírito. Somos, por assim dizer, uma amostra grátis do que Deus almeja fazer no mundo. Se não funcionar conosco, que garantia teremos de que funcionará lá fora?

Por isso, Paulo recomenda incisivamente que no contexto do Corpo de Cristo, os membros que pareçam mais fracos sejam tidos por necessários, e os que são reputados como menos honrosos, sejam ainda mais honrados. Porém, “os que em nós são mais nobres não têm necessidade disso, mas Deus assim formou o corpo, dando muito mais honra ao que tinha falta dela; para que não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual cuidado uns dos outros” (1 Co.12:22-25).

Antes de ser vista no mundo, a glória do Senhor deve ser revelada em nós. Para isso, porém, o terreno precisa ser aplainado.  

O que isso significaria na prática?

Tiago, irmão do Senhor, nos responde a esta importante pergunta:

“Glorie-se o irmão de condição humilde na sua alta posição. O rico, porém, glorie-se na sua insignificância, porque ele passará como a flor da erva. Pois o sol sai com seu ardente calor, e faz secar a erva; a sua flor cai, e a sua formosura perece. Assim murchará também o rico em seus caminhos.” Tiago 1:9-11

O que provoca desnivelamento maior entre os homens do que a injustiça social responsável pela divisão de classes? O que hoje chamamos de desigualdade, os profetas chamavam de iniquidade. Poucos com tanto, tantos com tão pouco. Se isso não puder ser corrigido no âmbito da igreja, certamente não o será no mundo. 

Logo no início, quando o Espírito desceu sobre os discípulos reunidos no cenáculo, o maior milagre ocorrido não foi o falar em línguas, como defendem alguns, mas sim o fato de se tornarem um só coração, de modo que ninguém dizia que coisa alguma que possuía era sua, mas todos tinham tudo em comum (At.4:32). Já não havia divisão de classes nesta sociedade embrionária chamada igreja. O mundo agora tinha um exemplo palpável de como as coisas deveriam funcionar no reino de Deus.

Porém, aos poucos, novas montanhas se elevaram, graças ao atrito das 'placas tectônicas sociais'. Entre uma montanha e outra, novos vales se abriram. O terreno voltou a ficar acidentado. O que é uma montanha senão o acúmulo de materiais ao longo das eras? E o que é um vale senão uma ruptura no terreno, fazendo separação entre os montes? 

A fé, que segundo Paulo opera pelo amor (Gl.5:6), deve ser capaz de fazer mover as montanhas, precipitando-as e dissolvendo-as no mar. Na simbologia bíblica, o mar representa os povos em geral. Em outras palavras, o que foi acumulado, deveria ser usado no bem comum. 

Deus jamais endossou a concentração de bens (Is.5:8). Se nossa fé não for capaz de reverter este fluxo, ela de nada serve, não passando de uma fé espetaculosa, sem compromisso com a realidade.  Esta, porém, tem sido a tendência da fé quando divorciada do amor (Leia 1 Co.13:1-3).

Voltando a Tiago, verificamos que ao humilde, ao pobre, é-lhe dado o direito de se gloriar, pois o mesmo desfruta de uma alta posição aos olhos de Deus. Repare: Deus faz ao pobre uma concessão que não faz a ninguém. Apesar de não ter filhos prediletos ou favoritos, Deus considera o pobre Sua prioridade número um. Já o rico, mesmo amado por Deus, deve reconhecer sua insignificância, pois ocupa o último lugar na agenda do reino de Deus. Não significa que Deus o despreze. Porém, antes de voltar Sua atenção para Zaqueu, Ele Se voltará para Bartimeu. 

Quem, afinal, seriam o rico e o pobre na opinião de Deus?

Rico é qualquer um que goza de privilégios negados aos demais. Pobre é qualquer um que tem seus direitos vilipendiados. É completa perda de tempo tentar espiritualizar isso. E a prova disso é o comentário feito por Tiago no capítulo dois de sua epístola?

“Meus irmãos, como crentes em nosso glorioso Senhor Jesus Cristo, não façam diferença entre as pessoas, tratando-as com favoritismo. Suponham que na reunião de vocês entre um homem com anel de ouro e roupas finas, e também entre um homem pobre com roupas velhas e sujas. Se vocês derem atenção especial ao homem que está vestido com roupas finas e disserem: "Aqui está um lugar apropriado para o senhor", mas disserem ao pobre: "Você, fique de pé ali", ou: "Sente-se no chão, junto ao estrado onde ponho os meus pés", não estarão fazendo discriminação, fazendo julgamentos com critérios errados? Ouçam, meus amados irmãos: não escolheu Deus os que são pobres aos olhos do mundo para serem ricos em fé e herdarem o Reino que ele prometeu aos que o amam? Mas vocês têm desprezado o pobre. Não são os ricos que oprimem vocês? Não são eles os que os arrastam para os tribunais? Não são eles que difamam o bom nome que sobre vocês foi invocado?” 
Tiago 2:1-7

Se Tiago estivesse se referindo a um tipo de riqueza e de pobreza estritamente espirituais, não faria sentido o exemplo usado. Ele fala de anel de ouro, roupas elegantes,  em oposição a roupas velhas e sujas. Não há nada de espiritual aí. Ou há? Bem, o fato de valorizamos tanto a aparência e a posição social de alguém revela nosso estado espiritual lastimável. No fundo, tudo é espiritual. Porém, não se pode negar os desdobramentos sociais de nossa espiritualidade.

Se importamos do mundo a visão pela qual diferenciamos as pessoas de acordo com suas classes sociais, deixamos de ser agentes de transformação e nos tornamos em meras engrenagens deste sistema reprodutor de injustiças.

Por que tratamos o rico de maneira gentil e o pobre de maneira rude? O homem com anel de ouro em seu dedo representa aquilo que gostaríamos de ser. Nós o invejamos. Quem sabe, se o adularmos, ele nos ajudará a ascender socialmente? Já a presença do pobre nos causa mal-estar. Sua existência desafia nossos escrúpulos. Sua presença nos intimida. O que ele poderia nos oferecer? Provavelmente nos pedirá alguma ajuda. Por isso, é melhor mantê-lo numa distância segura.

Só existem vales, porque existem montanhas. Não haveria pobres, se não houvesse ricos. Não haveria miséria, se não houvesse concentração de bens. 

Tiago denuncia isso enfaticamente. Sem titubear, ele se dirige aos ricos de seu tempo e os conclama ao arrependimento:

“E agora, vós ricos, chorai e pranteai, por causa das desgraças que vos sobrevirão.As vossas riquezas estão apodrecidas, e as vossas vestes estão roídas pela traça.O vosso ouro e a vossa prata estão enferrujados; e a sua ferrugem dará testemunho contra vós, e devorará as vossas carnes como fogo. Entesourastes para os últimos dias.Eis que o salário que fraudulentamente retivestes aos trabalhadores que ceifaram os vossos campos clama, e os clamores dos ceifeiros têm chegado aos ouvidos do Senhor dos exércitos.Deliciosamente vivestes sobre a terra, e vos deleitastes; cevastes os vossos corações no dia da matança.Condenastes e matastes o justo; ele não vos resistiu.” Tiago 5:1-6

Ninguém chega ao ponto de se tornar rico, sem ter explorado o trabalho do pobre, do necessitado, e sem ter se valido de um sistema calibrado para beneficiar a uns em detrimento de outros. Salários foram fraudulentamente retidos. Direitos foram solapados. A justiça pervertida. Tudo em nome do conforto, da segurança, da estabilidade. 

Porém, Deus não faz vista grossa a tudo isso. Segundo Tiago, “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tg.4:6). E alguém duvida que o soberbo em questão seja uma referência aos que se valem daquilo que possuem?

Em breve, tudo isso se reverterá. Na medida em que o genuíno evangelho for anunciado aos homens, o fenômeno vivido pelos cristãos primitivos se repetirá. Os ricos expandirão suas consciências e se darão conta de que “a vida do homem não consiste na abundância das coisas que possui” (Lc.12:15), de modo que não se negarão a repartir seus haveres com os que nada têm. Não se trata de filantropia, mas de justiça.

Na profecia de Isaías, quando os vales fossem aterrados e as montanhas achatadas, o caminho seria endireitado. Numa topografia pontilhada de montanhas, as estradas costumam ser sinuosas. Para quê servem as curvas, afinal, senão para contornar os obstáculos impostos pelas montanhas? Sem elas, o que é torto se endireitaria. E repare que uma sociedade dividida em classes não é um problema só para quem está na base, tendo que contornar os obstáculos impostos pelos que detém o poder político e econômico. A presença dos vales demanda a construção de pontes que interliguem as montanhas. Portanto, é dispendioso a todos, tanto para os que estão na base da pirâmide social, quanto para os que estão no topo. As pontes servem para que não seja necessário voltar à base e percorrer estradas sinuosas. Quem detém o poder não precisa se rebaixar. Em vez disso, cria mecanismo para burlar as regras válidas apenas para os que estão lá embaixo. Porém, pontes não custam barato. Políticos são corrompidos. Pautas das redações de jornais são encomendadas. Brechas na lei são exploradas à exaustão por juristas que se deixam alugar. Candidatos são forjados. Campanhas milionárias são patrocinadas. Seguranças armados são contratados. Carros são blindados. Mansões cercadas de câmeras e cercas eletrificadas. Ou como disse Tiago, estão entesourando para o seu próprio fim. Nada disso seria necessário se os ricos deste mundo não fossem tão gananciosos.

Facilitar a vida do pobre é, por assim dizer, viabilizar a própria existência sobre bases firmes, sem medo do inusitado, sem receio de perder tudo de uma hora para outra, sem ter que viver escatelado, prisioneiro de seu próprio sucesso.

Compete à igreja conclamar o mundo à tomada de consciência, num pacto entre todas as camadas sociais, onde ninguém se verá lesado em seus direitos, nem refém de seus interesses. 



[1]Termo grego usado no NT para designar a manifestação visível de Cristo no último dia.

Que esperança haveria para os que partiram sem conhecer a Cristo?

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Por Hermes C. Fernandes

Recentemente estive em um debate radiofônico em que uma mesa formada por quatro pastores abordou suas perspectivas acerca dos conflitos geracionais e da evasão de jovens das igrejas. Contei-lhes sobre a maneira como meu pai logrou conquistar meu coração com um singelo gesto de amor no momento de maior rebeldia em minha conturbada adolescência.

Assim que terminei meu relato, um dos pastores pediu para compartilhar sua própria experiência com o seu pai. Imaginei que seria algo próximo do que relatei. Em vez disso, sua história conseguiu embargar minha voz. Contou-nos que fora criado num lar ateísta, e que seu pai detestava qualquer tipo de religiosidade. Já na adolescência, foi trabalhar na empresa de seu pai. Qual foi sua surpresa quando um dia a secretária convidou-o para fumar um baseado de maconha. Constrangido, disse-lhe que não poderia fazer tal coisa, pois seu pai estava ali. Pelo que a secretária retrucou, contando que seu próprio pai também consumia a droga. Com o dinheiro dado pelo pai, ele e a secretária dirigiram-se a uma boca de fumo próxima e adquiriram quantidade suficiente para ser consumida pelos três. Sob o efeito da droga, pai e filho acabaram compartilhando os favores sexuais da secretária.

Imaginei que seu relato sofreria uma guinada, mas em vez disso, ele contou que seu pai morreu ateu, e que ele, por sua vez, veio a conhecer Jesus enquanto desfolhava uma Bíblia. Impactado pelo Jesus que emergia das páginas dos Evangelhos, saiu à Sua procura em várias igrejas, mas aquilo que era pregado dos púlpitos não parecia em nada com a proposta do Jesus que conhecera. Mais tarde, ainda desiludido, entrou numa igreja onde o discurso se assemelhava com o de Cristo, ficando ali até tornar-se pastor após a conclusão de seu seminário. Passei o dia pensando sobre aquilo.

Como me sentiria sabendo que meu próprio pai teria tido um fim daqueles? Como conviveria com a ideia de que ele poderia estar no inferno, enquanto eu estivesse convidando pessoas a desfrutarem do céu?

Sou a terceira geração de pastores da minha família. Meu avô materno foi pastor. Meu pai, idem. Meus tios e primos por parte de mãe, meus cunhados e irmãos, são todos cristãos comprometidos com o Reino de Deus. Isso me traz um enorme conforto. Sei que ao deixarmos este mundo, reencontrar-nos-emos na glória celestial.

Como compartilhar tal conforto com quem tem uma história diferente da minha? Creio firmemente que um dos papéis que devem ser desempenhados pela igreja é a promoção da conversão dos pais aos filhos e dos filhos aos pais. Em se tratando de famílias onde os pais e os filhos servem ou serviram a Cristo, tal missão é relativamente fácil. Mas como podemos reconciliar pais e filhos quando os mesmos se encontram em posição antagônica com relação a Cristo? Para responder a isso, temos que considerar a abrangência da obra reconciliadora promovida por Cristo em Sua Cruz.

“E que, havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra, como as que estão nos céus.” 
Colossenses 1:20

Nada ficou fora do escopo desta reconciliação. Todas as gerações passadas, presentes e futuras. Em termos espaciais, podemos dizer que o termo “céus” refere-se ao avesso da realidade, isto é, àquilo que não é perceptível aos sentidos, à esfera espiritual, também chamada de “regiões celestiais”. Não se trata, portanto, de uma localização geográfica, algum ponto para além das galáxias. Quando se fala de céu como estando acima de nós, trata-se de uma metáfora que indica a sua superioridade em relação à esfera terrena. 

Lembrando a teoria dos conjuntos que aprendemos ainda no ensino fundamental, o céu contém a terra. Estamos rodeados pelos céus, tanto o sideral, quanto o espiritual. Por isso, Paulo cita os filósofos gregos no areópago de Atenas: Nele vivemos, e nos movemos, e existimos; como também alguns dos vossos poetas disseram: Pois somos também sua geração” (Atos 17:28).

No sentido temporal, o termo “céus” refere-se ao futuro, ao porvir. O que hoje é latente, no futuro será patente. O que hoje se oculta, no futuro será revelado. Coisas que nossos olhos ainda não viram e nossos ouvidos jamais ouviram, todavia, já estão preparadas para aqueles que amam a Deus. Embora reais hoje, são imperceptíveis aos sentidos humanos, mesmo estando imersos nesta realidade.

Já o termo “terra” é uma referência ao presente, ao que nos é contemporâneo e patente aos olhos, ao momento histórico em que estamos vivendo.

Para nós, humanos, céus e terra são realidades distintas. Vivemos o presente e ansiamos pelo futuro. Porém, para Deus, são facetas da mesma realidade, para quem não há distinção entre passado, presente e futuro. Ele os habita concomitantemente, podendo transitar livremente entre eles. Para Deus, o passado não passou e o futuro é tão presente quanto o próprio presente.

Com estas definições em mente, podemos dizer que céus e terra, presente e futuro, bem como os que neles habitam, foram reconciliados com Deus em Cristo Jesus. Mas não para por aí. Em outra passagem, Paulo vai um pouco mais longe, incluindo também o passado no escopo desta reconciliação.

“Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.” Filipenses 2:10-11

A expressão “debaixo da terra” refere-se ao passado e seus habitantes, àquela esfera existencial abaixo de camadas sucessivas de poeira histórica. Aquilo que foi e já não o é. Metaforicamente, é o mundo dos mortos, às vezes chamado de inferno (grego Hades, hebraico Sheol).

Tudo quanto hoje está na superfície, um dia estará “debaixo da terra”. O que hoje é presente, amanhã será passado. O dia chamado “hoje”, o momento chamado “agora” é que determinará o que vai pra debaixo da terra e o que será remetido aos céus, o que vai ficar perdido no passado para sempre, e o que será remetido ao futuro.

O escritor de Hebreus afirma que há coisas abaláveis que precisam ser removidas, para que somente as inabaláveis permaneçam (Hb.12:27-29). Todas terão que passar pela prova de fogo. Nas palavras de Paulo, aquilo que for palha não subsistirá, mas o que for ouro, prata ou pedra preciosa permanecerá. O dia demonstrará com que material edificamos nossa existência. Se o que houvermos feito se mostrar resistente ao tempo e ao fogo, seremos galardoados. Caso contrário, sofreremos prejuízo. Ainda nas palavras do apóstolo, “o tal será salvo todavia como que pelo fogo” (1 Co.3:15). Em outras palavras, sua existência será condenada ao passado (de lá não passará!), porém, sua essência será reconciliada com Deus, mesmo que pelo fogo. Não haverá segunda chance! O que se viveu, viveu. O passado se manterá intocável. O inferno só é eterno porque Deus decidiu que o passado não pode ser alterado.

A despeito disso, o passado pode ser relido, reinterpretado à luz da contribuição que deu ao futuro. Dizer que Cristo tem a chave do hades (inferno) pode significar que em Cristo temos a chave hermenêutica da história (e não apenas das Escrituras!). Através d’Aquele que era, que é e que há de vir, podemos reexaminar o passado e reinterpretá-lo.

Dizer que os habitantes das esferas inferiores haveriam de confessar o senhorio de Cristo é o mesmo que afirmar que teriam suas consciências finalmente reconciliadas com Deus. Afinal, como afirmou Paulo, quem quer que com sua boca confessar que Jesus é o Senhor, “será salvo”(Rm.10:9).

Seu passado continua lá, onde sempre esteve. Porém, agora, seus olhos são desvendados, e sua mente capaz de processar a síntese, dando-lhe uma visão panorâmica da história, e de como sua própria existência se encaixa no propósito divino, ainda que pareça ter sido um completo desperdício. Deus, o grande Alquimista e Reciclador do Universo sabe como transformar lixo existencial em ouro! Mesmo um pecado como o de Davi com Bate-seba pode resultar numa bênção como Salomão.

O propósito de Deus é alinhar todas as coisas, como quem justifica as linhas de um texto digitado no computador. Prelúdio, interlúdio e poslúdio se harmonizam na grande sinfonia da história, composta e regida pelo sumo maestro.

João ficou estupefato quando se lhe descortinou a realidade por trás do cenário da existência. Em seu relato registrado no livro de Apocalipse, o vidente afirma ter ouvido “toda a criatura que está no céu, e na terra, e debaixo da terra, e que está no mar, e a todas as coisas que neles há, dizer: Ao que está assentado sobre o trono, e ao Cordeiro, sejam dadas ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre (Apocalipse 5:13). Nenhuma esfera existencial ficou de fora do escopo da redenção.

Se faltasse uma só esfera, seria como um coral em que não houvesse uma das várias categorias de vozes: contralto, tenor, barítono, baixo e soprano. Sob a batuta de Cristo, as diferentes categorias vocais se harmonizam.

Poderíamos definir a reconciliação como uma harmonização de cada fato dentro do quadro geral da história. Cada peça do mosaico encontrará seu lugar e se harmonizará com as demais, provendo um sentido amplo e profundo da trama universal.

Ser reconciliado é compreender seu papel dentro da execução dos propósitos divinos e assim, ter sua alma apaziguada. É compreender o dom da vida sob a perspectiva de um propósito que a transcende.

A maior necessidade do ser humano não é de sobrevivência ou de conforto material, mas de encontrar sentido para sua existência. O acaso não nos convence. O caos não nos parece razoável. Almejamos desesperadamente beleza, simetria, destino, propósito. A razão pela qual nos sentimos tão miseráveis perante as tragédias é que elas não fazem o menor sentido. Que sentido haveria num pai enterrar seu próprio filho? A ordem natural não é que os filhos enterrem os pais? Que sentido há num cataclismo que ceifa milhares de vidas? Não nos soa como um desperdício? Como explicar a prodigalidade da natureza? Ainda que não admitamos, no fundo, achamos que Deus nos deve alguma explicação. Mas na maioria das vezes, Ele parece manter-Se em silêncio. É como se sussurrasse em nossos ouvidos o que disse a Pedro: “O que eu faço não o sabes tu agora, mas tu o saberás depois” (João 13:7).

A vida precisa valer a pena, e para tal, tem que fazer sentido. Salvar-se é perceber-se parte de um plano maior. Somos salvos da insignificância. Ser salvo seria viver por aquilo pelo qual se dispõe a morrer. É reconhecer que a missão que recebemos ao nascer é mais importante e sagrada do que a vida em si (At.20:24).  E segundo Jesus, somente abrindo mão dela é que se pode salvá-la. O inverso também é verdadeiro. Quando se faz questão de preservá-la, ela escorre por entre os dedos (Lc.17:33). Quem nunca se dispôs a um sacrifício por um bem maior, não sabe realmente o que é viver.

Viver pela fé é encontrar este sentido na perspectiva do futuro. É ter a certeza de que no final tudo se encaixará perfeitamente, e de que não ficarão perguntas sem respostas. Não que Deus nos deva explicação, mas Ele certamente fará questão de nos desvendar os olhos a fim de que nos maravilhemos e nos regozijemos em Seu glorioso plano.

Ao deixarmos a esfera temporal, encontramos a plenitude do sentido em retrospectiva. Por enquanto, resta-nos alegrar-nos com vislumbres proporcionados pela fé. Há coisas que ainda não compreendo, mas prefiro confiar. O futuro justificará as aflições do tempo presente. Como bem disse Paulo: “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada” (Rm.8:18).

Lembro-me da última viagem que fiz com meu pai antes de seu falecimento em 2001. Estávamos caminhando pelas ruas de sua terra natal, a pacata cidade de Irupi no interior do Estado do Espírito Santo. De repente, ao pararmos de frente a um barranco, meu pai começou a chorar. Contou-me que ali seu pai lhe havia dado a última surra aos 19 anos. Sem jamais ter-lhe dado uma explicação, seu pai tomou um chicote usado em burro, e bateu nele até deixa-lo arriado. Na madrugada seguinte, meu pai pegou suas coisas e saiu de casa em direção ao Rio de Janeiro. Senti a dor que ainda havia no coração do meu velho pai e quis atenuá-la, consolando-o de alguma maneira. Como que por insight, disse-lhe: Acho que tenho uma resposta, pai. Não sei o porquê, mas imagino que haja um ‘pra quê’. Não fosse aquela surra, o senhor não teria ido para o Rio, onde conheceu a minha mãe, e principalmente, a Jesus. Logo, não fosse aquela surra injusta, eu não estaria aqui ao seu lado.

Dizer que Jesus é o Senhor é reconhecer que Ele sempre esteve por trás dos bastidores da história, conduzindo-a segundo o Seu eterno propósito. É reconhecer que nada aconteceu, acontece ou acontecerá por acaso. Tudo coopera para o bem daqueles que O amam e que são chamados segundo o Seu propósito (Rm.8:28). Cada nota dissonante tem seu lugar na sinfonia composta por Deus. Isolando-a, não tem beleza alguma. Mas colocando-a entre outras notas, percebe-se sua beleza.

Que beleza haveria na grotesca cena da crucificação? Isaías exprime seu horror ao vislumbrá-la:

“Não tinha formosura nem beleza; e quando olhávamos para ele, nenhuma beleza víamos, para que o desejássemos.Era desprezado, e rejeitado dos homens; homem de dores, e experimentado nos sofrimentos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum.Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e carregou com as nossas dores; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e esmagado por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.” Isaías 53:2-5

A cruz, como um evento isolado, parece-nos brutal, sem sentido, pitoresco, mas na perspectiva do plano de redenção, é o capítulo mais glorioso da história da humanidade. É o amor revelado em toda a sua majestade.

Jesus sabia o que teria que passar, e quando Seus discípulos tentaram dissuadi-lo, Ele respondeu:

“Agora a minha alma está perturbada; e que direi eu? Pai, salva-me desta hora? Mas para isto vim a esta hora.” João 12:27

Quando não se vive na perspectiva da fé, valorizamos o momento em si, e não o que ele representa no contexto geral. O que importa é livrar-nos da dor, do sofrimento momentâneo, e não cumprir o propósito que nos trouxe até aqui. Porém, a fé nos faz vislumbrar o resultado de tudo aquilo, de sorte que a dor é sublimada para que a missão seja cumprida. Ainda que a alma se perturbe, ela não esmorecerá. O que tiver que ser, será. Então, que se cumpra em nós a Sua vontade, mesmo que nos custe nosso conforto.

O problema é que não enxergamos a vida em perspectiva. Tudo o que nos importa é o aqui e o agora. Esquecemo-nos do longo caminho percorrido por todos os que nos antecederam para que chegássemos até aqui. Somos frutos de todas as contingências permitidas pelo arquiteto das circunstâncias. Com isso em vista, Paulo vaticina: “Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens” (1 Co.15:19). Nossa vida é apenas um elo numa corrente interminável de elos que nos antecederam e que nos sucederão.

Carregamos conosco o DNA que recebemos de nossos progenitores e que repassaremos aos nossos herdeiros. Podemos dizer que em certo sentido, nossa salvação pessoal implica também na reconciliação do tronco do qual somos ramos. Nossos pais foram redimidos em nós. Sua história foi justificada pelo fruto que ela produziu: nós. Repare: eu não disse que eles foram redimidos POR nós, mas EM nós.

Talvez tenha sido neste sentido que Paulo afirmou que a mulher seria salva “dando à luz filhos” (1 Tm.2:15). Um filho é capaz de redimensionar nossa vida, atribuindo-lhe novo significado. Toda dor que a mulher sente ao parir é justificada quando se lhe é dada a alegria de embalar nos braços o fruto do seu ventre. Nas palavras de Jesus, “a mulher quando está para dar à luz, sente tristeza, porque é chegada a sua hora, mas, depois de nascida a criança, já não se lembra da aflição, pelo prazer de ter vindo um homem ao mundo” (Jo.16:21).

Se nossos filhos são a nossa “salvação” (a justificação de nossa existência), somos, por assim dizer, a “salvação” dos nossos pais. Eles não são salvos por nós, mas EM NÓS!

O escritor de Hebreus diz que em Abraão, Levi, seu descendente de quarta geração, deu o dízimo (Hebreus 7:9). Portanto, o que meus filhos fizerem, de certo modo, será creditado a mim. E o que eu faço hoje, de igual modo, pode ser creditado àqueles que trago latentes em mim. Sou fruto de uma árvore, e ao mesmo tempo, trago em mim as sementes que originarão muitas outras árvores e seus respectivos frutos.

Em mim, Deus resgata a história dos meus pais. Nos meus filhos, minha própria história será justificada. Não seria disso que Paulo falava ao citar a curiosa e misteriosa prática de batismo pelos mortos? Repare no contexto:

“Porque assim como a morte veio por um homem, também a ressurreição dos mortos veio por um homem.Porque, assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo.(...)  Porque convém que reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo de seus pés.Ora, o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte.(...) E, quando todas as coisas lhe estiverem sujeitas, então também o mesmo Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos.Doutra maneira, que farão os que se batizam pelos mortos, se absolutamente os mortos não ressuscitam? Por que se batizam eles então pelos mortos?” 1 Coríntios 15:21-22, 25-26, 28-29

Muito já foi dito sobre a misteriosa passagem. Há até uma igreja que promove batismo pelos mortos. 

Particularmente não creio que Paulo estivesse falando de uma prática à parte do habitual batismo promovido na igreja primitiva. Outrossim, creio que o apóstolo estivesse reportando à abrangência da obra realizada por Cristo, representada na cerimônia batismal.

Creio que tanto a passagem em que Paulo diz que a mulher seria salva gerando filhos, quanto a que fala do batismo pelos mortos apontam numa mesma direção. Somos salvos ‘pelo’ futuro! Não me refiro à salvação em termos soteriológicos, mas no sentido de ressignificar a vida, dando-lhe um propósito que vá além de nosso horizonte existencial. No caso da mulher dando à luz parece ser claro. Quanto ao batismo pelos mortos, precisamos considerar que para nossos antepassados, nós somos o futuro. Portanto, em nós suas vidas são ressignificadas [1]. Quando somos batizados, tudo aquilo de que somos compostos, nossa bagagem existencial, nossa carga genética, nossa história desde nossos tataravôs, desce conosco às águas batismais. Nossa história é redimida.

Isso parece encontrar ressonância na promessa em que Deus afirma: “Sou Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam, mas faço misericórdia até MIL GERAÇÕES daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos” (Êx.20:5b-6).

Repare nisso: Deus visita a maldade dos pais NOS filhos. Os filhos são perpetuadores da história dos pais. Portanto, a redenção deles implica na redenção da história começada em seus pais. Uma vez que a misericórdia triunfa sobre o juízo, sua abrangência é sempre maior. O mesmo Deus que visita a maldade dos pais nos filhos até quatro gerações, tem misericórdia dos pais nos filhos até MIL GERAÇÕES.

Jesus ratifica este princípio ao desmascarar a hipocrisia dos fariseus:

"Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês edificam os túmulos dos profetas e adornam os monumentos dos justos. E dizem: ‘Se tivéssemos vivido no tempo dos nossos antepassados, não teríamos tomado parte com eles no derramamento do sangue dos profetas’.Assim, vocês testemunham contra si mesmos que são descendentes dos que assassinaram os profetas.Acabem, pois, de encher a medida do pecado dos seus antepassados!” Mateus 23:29-32

Ora, se um indivíduo impenitente ajuda a completar a medida do pecado de seus antepassados, o que acontece com aquele que se arrepende? Este não apenas começa uma nova história, mas também provoca uma guinada na história dos seus ancestrais. Nossa história particular é um capítulo da saga de nossa família. Por isso, Deus promete a Abraão que através dele seriam benditas todas as famílias da terra. Sempre que alguém se volta para Deus, seu tronco familiar é abençoado.

Ao responder à pergunta do carcereiro de Filipo, Paulo afiançou-lhe que se cresse em Jesus Cristo, tanto ele quanto sua casa seriam salvos (At.16:31). Seria isso uma referência aos seus descendentes, à sua família atual, ou também englobaria seus ancestrais? O termo grego para casa é oikos, que em alguns textos do Novo Testamento alude às origens de uma pessoa. Em Lucas 1:27 lemos que José era da “casa de Davi”. Por isso mesmo, Jesus era chamado de “filho de Davi”.

Trago latente em mim aqueles que do meu tronco ainda brotarão. Da mesma maneira como estive latente em meus ancestrais. Por isso que quando Adão pecou, todos pecamos com ele, pois já existíamos nele. 

Quando ele caiu, todos caímos. Porém, fomos enxertados na Videira Verdadeira que é Cristo, de maneira que também estávamos n’Ele durante o tempo de Sua peregrinação, desde o Seu nascimento até Sua ascensão.

Mesmo quando partirmos, continuaremos nossa peregrinação no mundo através daqueles que carregarem nosso DNA. Viveremos neles de maneira imanente, assim como eles vivem em nós agora de maneira latente. Porém, quando Cristo Se manifestar, também nos manifestaremos com Ele, de sorte que deixaremos a existência imanente pela existência patente. Porém, em Cristo existimos de maneira transcendente. Repare nisso: quatro formas de existência.

Latente, imanente e patente, transcendente.

Existimos de forma latente em nossos ancestrais. Existiremos de forma imanente em nossos descendentes. Existimos de forma patente durante o tempo de nossa peregrinação. Existiremos de forma transcendente através de Cristo pelos séculos dos séculos, e através disso, nossa essência será preservada para sempre.




[1]Ressignificação é o método utilizado em neurolingüística para fazer com que as pessoas possam atribuir "novo significado" a acontecimentos pela mudança de sua visão de mundo.

* Este texto foi publicado originalmente no dia 04/09/2012 sob o título "Salvos pelo futuro: a reconciliação dos que partiram."

Projeto Lei contra piadas religiosas do Porta dos Fundos é votado no Rio de Janeiro

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Por Hermes C. Fernandes

A bancada evangélica do Rio de Janeiro pretende aprovar um projeto lei que criminaliza piadas envolvendo crenças religiosas. A votação da PL está programada para esta quarta-feira em regime de urgência e prevê multa de até R$ 270 mil para quem satirizar ou ridicularizar dogmas e crenças de todas as religiões. O projeto é de autoria do deputado Fábio Silva, filho do empresário e ex-deputado Francisco Silva, proprietário da Rádio Melodia FM. Caso seja aprovada, a lei proibirá  o uso de imagens de cunho erótico vinculadas a qualquer religião ou crença. Além da multa, quem descumprir a proposta de lei ficará impedido de realizar eventos públicos que dependam de autorização dos poderes públicos por cinco anos, e não poderá receber recursos públicos por dez anos. 

O projeto lei tem endereço certo e visa coibir grupos como o dos humoristas do Porta dos Fundos de fazer esquetes que brinquem com símbolos cristãos, bem como manifestações como a realizada na última Parada Gay em que uma transexual encenou a crucificação de Cristo. 

Já virou rotina os humoristas do Porta dos Fundos provocarem a ira dos evangélicos. Em um de seus vídeos, eles fazem escárnio explícito da mais popular festa cristã: o Natal.  Rapidamente, pastores e líderes vieram a público pedirem para que os crentes boicotassem seu canal no youtube

Concordo com meus colegas que o pessoal do Porta dos Fundos tem abusado de sua liberdade de expressão, desrespeitando a crença de milhões de brasileiros. Todavia, não comungo da ideia de que a melhor saída seja o boicote ou mesmo a promulgação de uma lei. A meu ver, isso só faz propagar ainda mais o canal. Creio ter sido esta a intenção dos humoristas. Pessoas que nunca tiveram qualquer interesse em conhecê-lo, certamente o farão quando ouvirem de seus líderes a recomendação de evitá-lo.

É preferível simplesmente ignorar. 

Ademais, se não demonstrarmos qualquer incômodo com suas piadas religiosas, eles provavelmente desistirão. Funciona mais ou menos como o bullying na escola. Se sentir-se ofendido, continuará até lhe tirar do sério. Se não importar-se, vai minguando até acabar. 

Apesar do admirável zelo demonstrado pelos defensores da fé, há algo que me deixa preocupado. Será que se eles fizessem piadas com os excluídos, os oprimidos, com os que não se enquadram nos moldes do sistema, demonstraríamos o mesmo zelo em defendê-los? Por que só nos manifestamos em causa própria? E se a brincadeira envolvesse símbolos de outras tradições religiosas? Isso não revelaria o quão corporativistas temos sido? 

Sinceramente, prefiro levar na esportiva. Confesso que, às vezes, até rio. Se não da piada em si, da ignorância de quem a contou. 

Outra questão que julgo relevante: até que ponto não somos nós mesmos os culpados por termos nossa fé alvo de tantas chacotas? Que tipo de cristianismo temos vivido? Talvez devêssemos aproveitar a ocasião para fazer uma mea culpa e reavaliar alguns de nossos posicionamentos junto à sociedade e às suas demandas. Se assim procedermos, talvez o que seja motivo de riso para alguns, se torne motivo de lágrimas para nós, conduzindo-nos ao arrependimento de nossa apatia e de nossa fé caricata. Não é a Cristo que atacam, nem mesmo os nossos mais caros símbolos, mas ao nosso cristianismo alienado e descomprometido com a ética do reino de Deus. 

Creio que no juízo haverá menos rigor com quem conta piadas sobre a nossa fé do que com quem torna nossa fé motivo de piadas. 


P.S.: No final dos anos 70, em duas ocasiões distintas, nossa casa e nosso carro foram apedrejados sob os gritos de "Tim Tones! Pastor ladrão!" Tudo devido a um quadro do programa de Chico Anísio em que ele criticava a atuação de pastores evangélicos através do personagem Tim Tones, uma sátira ao pregador norte-americano Jim Jones, responsável pelo suicídio coletivo de 900 fiéis. Lembro-me perfeitamente de todo bullying que eu e meus irmãos sofríamos na escola quando nossos colegas descobriam que éramos filhos de pastores. Numa das vezes, fui perseguido pelas ruas de Quintino por nove colegas que queriam me dar uma surra. Tive que me esconder atrás do balcão de uma farmácia. Tudo por causa de piadas religiosas. Apesar disso, sigo sendo a favor da total liberdade de expressão. Não venceremos o preconceito simplesmente por impormos nossa fé ou nossa cosmovisão. Isso só piora as coisas e nos faz cada vez mais motivo de chacota.


A melhor e pior de todas as notícias

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Por Hermes C. Fernandes

Fico imaginando o quanto deve ser difícil para um âncora de telejornal transmitir uma notícia triste. Recentemente, estava assistindo a um telejornal matutino, quando a âncora (uma das mais prestigiadas do Brasil) teve que dar uma notícia triste, seguida de uma alegre. Além de jornalista, ela teve que ser uma ótima atriz. Seu semblante e tonalidade de voz mudaram drasticamente, para que as notícias fossem transmitidas com credibilidade.

Somos portadores da mais importante notícia de todos os tempos: as boas-novas do Reino de Deus. Anunciamos ao Mundo que o Filho de Deus entregou Sua vida por nossos pecados, ressuscitou e está, agora mesmo, reinando soberanamente sobre toda a Criação. Não se trata de uma notícia simples de ser dada, porque envolve aspectos positivos e negativos. A Cruz de Cristo revela, ao mesmo tempo, nossa malignidade e a bondade de Deus.

Olhando para a Cruz, vemos o que a sociedade humana é capaz de fazer a alguém que só falava de amor, o mais perfeito ser que passou por este mundo. Tal notícia deveria corar nossa face de vergonha. A Cruz denuncia nosso grau de perversividade.

Mas ela também nos revela o mais elevado amor. Deus não desistiu de nós! Vejam do que Ele foi capaz para demonstrar o quanto nos ama e Se importa com nossas dores e sofrimento.

Pela Cruz, nossa dívida foi paga. Nossa comunhão com Deus foi reatada. Tem notícia melhor do que esta? Quem estaria apto a transmitir uma notícia tão poderosa e subversiva quanto esta?

Davi havia eleito Aimaás, filho do sacerdote Zadoque, para ser quem lhe traria notícias do campo de batalha (2 Sm.15:36). Quando Absalão, o filho usurpador de Davi, morreu pelas mãos de Joabe enquanto estava preso pelos cabelos em uma árvore, Aimaás se ofereceu para levar a notícia ao Rei. Porém, não era uma notícia comum. Era, ao mesmo tempo, uma boa e uma má notícia. Boa, porque o inimigo do rei morrera. Ruim, porque o tal inimigo do rei era ninguém menos que seu próprio filho.

Como transmitir esta notícia? Pelo que o texto indica, Aimaás não estava muito preocupado com isso. Pra ele, bastava dizer: “O Senhor te livrou do poder dos teus inimigos”.

Mas Joabe sabia que não era tão simples assim. Percebendo a inaptidão de Aimaás, Joabe sentenciou: “Tu não serás hoje o portador das novas. Outro dia as levarás, mas hoje não darás a nova, porque é morto o filho do rei” (2 Sm.18:20).

Somos comissionados por Deus a anunciar a Morte do Filho de Deus até que Ele venha (1 Co. 11:26). A morte de Cristo é o cerne do Evangelho. Paulo tinha consciência da seriedade disso: “Pois nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. E eu estive convosco em fraqueza, e em temor, e em grande tremor” (1 Co.2:2-3).

Anunciar a morte do Filho do Rei deve ser encarado com a devida seriedade.

Em vez de Aimaás, Joabe preferiu comissionar um etíope anônimo. Deve ter sido uma ofensa para alguém tão importante como Aimaás, filho do sacerdote, ser preterido por um etíope.
“Disse Joabe a um etíope: Vai tu, e dize ao rei o que viste. O etíope se inclinou diante de Joabe, e saiu correndo.” 2 Samuel 18:21
Deus tem seus critérios de escolha. Ele não está preso às convenções sociais. De acordo com Paulo, “Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes. Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são; para que ninguém se glorie perante ele” (1 Co.1:27-29).

Quando o etíope se viu comissionado, a primeira coisa que fez foi se inclinar, humilhando-se diante daquele que lhe confiou tão nobre missão. Em seguida, saiu em disparada.

Aimaás não aceitou ser preterido. Como um humilde e insignificante etíope poderia substituí-lo? E todos os anos gastos no tabernáculo? E a educação primorosa que recebera? A seu ver, tudo quanto vivera até aquele instante, preparou-o para ser portador daquela mensagem. Ele não podia deixar barato.
“Insistiu Aimaás, filho de Zadoque: Seja o que for, deixa-me também correr após o etíope. Mas Joabe respondeu: Por que correrias tu, meu filho? Não receberás nenhuma recompensa pelas notícias?” (v. 22).
A questão agora não era se seria ou não recompensado. O que o incomodava era ter sido substituído por alguém que ele considerava desqualificado. Portanto, era uma questão de honra. Olhando firmemente para Joabe, respondeu: “Seja o que for, disse Aimaás, correrei. Disse-lhe Joabe: Corre. Aimaás correu pelo caminho da planície, e passou adiante do etíope” (v. 23).

- Ok, Aimaás. Você venceu! Se quer ir, vá!

- Deixa comigo! Você não vai se arrepender! Ninguém melhor do que eu para cumprir esta missão.

Por causa de sua insistência, Joabe fez uma concessão.

Comissão x Concessão

Enquanto o etíope tinha uma comissão, Aimaás recebera uma concessão. Ser comissionado é receber uma missão, um propósito. Já a concessão é uma permissão.

Cabe aqui uma reflexão acerca das atividades com as quais estamos envolvidos em nosso dia-a-dia. Estaríamos nelas por comissão ou por concessão? Se fomos comissionados, nossa trabalho nos proporcionará prazer. Mas se entramos em algo apenas por uma concessão divina, sem termos sido vocacionados para aquilo, aos poucos o prazer se transformará em enfado.

Nossa existência precisa servir a um propósito, que nos servirá de motivação até o cumprimento de nossa missão.

Até hoje, os etíopes são famosos por sua habilidade atlética. Muitos dos campeões olímpicos de atletismo são etíopes. Imagino que para alcançar e ultrapassar aquele atleta africano, Aimaás deve ter se esforçado ao máximo. Ele tinha que provar pra todo mundo, inclusive para si mesmo, que era capaz de dar conta daquela missão.

Para ele, tudo não passava de uma competição. Era isso que o estimulava a correr.

Ele sequer teve tempo de pensar em como daria aquela notícia ao Rei Davi.
“Davi estava assentado entre as duas portas, e a sentinela subiu ao terraço da porta junto ao muro e, levantando os olhos, viu um homem que corria só. Gritou a sentinela, e o disse ao rei. O rei respondeu: Se vem só, deve trazer boas notícias. E o mensageiro aproximava-se cada vez mais. Então a sentinela viu outro homem que corria, e gritou ao porteiro, e disse: Olha, lá vem outro homem correndo só. Disse o rei: Também esse traz boas notícias” (vv.24-26).
Davi estava apreensivo. Que notícia o rei esperava receber?

Só havia duas hipóteses:

• Seu filho vive! Portanto, seu reino ainda está ameaçado.

• Seu reino já não sofre qualquer ameaça. Seus inimigos foram liquidados! Portanto, seu filho está morto.
“Disse a sentinela: Vejo o correr do primeiro, que parece ser o correr de Aimaás, filho de Zadoque. Disse o rei: Este é homem de bem, e virá com boas novas” (v.27).
Pelo jeito, Aimaás tinha uma maneira característica de correr que o distinguia dos demais. De longe foi reconhecido pela sentinela. O rei respirou fundo e disse: Se é Aimaás, a notícia deve ser boa. Ele não viria me trazer más notícias. Ele é um garoto educado entre os sacerdotes. Joabe não o enviaria com notícias ruins. Ademais, quem se atreveria a correr sozinho para dar uma notícia ruim? Qualquer mensageiro sabia que seu pescoço estava em jogo. Se o rei não gostasse do que ouvisse, poderia ordenar a sua execução ali mesmo.

Convém recordar que Jesus orientou aos Seus discípulos a irem de dois em dois. Correr sozinho não é recomendável.

Quando se viu diante do rei, Aimaás o saudou gritando: “Paz. Inclinou-se ao rei com o rosto em terra, e disse: Bendito seja o Senhor teu Deus, que entregou os homens que levantaram a mão conta o rei meu senhor” (v.28).

Repare que ele foi bem evasivo. Não quis entrar em detalhes. Talvez tenha pensado: - Deixarei o rei tirar suas próprias conclusões. Mas o rei não se deu por satisfeito com uma notícia tão genérica.
“Perguntou o rei: Vai bem o jovem Absalão? Respondeu Aimaás: Vi um grande alvoroço, quando Joabe mandou o servo do rei, e a mim, teu servo, porém não sei o que era” (v.29).
Covarde! Cadê o valente que se sentiu desonrado por ter sido preterido por um etíope? Por que não diz o que foi enviado a dizer? Por que esconde o jogo?

O que Aimaás queria era apenas fazer uma média com o rei.

Há muitos Aimaás em nossos dias. Gente preocupada em resguardar sua posição, em ser vista, elogiada, mas que não cumpre cabalmente a sua missão. Já nos tempos de Paulo verificamos o mesmo fenômeno. O apóstolo denuncia aqueles que “pregam a Cristo por inveja e porfia”, que “anunciam a Cristo por contenda, não sinceramente” (Fp.1:15,17).

Aimaás estava tão preocupado com sua performance como atleta, em chegar primeiro que o etíope, que não se preocupou em dar a notícia com precisão. É melhor chegar em segundo, mas cumprir a missão, do que chegar em primeiro e deixar a desejar.

O texto diz que Davi ordenou que Aimaás se colocasse ao seu lado, enquanto esperava a chegada do outro mensageiro. A mesma coisa se sucede à igreja, quando perde a credibilidade e sua mensagem deixa de ser pertinente. Ela é posta de lado do processo histórico. Deixa de ser protagonista para ser expectadora.

Enquanto Aimaás se colocava ao lado de Davi achando que cumprira sua missão, “chegou o etíope, e disse: Ouve, senhor meu rei, a boa notícia. Hoje o Senhor te livrou do poder de todos os que se levantaram contra ti. Perguntou o rei ao etíope: Vai bem o jovem Absalão? Respondeu o etíope: Sejam como aquele jovem os inimigos do rei meu senhor, e todos os que se levantam contra ti para te fazerem mal. Então o rei, profundamente comovido, subiu à sala que estava por cima da porta, e chorou: E andando, dizia: Meu filho Absalão, meu filho, meu filho Absalão! Quem me dera que eu morrera por ti, Absalão, meu filho, meu filho!” (vv.31-33).

A coragem que faltou em Aimaás, sobrou no etíope.

Ainda que perdesse a vida, pelo menos cumprira a sua missão. É com gente assim que a causa do reino necessita. "Homens que já expuseram as suas vidas pelo de nosso Senhor Jesus Cristo" (At.15:26); que amem mais sua missão do que sua própria existência (At.20:24).

A notícia que trazia ao rei era tanto boa, quanto ruim, pois anunciava, ao mesmo tempo, a derrota dos inimigos do rei, e a morte de seu filho. O etíope foi sábio ao partilhá-la. Soube usar as palavras de maneira tal, que o rei não lhe fez mal algum. Qual foi a reação de Davi? Ele se angustiou, e andando de um lado para o outro, sentiu-se culpado pelo triste destino que teve seu filho.

E qual tem sido a reação do Mundo à nossa mensagem? Tem havido arrependimento? As pessoas se sentem culpadas por haver morrido o Filho do Rei? Elas se sentem responsabilizadas pela Cruz? Sentem que foram seus pecados que expuseram o Filho de Deus ao vitupério? Ora, se não houver arrependimento, tristeza, vergonha, culpa, também não haverá conversão.

O objetivo de nossa mensagem não é fazer com que as pessoas se sintam bem consigo mesmas, mas despertá-las em sua consciência, para que se convertam a Deus. Como disse Paulo: "A tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação" (2 Co.7:10a).

Assim como Absalão, Cristo foi morto em uma árvore, levantado entre o céu e a terra, não por haver se rebelado como ele, mas por obediência ao Pai, a fim de que nossos pecados fossem devidamente tratados e perdoados. Quando olhamos para Cruz e vemos nossa maldade exposta, nos arrependemos. E quando vemos a bondade de Deus, nos convertemos.

Publicado originalmente em 27/03/2009

A face desconhecida de Jesus

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Por Hermes C. Fernandes

“Por aquele tempo ouviu Herodes, o tetrarca, a fama de Jesus, e disse a seus servos: Este é João Batista; ressurgiu dos mortos, e por isso nele operam estes poderes miraculosos” (Mt.14:1).

Depois de haver ordenado que João fosse degolado, Herodes passou a ser assombrado pela culpa. Depois de passado o efeito da bebida, ele se deu conta de que havia sido manipulado. Agora, ouvindo sobre os milagres que Jesus fazia, julgou que João havia voltado dos mortos para assombrá-lo.

Por que razão Herodes confundiu Jesus com João? Será que por serem primos? Não! O fato é que Jesus, ao receber a notícia da morte de seu primo, foi para o deserto, lugar onde João desenvolvera seu ministério, e ali, realizou milagres, e alimentou uma multidão com cinco pães e dois peixinhos.

O cenário em que Jesus fizera tal milagre era o mesmo em que João conclamara seu povo ao arrependimento. Mesmo afastado da sociedade, frequentando lugares inóspitos como o deserto, a mensagem de João ecoou nos palácios e nas avenidas dos grandes centros urbanos da época.

O excêntrico profeta, que se alimentava de mel e gafanhotos, e se vestia como um eremita, tornou-se uma ameaça ao status quo. Principalmente, quando passou a denunciar os erros praticados pelas autoridades. Nem o rei fora poupado, pois tomara por esposa Herodias, a mulher de seu próprio irmão.

Alguém teria que calá-lo a qualquer custo. Porém, Herodes deparava-se com outro problema: a grande popularidade de João. Mandar matá-lo poderia provocar uma reação inusitada na população. Portanto, executar o profeta seria um suicídio político.

A alternativa foi tirá-lo de circulação por algum tempo, até que sua popularidade caísse. E para isso, Herodes ordenou sua prisão. Aparentemente, o problema estava resolvido. Mas havia alguém que ainda não estava satisfeito: Herodias. Para ela, o problema não era apenas político, mas pessoal. Sua honra precisava ser lavada.
“Festejando-se, porém, o dia natalício de Herodes, dançou a filha de Herodias diante de todos e agradou tanto a Herodes, que este prometeu, com juramento, dar-lhe tudo o que pedisse. Então ela, instruída por sua mãe, disse: Dá-me aqui num prato a cabeça de João Batista” (6-8).
Era agora ou nunca!

Herodes caiu como um pato! Encantado pela sensualidade de sua enteada, o rei prometeu lhe dar qualquer coisa. Em outra passagem correlata, diz-se que Herodes ofereceu até metade do seu reino, caso ela quisesse. Havia algo mais valioso do que a metade do seu reino: A cabeça daquele anunciava a chegada do reino de Deus. O próprio Jesus dissera que dentre os nascidos de mulher, ninguém era maior do que João. Mesmo triste em ter que tomar uma decisão que lhe custaria a popularidade, Herodes, o rei fantoche, “mandou degolar a João no cárcere. A cabeça foi trazida num prato e dada à jovem, e ela a levou a sua mãe. Então chegaram os seus discípulos, levaram o corpo e o sepultaram. Depois foram anunciá-lo a Jesus” (10-12).

Qual seria a reação de Jesus? Uma explosão de raiva? Não! Amaldiçoaria Herodes? Nem pensar. Em vez disso, Jesus retirou-se para o lugar onde tivera Seu primeiro encontro com João, depois de adulto. Naquele momento de dor, Jesus preferiu o silêncio e a solidão. Era a hora de revelar Sua outra face. E sabe qual foi a resposta de Jesus a Herodes?

O texto diz que quando o povo soube onde estava Jesus, “seguiu-o a pé desde as cidades.” Jesus poderia ter dito: Deixem-me em paz! Respeitem o meu luto! Em vez disso, quando viu a multidão, “possuído de grande compaixão para com ela, curou os seus enfermos” (v.14). Eis a resposta que Jesus deu a Herodes. No mesmo cenário onde João desenvolvera seu ministério, Jesus agora fazia obras ainda maiores. Herodes até poderia calar a voz de um profeta, mas não poderia impedir a expansão do Reino de Deus. Mas não pára aqui.

Como Rei, Cristo demonstrou possuir um perfil completamente diferente de Herodes e dos demais reis deste mundo. Herodes estava preocupado era com sua popularidade. Jesus se preocupava com o bem-estar dos que O seguiam. São motivações completamente opostas. Herodes era movido pelo amor-próprio. Jesus era movido por compaixão.

Veja o que diz o texto:
“Chegada a tarde, os seus discípulos aproximaram-se dele, dizendo: O lugar é deserto, e a hora é já avançada. Despede a multidão, para que vão pelas aldeias, e comprem comida para si” (15).
Quem ousaria dizer o que Jesus deveria ou não fazer?

Jesus não era marionete nas mãos de ninguém, nem mesmo dos Seus discípulos. O Jesus que tem sido difundido em nossos dias não passa de uma caricatura, uma espécie de Cristo Genérico, que vive em função dos caprichos dos seus seguidores. E muitos crentes acham que podem até “seduzi-lo” com suas danças e performances. Se agradá-lO suficientemente, a ponto de deixá-Lo ‘fora de si’, pode-se pedir o que quiser, que Ele atende imediatamente.

Quanta tolice.

Mas a culpa não é deles. Como a culpa não era da enteada de Herodes. Ela foi apenas massa de manobra nas mãos de sua mãe. A culpa é dos líderes, que se acham detentores do monopólio do reino dos céus. Mais duro juízo virá sobre eles. São guia de cegos! E por causa deles, muitos profetas genuínos têm sido calados em nossos dias.

Anos atrás, tínhamos um programa de rádio no Rio de Janeiro, que estava alcançando uma grande audiência. O dono de umas dessas indústrias religiosas, mandou chamar o dono da emissora em sua catedral em SP para uma reunião. Lá ofereceu-lhe uma maleta com trezentos mil dólares para que fôssemos tirados do ar. O dono da rádio, nosso amigo há muitos anos, perguntou a razão que o levara a fazer tal proposta. Sabe o que ele ouviu do tal líder?

- Neste ramo de negócios só há duas maneiras de se manter. Primeiro é fazendo-se ouvir, e segundo é fazendo calar a concorrência.

Este mesmo líder tinha um programa nesta emissora que era precedido por uma programação espírita afro-brasileira. O dono da rádio ofereceu-lhe aquele horário, dizendo que os espíritas não conseguiriam pagar por causa do aumento no preço. Sabe o que ele fez? Ofereceu pagar pela manutenção da programação espírita, para que seu programa não perdesse aquela audiência. Por vários anos, o programa de macumba foi mantido pelas ofertas e fogueiras santas daquela ‘igreja’.

Tenho pena das filhas de Herodias! Elas dançam conforme a música. Mas não tenho pena de Herodes, nem tampouco de Herodias. Em vez disso, glorio-me na valentia dos profetas cuja cabeça acaba num prato, por não negociarem com a verdade.

Os discípulos de Jesus acharam que poderiam ditar o que Jesus deveria fazer naquele instante. Foi, de fato, um momento decisivo em Seu ministério. Se Jesus cedesse, Ele Se tornaria mais uma marionete nas mãos dos Seus seguidores. Em vez de despedir da multidão, Jesus lhes disse: “Não é preciso que se retirem. Dai-lhes vós de comer” (16).

E há quem se atreva a querer colocar Deus contra a parede!

Se Ele é Deus, Ele é quem dá as ordens.

Ele não é rei de enfeite. Nem fantoche de ninguém.

Quando nos sentamos no banco carona de um carro, vemos a face direita de quem o conduz. Esta é a face da autoridade. Mas se a pessoa que conduz o veículo trocar de lugar com a que está no carona, em vez da face direita, sua face esquerda é que será vista. Nos acostumamos tanto com a face esquerda de Cristo, isto é, com o Cristo que Se entrega, que Se faz servo, que acabamos estranhando, quando O vemos de outro ângulo, em Sua majestade e poder.

De fato, Cristo Se fez servo. Revelou-nos a Sua face de compaixão e amor. Mas isso não nos dá o direito de achar que Ele viva em função de nossos caprichos, e que nossos pedidos lhe soem como uma ordem.

O mesmo Cristo que esvaziou-Se, deixou Sua glória para caminhar por nossas ruas empoeiradas, agora está assentado em Seu trono de glória. O mesmo Cristo que nasceu numa manjedoura, foi também o parteiro das estrelas. As mãos que foram fixadas pelos cravos no madeiro, são as que sustentam as galáxias, e mantém presos os planetas em suas órbitas.

Não podemos nutrir uma visão míope de Cristo. Ele é 100% Homem, mas também é 100% Deus.

Quando os discípulos disseram que só tinham cinco pães e dois peixinhos que um menino oferecera, Jesus disse: “Trazei-mos.”

Não sei o que Herodes fez com o prato contendo a cabeça de João. Mas sei o que Jesus fez com aquele punhado de pães e peixes. Quem vai querer levar uma cabeça humana pra casa? Que serventia teria?

A resposta de Jesus àquele prato infame foram os doze cestos cheios de pães e peixes que sobraram depois que alimentara a multidão. Imagino o que os convidados de Herodes devem ter sentido quando viram aquela cena repugnante. Talvez tenham até vomitado sobre a mesa. Porém, a multidão alimentada por Jesus saiu satisfeita, arrotando peixe e palitando os dentes.

Dois reis. A qual deles servimos?

O rei fantoche ou o Rei dos reis?

Duas igrejas, a que entretém o rei e seus convidados, e a que busca agradar ao rei, alimentando os famintos de justiça. Não quero estar num palácio onde se perde a cabeça. Prefiro estar no deserto, onde multidões são alimentadas.

Aquele menino que oferece seu lanche a Jesus é a antítese da enteada de Herodes. A propósito, Deus não tem enteados. A menina pede... o menino oferece o que tem. Ela quer ser atendida, ele quer servir.

O resultado do desevangelho que tem sido pregado em nossos dias, é o surgimento de uma igreja pirracenta, mimada, que não reconhece a outra face do Seu Rei.

Só para os íntimos...

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Por Hermes C. Fernandes

“Jardim fechado és tu, minha irmã, esposa minha, manancial fechado, fonte selada.” 
Cânticos 4:12


Nossa vida é dividida em três esferas: a pública, a privada e a íntima.

A esfera pública é aquela à que todos têm acesso. Nela desenvolvemos alguns dos nossos papéis sociais mais importantes, tais como empregado ou empregador, chefe de família/dona de casa, professor ou aluno, cidadão, consumidor, etc. Estamos constantemente sendo avaliados pelos que nos cercam. Por isso, devemos tomar os cuidados necessários para que nosso comportamento não comprometa o nosso testemunho.

Porém, estabelecemos um perímetro e dizemos: Daqui ninguém passa, a menos que seja permitido. Trata-se, portanto, da esfera privada. Nunca época em que nossas vidas ficam expostas nas redes sociais, e somos vigiados 24 horas por dia através de câmeras espalhadas pela cidade, nunca se valorizou tanto a privacidade. Pode-se dizer que ela tem se tornado artigo de luxo. 

Há uma cerca que delimita a fronteira entre as esferas pública e privada de nossa vida. Apesar de nem todos serem bem-vindos, alguns se aproveitam das brechas da cerca para nos espreitar. Trata-se da prática do voyeurismo social. Querem saber como vivemos, como nos relacionamos, o que consumimos, etc.

Nossa vida privada deve ser como um jardim fechado. E será nesta esfera que faremos a triagem através da qual selecionaremos quem deve ter acesso à nossa intimidade.

Se a privacidade é guardada por cercas, a intimidade deve ser guardada por paredes bem espessas, mantida numa espécie de cofre à prova de invasão.

Nossa intimidade equivale a uma fonte selada, inacessível a quem não for convidado a dela desfrutar. Se para entrar na esfera privada precisa-se permissão, para entrar na esfera da intimidade requer-se convite. A intimidade é valor que não se pode violar, tão pouco negociar. 

Ninguém deverá saltar da esfera pública para a intimidade sem passar pela privacidade.

Alguns critérios devem ser respeitados antes que alguém se introduza em nossa intimidade.

Não há intimidade sem liberdade, nem liberdade sem confiança, nem confiança sem comprometimento, nem comprometimento sem amor, nem amor sem conquista. Quando falta confiança, os alicerces da intimidade vêm abaixo. E só há confiança legítima, havendo amor. Pode-se dizer que amor e confiança são os dois querubins que guardam nosso jardim. 

A intimidade é, por assim dizer, a coroação do amor. Intimidade sem amor nos faz sentir usados. Amor sem intimidade nos faz sentir desperdiçados.

Um dos maiores empecilhos à intimidade é a timidez, que consiste num bloqueio que nos torna inacessíveis. A timidez sugere que não queremos nos dar a conhecer. Preferimos o isolamento, a alienação. Ilhamo-nos em nosso mundo particular, contentando-nos com nosso narcisismo. Achamo-nos auto-suficientes. Bastamo-nos. 

Por isso os tímidos encabeçam a lista dos que não herdam o Reino (Ap.21:8), pois são incapazes de abrir-se ao outro. Sua intimidade é preservada ao custo da comunhão.

A timidez é uma represa que precisa ser rompida para que o amor flua com liberdade levando-nos a desaguar no mar da comunhão.

A timidez revela que estamos mais preocupados em nos preservar do que em promover a felicidade do outro.

Portanto, abramo-nos à comunhão, deixando de lado o que nos distancia uns dos outros. Porém, sejamos seletivos para com aqueles que desfrutarão de nossa intimidade. Que conquistem antes nossa confiança e revelem em gestos e palavras a sua lealdade.

Prazer, poder, posse, prestígio e... pressa!

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Por Hermes C. Fernandes

Jesus foi o único ser autenticamente humano. Para que fosse devidamente aprovado, teve que passar por um severo teste de qualidade em que enfrentou tudo o que desumaniza o ser.

O escritor sagrado afirma que Ele, "como nós, em tudo foi tentado" (Hb.4:15). Porém, resistiu firmemente, tornando-se "homem aprovado por Deus" (At.2:22). Fora Ele, todos foram reprovados e invariavelmente nos mesmos quesitos.  Somos, por assim dizer, esboços humanos. Cristo é o único devidamente acabado. Como ser humano por excelência, Ele é tudo o que fomos vocacionados a ser. E agora mesmo, o Espírito Santo, o sumo arte-finalista, está reforçando em nós os traços da imagem e semelhança de Deus, enquanto apaga as rasuras feitas pelo pecado. Estamos destinados a ser como Ele é, verdadeira e plenamente humano. 


O episódio conhecido como "A tentação no deserto" nos permite uma leitura arquetípica. Nele, Cristo é provado nas mesmas esferas em que todos os homens o são, a saber, nas áreas do prazer, poder, posse, prestígio e pressa.


Tão logo deixou a cena batismal, Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto para ser tentado. Repare: Ele não foi levado para se consagrar, para jejuar, ou coisa parecida, mas para ser tentado. O jejum de quarenta dias não visava torná-lo mais forte para resistir, e sim mais fraco para que a tentação fosse legítima. Se não tivesse fome, não se sentiria realmente tentado com a sugestão de transformar pedras em pães. 


Enquanto o primeiro homem foi tentado num cenário paradisíaco, tendo acesso a todas as árvores e frutos (exceto o que lhe fora vetado por Deus), o segundo Adão, Jesus, foi tentado num cenário inóspito, privado de qualquer conforto. O primeiro caiu, o segundo, manteve-se de pé. Portanto, não depende do cenário, se num deserto ou num jardim. Não depende se estamos de barriga cheia ou vazia. 


Quem o conduz ao deserto é ninguém menos que o próprio Espírito de Deus, aquele que manifestou-se sobre Ele em forma corpórea de uma pomba.


Na primeira investida do diabo, fora-lhe dito: "Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães." O que haveria de imoral ou mesmo antiético em usar Seu poder para transformar pedras em pães? Absolutamente nada. Seria precipitado acreditar que toda tentação vai de encontro a um princípio moral ou ético. O que concede à sugestão o status de tentação é a sua procedência. Por isso, Jesus responde: "Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que procede da boca de Deus." O problema não eram as pedras ou os pães mas a boca de onde procedia tal palavra. Se não vem da boca de Deus, corre sérios riscos de vir da boca do diabo. E se este for o caso, só nos cabe rechaçar, por mais razoável que pareça ser. 


A primeira tentação opera na área sensorial, onde habita nossas necessidades físicas e emocionais. Cada uma delas quando saciada promove prazer. Sentimos prazer no sono, na ingestão de alimento, no sexo. O prazer é um bônus concedido pelo Criador, porém, jamais deveria ser visto como o supremo objetivo da vida. Comemos porque precisamos sobreviver. Dormimos porque temos que recarregar as baterias e assim, estar prontos para trabalhar. Fazemos sexo para expressar nosso carinho e afeição pela pessoa amada (não apenas para a reprodução). O hedonista é aquele que busca o prazer pelo prazer, independente dos efeitos colaterais ou do sofrimento que poderá causar a outros. 


Na busca frenética por satisfação, muitos se dispõem a transformar pedras em pães. Buscam prazer em canais que não foram criados para isso. Um exemplo é a pornografia. Tentar extrair dela um prazer só encontrado na relação a dois é doentio na medida em que coisifica o ser humano. Outros buscam em relações extraconjugais o que deveria ser encontrado em seu próprio casamento. Sexo requer interação, troca de fluídos (tanto corporais, quanto emocionais), cumplicidade, carinho e... compromisso. O que não nos humaniza, nos coisifica. Jesus repudiou a sugestão de Satanás em usar Seu poder para transformar um mineral em fonte de nutrientes como carboidratos, proteínas e vitaminas. Comer faz bem, mas glutonaria não. Dormir é bom, mas preguiça não. Sexo é bênção, mas promiscuidade é maldição. Na área do prazer o que distingue o remédio do veneno é a dosagem. Se fizermos do prazer o objetivo central de nossas vidas ele se tornará vício e nos consumirá como uma droga. Toda palavra que procede da boca do diabo nos instiga à compulsão. A Palavra procedente da boca de Deus nos estimula o equilíbrio. 


Aprovado nesta área, o diabo o levou a outro cenário para ter Seu poder colocado à prova.

"Então o diabo o transportou à cidade santa, e colocou-o sobre o pináculo do templo,e disse-lhe: Se tu és o Filho de Deus, lança-te de aqui abaixo; porque está escrito: Que aos seus anjos dará ordens a teu respeito, e tomar-te-ão nas mãos, para que nunca tropeces em alguma pedra."
Se Jesus fosse dado à performance, certamente teria cedido ao apelo do diabo. Mas Ele jamais Se preocupou em provar nada a quem quer que fosse. Jamais deixou-se seduzir pelo poder. O que tornava esta tentação mais desafiadora não era a altura do pináculo mas a promessa de que haveria anjos trabalhando em Seu favor para impedir que Ele se esborrachasse no chão. Esta é a tentação do poder. Sentimo-nos confortáveis de saber que tem gente trabalhando para nós, sob nossas ordens diretas. Por que o cenário escolhido foi o pináculo do templo? Porque de lá Ele teria plateia. Os próprios sacerdotes testemunhariam assombrados Sua demonstração de poder. Sem plateia não há aplauso. Aquilo não era tentação para o deserto, onde ninguém assistiria. Estava em jogo tanto o Seu poder quanto o Seu prestígio. Repare que as duas primeiras tentações começam com a frase "Se tu és o filho de Deus...". Em outras palavras: - Mostra pra todo mundo que você é o cara! 

Tanto o poder como a busca desesperada por prestígio e reconhecimento desumanizam o ser. Almejamos o poder para nos sentir importantes e não para usá-lo em favor do bem comum. A notoriedade deixa de ser consequência natural de quando se busca a excelência naquilo que se faz para tornar-se no alvo dos alvos. Poder e prestígio se unem e conspiram contra nossa humanidade. 


Observe que o diabo usou descaradamente um trecho das Escrituras para compor sua indecorosa proposta.  Ninguém conhece tão bem a Bíblia quanto ele. Sua estratégia é justificada pelo fato de Jesus ter afirmado que só aceitaria palavras cujo procedimento fosse a boca de Deus. Porém, Jesus não deixou barato:  "Disse-lhe Jesus: Também está escrito: Não tentarás o Senhor teu Deus."


Um conhecimento medíocre das Escrituras pode causar danos tão grandes quanto a ignorância. Antes de abonar qualquer ensino ou doutrina baseados nas Escrituras, confiramos o que "também está escrito". Texto sem contexto é pretexto... Se fôssemos mais atentos, muitas heresias não se criavam...


Nesta resposta, Jesus deixa claro que acatar a sugestão do maligno era o mesmo que tentar a Deus. Não temos o direito de pinçar uma promessa e cobrar de Deus o seu cumprimento. Assim como nós, Deus não tem nada que provar a ninguém. 


Em sua última cartada, o diabo o transportou "a um monte muito alto; e mostrou-lhe todos os reinos do mundo, e a glória deles. E disse-lhe: Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares."


Alguns acham que Satanás estava blefando. Penso que não. Até aquele momento ele ainda era o príncipe deste mundo. Prometer o que não pode entregar não é uma tentação legítima. Nesta tentação encontramos dois elementos desumanizadores: a posse e a pressa.


Para instigar-lhe a cobiça, o diabo levou-o a um lugar de onde tivesse uma vista panorâmica (360o) de todos os reinos do mundo. Bastava que Jesus caísse prostrado aos seus pés e pronto... o mundo inteiro lhe seria entregue de mão beijada. Tentador, não? 


Quantos vendem a alma ao diabo para ter o que desejam! O problema da posse é que ela geralmente é uma estrada de mão-dupla. Tudo o que possuímos também nos possui. Somos consumidos por aquilo que elegemos como nosso sonho de consumo. Sucumbidos ante ao apelo publicitário, nunca estamos satisfeitos com o que temos. Sempre queremos mais, mais e mais; ainda que para alcançarmos as coisas, tenhamos que usar as pessoas. As coisas, em vez de as pessoas, tornaram-se objetos do nosso amor e devoção. Ceder ao apelo consumista é prostrar-se diante de Satanás. É etiquetar a alma e vende-la por qualquer bagatela, ignorando o altíssimo preço pago por Cristo pela sua redenção. 


Prazer, poder, prestígio, posse e... pressa!


Jesus tinha um cronograma que incluía sofrer perseguições, acusações falsas, traições, e por fim, uma morte vexatória na cruz. Tudo isso para que o mundo com todos os seus reinos fosse resgatado e devolvido a quem de direito (Ap.11:15). Satanás propõe-lhe um atalho. Ora, quem toma atalho é porque tem pressa. Em vez de cruz, genuflexão. Em vez de sacrifício, submissão cega ao príncipe deste mundo. 


Na era da pressa cultua-se a velocidade. Tudo é pra ontem. Ninguém tem paciência de esperar o tempo de maturação. Antes, o apressado comia cru, hoje, o apressado come macarrão instantâneo ou comida congelada levada ao micro-ondas. Em vez de paciência, cultivamos a ansiedade como se fosse virtude. 


Uma vez proferida a resposta que deu um 'chega-pra-lá' no diabo, "eis que chegaram os anjos e o serviam" (Mt.4:11). De onde concluímos que é melhor esperar e ser servido por anjos do que meter os pés pelas mãos e passar o resto da vida tendo do que se arrepender. 


Aprendemos com este episódio que há cinco forças que conspiram contra a nossa humanidade e buscam nos coisificar. Cada uma delas nos revela um inimigo para o qual não podemos dar trégua: 


* A carne (instigando-nos a priorizar o prazer a qualquer custo)

* O diabo (oferecendo-nos poder ou buscando fazer com que o usemos em benefício próprio)
* O mundo (atiçando nossa cobiça, oferecendo-nos posse)
* O ego (em sua ânsia por prestígio, glória, reconhecimento)
* O tempo (incitando-nos à ansiedade)

Como prevalecer sobre eles? Há dois caminhos diante de nós. O primeiro deles é o do legalismo que, com todas as suas proibições e ordenanças só faz colocar o vírus do pecado em quarentena. O segundo é a graça manifestada na cruz, a única capaz de neutralizá-lo e eliminá-lo. Uma vez crucificados com Cristo, deixamos de viver para nós mesmos e passamos a viver exclusivamente em função do propósito para o qual fomos criados e resgatados. Portanto, já não vivemos em função do prazer, do poder, do prestígio, da posse ou da pressa, mas em função do propósito. É um "p" que vale por todos os outros "p's".



Somente depois de experimentarmos o poder da cruz, estaremos habilitados a combater o desejo de poder com serviço, a ânsia por posse com partilha, a paixão por prazer com renúncia, a busca por prestígio com humildade e a pressa com perseverança.

Enquanto uns buscam bens para desfrutar, outros, poder para se beneficiar, outros, experiências para contar e outros, aplausos e reconhecimento para se vangloriar, receberemos do Senhor bens para repartir, poder para servir, experiências para ensinar e ainda por cima, transferiremos toda glória que recebermos para Aquele a quem reconhecemos como nossa única fonte.

Tudo o que nos é oferecido tem prazo de validade. O poder perece quando nossa habilidade é superada, e somos substituídos por alguém mais competente. A posse termina quando o bem adquirido se desgasta e vira lixo. O prazer é momentâneo, termina quando a necessidade é suprida. O prestígio de hoje é o anonimato de amanhã. Quem hoje nos aplaude, amanhã no vaia ou nos esquece. A única coisa que dura para sempre é o amor. Ele é que confere propósito à nossa existência. 

Tudo é vaidade! Tudo é saudade. As pessoas entram em nossa vida como quem já acena se despedindo. As coisas que pareciam tão duráveis desaparecem como miragem. O carro zero de hoje é a lata velha de amanhã. A roupa de grife vira pano de chão. O poder um dia se aposenta. A beleza atraente se esvai e sobra a exaustão e o tédio. Os aplausos se silenciam... Só sobra o amor.

E é este amor que nos constrange, "julgando nós assim: que, se um morreu por todos, logo todos morreram. E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou" (2 Co. 5:14-15).

O antídoto contra o veneno do "viver-para-si" (que é o coração de toda tentação e que desumaniza o ser) pode ser encontrado no finalzinho da doxologia de Paulo:
"Porque dele e por ele, e para ele, são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém." Romanos 11:36
Ora, se todas as coisas são d'Ele, logo, não há sentido em fazer da busca da posse o objetivo da existência. Tudo o que há já tem um dono: Jesus. Se todas as coisas subsistem "por Ele", logo todo o poder está concentrado em Suas mãos. Seria bobagem usurpá-lo. Se tudo existe "para Ele", logo é a Sua satisfação que deve ser alcançada, não a nossa. Porém, quando priorizamos o prazer divino, Ele nos faz participantes do mesmo. O que capacitou Jesus a vencer todas as tentações foi a palavra que ouvira da boca do Pai assim que foi batizado: "Este é o meu Filho amado em quem tenho prazer". Nossa busca frenética por satisfação pessoal é substituída pela busca daquilo que agrade a Deus. Diante de tudo isso, concluímos que a glória deva ser exclusiva do Senhor. Diferente da glória deste mundo que murcha com o tempo, a glória celestial é eterna. Daí não haver mais necessidade de sermos consumidos pela pressa. Vivemos para a eternidade. Como dizia Renato Russo, "temos todo o tempo do mundo", ou melhor, "temos toda a eternidade". Pressa pra quê?

Nossos teclados estão cheios de sangue!

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Por Hermes C. Fernandes


"Não espalharás notícias falsas nem serás cúmplice do ímpio, para seres testemunha injusta. Não seguirás a multidão para fazeres mal..."Êxodo 23:1-2a
Inocente! Esta é a conclusão da Polícia acerca de Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos, espancada até a morte no Guarujá em maio do ano passado por uma turba enfurecida, depois de ter sido acusada nas redes sociais de sequestrar crianças para serem oferecidas em sacrifícios em rituais de magia negra. Ainda que fosse culpada, ninguém teria o direito de executá-la sumariamente. 
O crime despertou a opinião pública quanto aos perigos que rondam as redes sociais. Diariamente, calúnias e difamações são divulgadas, incitando pessoas ao ódio injustificável. Surge, então, a pergunta: por que as pessoas são tão suscetíveis a este tipo de apelo? Se ao menos buscassem checar as fontes, quanto erro não seria evitado?
Estou convencido de que haja mais sangue nas mãos de quem digitou mentiras a respeito daquela mulher, do que nas mãos dos que a executaram. E os que ajudaram a divulgar a mentira são igualmente culpados pela morte de uma inocente.
Mesmo que não resulte numa tragédia como esta, o fato é que, campanhas promotoras de ódio destroem vidas, reputações, lares e até... ministérios. 
Uma das razões pelas quais decidi não militar mais no campo apologético foi perceber a imaturidade de alguns que não sabem debater no campo das ideias, sem levantar dúvidas quanto à idoneidade de seus opositores. Por muitos anos, tenho participado de debates na TV e em rádios populares, muitos dos quais calorosos. Assisti in loco a situações inusitadas, em que debatedores demonstraram profundo desrespeito aos colegas de mesa. Eu mesmo fui vítima diversas vezes. Um deles chegou a dizer que era o diabo quem me inspirava. Depois do debate, teve a cara de pau de me convidar para pregar em sua igreja. Sempre mantive meu tom de voz, demonstrando respeito a quem quer que seja, ainda que discordando de suas opiniões. Jamais poderia me esquecer de que são chefes de família, homens respeitados em seus grupos. Posso ser incisivo em meus pontos de vista, como aliás, sempre sou. Porém, isso não me dá o direito de atacar meus oponentes. Afinal, nossa luta não é contra carne, nem o sangue...
Ataques à honra de alguém revela muito acerca de quem os protagoniza. Infelizmente, estes sempre têm uma plateia ávida por sangue, desejosa de ver o circo pegar fogo. Talvez se esqueçam da admoestação bíblica:
"Estas seis coisas o Senhor odeia, e a sétima a sua alma abomina: Olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, o coração que maquina pensamentos perversos, pés que se apressam a correr para o mal, a testemunha falsa que profere mentiras, e o que semeia contendas entre irmãos." Provérbios 6:16-19
Estou certo de que ataques pessoais alavancam a audiência, mas desagradam profundamente o coração de Deus. Portanto, não valem a pena. É preferível uma audiência mediana onde ideias sejam expostas sem incitar ninguém ao ódio. 


Não me vejo em condição de julgar as motivações e intenções de outros. Prefiro colocar-me na berlinda, examinando-me todo o tempo e sujeitando-me ao crivo da minha consciência. Quanto aos demais, cada qual dará contas de si mesmo a Deus. 
Antes de atacar a alguém, pense em como seus pais e filhos se sentiriam vendo sua honra lançada na lama por gente invejosa e inescrupulosa. 
Parafraseando Paulo, não destrua, seja por que razão for, o que custou tão caro para ser construído (Rm.14:15). Quem dera se o sangue de Jesus houvesse sido o último sangue inocente derramado! Podemos até escapar da justiça dos homens, mas jamais escaparemos da justiça divina. 


P.S.: O Estadão informou que Fabiane voltava da igreja para sua casa, segurando uma Bíblia contendo algumas fotos de seus filhos, no momento em que foi amarrada, espancada e linchada até a morte. 

Toda história tem dois lados

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Por Hermes C. Fernandes

“Forrest Gump – O contador de histórias” foi um filme estrelado por Tom Hanks que se tornou num fenômeno de bilheteria no ano de 1994. O filme começa com uma pena caindo aos pés de Forrest Gump, sentado numa parada de ônibus. Ao pegá-la e colocá-la dentro de um livro, Forrest começa a contar a história de sua vida a uma mulher sentada ao seu lado. Os ouvintes na parada de ônibus variam.

Quem não gosta de ouvir uma boa história? Uma de suas interlocutoras perde seu ônibus só para continuar a ouvi-lo. E o que mais atrai em suas histórias é o fato de se confundirem com a história recente de seu próprio país. Acontecimentos emblemáticos como a guerra no Vietnã são alguns dos quais Forrest teve participação. Sem contar figuras importantes que cruzaram o seu caminho, dentre as quais John Lennon e os presidentes John Kennedy e Richard Nixon. Porém, em suas histórias, tais personagens entram como coadjuvantes, e, às vezes, meros figurantes. Forrest Gump é o protagonista.

Cada ser humano é protagonista em sua própria história, que por sua vez, contribuiu na composição do grande mosaico que é a História da Humanidade. Mas, ao mesmo tempo, somos coadjuvantes na história daqueles que integram nosso círculo de amigos e familiares. Às vezes, heróis. Outras, vilão. E de quebra, somos figurantes na história de todos que cruzam nosso caminho a cada dia. Como tais, entramos mudos, e saímos calados, limitando-nos a servir de componentes no cenário de outras tantas histórias.

Deus é, por assim dizer, o Senhor das circunstâncias, o Arquiteto das contingências, Aquele que promove encontros e desencontros, que liga os pontos de cada história particular, enriquecendo assim a trama universal. Através de cada história, Deus revela facetas do Seu plano redentor.

Israel sabia de sua vocação para ser luz para as nações. Desde o início, Abraão, o patriarca, foi avisado que sua história se entrelaçaria com a história de todos os povos. Ele e sua descendência seriam bênção para todas as famílias da terra. Ser escolhido não significa ser preferido. Deus escolhe alguns para o bem de todos. Onde há preferidos, também há preteridos. Se fosse questão de predileção, logo, uns sairiam ganhando, outros, perdendo.

Porém, aos poucos, Israel perdeu de vista sua missão. Começou a achar-se o povo predileto de Deus, ou melhor, os únicos com os quais Deus tratava. Passou a referir-se aos demais como “eles”, os gentios, os pagãos. A expressão “propriedade exclusiva” deixou de significar que pertenciam exclusivamente ao Senhor para significar que eram os únicos a gozarem deste status.

Até que Deus levantou profetas para adverti-los e conclamá-los ao arrependimento. Um deles foi Amós, o profeta cowboy, o John Wayne dos profetas menores. Talvez por não ter pedigree profético, Amós se viu com liberdade para dizer o que precisava ser dito, sem temer por sua reputação. Dentre as coisas que disse, talvez a mais corajosa tenha sido esta:

“Não me sois, vós, ó filhos de Israel, como os filhos dos etíopes? diz o SENHOR: Não fiz eu subir a Israel da terra do Egito, e aos filisteus de Caftor, e aos sírios de Quir?” Amós 9:7

Deve ter sido desconcertante descobrir que não era tão importante quanto se imaginava, e ainda ser comparado à gente de um país distante na África. Deus e sua mania de pôr nosso preconceito à prova...

Então, o Êxodo de Israel não foi o único? Tanto os filisteus quanto os sírios (ambos desafetos de Israel) tiveram seu próprio êxodo? Os mesmos poderosos braços que arrancaram Israel do Egito também arrancaram os filisteus de Caftor e os sírios de Quir?

Logo, a conclusão a que chegamos é que a história de Israel não é o único fio através do qual Deus está trançando a teia da trama universal.  As histórias das nações se cruzam, e o mesmo se pode dizer da história de cada ser humano.

Isaías, contemporâneo de Amós, reforçou a ideia:

 “Naquele dia haverá estrada do Egito até a Assíria. Os assírios virão ao Egito, e os egípcios irão à Assíria. Os egípcios adorarão com os assírios ao Senhor. Naquele dia Israel será o terceiro com os egípcios e os assírios, uma bênção no meio da terra. O Senhor dos Exércitos os abençoará, dizendo: Bendito seja o Egito, meu povo, a Assíria, obra das minhas mãos, e Israel, minha herança.” Isaías 19:23-25

Por mais de quatrocentos anos, o povo de Israel amargou a escravidão no Egito. E agora vivia sob a ameaça assíria. Seria maravilhoso ouvir do juízo iminente que cairia sobre tais nações que exploravam e oprimiam o “povo escolhido do Senhor”. Mas agora, Isaías, usado pelo Espírito de Deus, leva-os a compreender as coisas de uma inusitada perspectiva. Deus estava prestes a inaugurar uma estrada entre o passado  (Egito) e o presente (Assíria).  Uma estrada de mão-dupla. Os egípcios iriam à Assíria, e os assírios viriam ao Egito. Haveria intercâmbio entre os povos e ambos adorariam ao Senhor, o Deus de Israel. Sim, Ele é o Deus de Israel, mas também é o Deus de todos os povos.  Chegaria o dia em que Israel, que se acostumara a enxergar-se como o filho predileto de Deus, seria o terceiro, vindo logo após os egípcios e assírios. Quem diria... Israel em terceiro.

Geograficamente, Israel ficava no meio do caminho entre o Egito e a Assíria. Talvez até pudesse se aproveitar deste intercâmbio entre as duas potências criando um pedágio. Mas em vez de lucrar com isso, Deus diz que eles estavam estrategicamente localizados para serem bênção para ambos os povos.

Todos querem se locupletar de alguma maneira. Ninguém está interessado em ser bênção. O importante é se dar bem, ser cabeça em vez de cauda, ser primeiro, jamais segundo ou terceiro. Mas a lógica do reino subverte isso. Quem quiser ser o maior, tem que ser o menor, aquele que serve.

Como se não bastasse, o Senhor se refere ao Egito como “meu povo”e a Assíria como “obra das minhas mãos”, porém, não tiraria de Israel o título de “minha herança”.

Não deve ter sido fácil ouvir Deus referindo-se ao Egito nesses termos.  Não, depois de ter amargado quatro séculos de escravidão naquele país. Talvez Israel nem se incomodasse tanto se Deus chamasse “meu povo” alguma nação amiga.

Dizer que Deus é fiel não significa afirmar que Seus planos se limitem a nós e àqueles com os quais mantemos laços amistosos. Pode ser que Ele inclua muitos dos nossos desafetos em Seus planos. Quem poderia argui-lo por isso?  Só questiona a Sua justiça quem, de fato, não compreendeu nada de Sua graça. Se Ele agisse de acordo com os critérios da justiça, ninguém escaparia, nem mesmo nós. Seríamos todos igualmente condenados. Porém, Ele decidiu que agiria tomando por base a Sua graça. Assim como não há méritos nossos envolvendo o que te bom nos aconteça, não há deméritos por trás do que de ruim nos aconteça. Tudo é graça! Ele faz nascer o sol sobre justos e injustos, mas também faz chover sobre ambos.

Deus é fiel... não a mim, ou a quem quer que seja, mas ao Seu propósito. E este, por sua vez, inclui, de uma maneira ou de outra, a cada ser humano que já viveu, vive ou viverá na face da Terra.

Quantas vezes dizemos que perdoamos aos nossos desafetos e até pedimos que Deus os abençoe. Porém, quando os vemos prosperar, questionamos a justiça de Deus. Afinal, se nossa oração foi sincera, deveríamos agradecer a Deus por termos sido atendidos.

Chamar a Assíria (império sediado na Babilônia) de “obra das minhas mãos” parecia um insulto. Aquilo só podia ser obra do diabo! Mas Deus não vê assim. Devemos redobrar nossos cuidados antes de creditar algo a Deus ou ao diabo.

Se Ele é o Senhor das circunstâncias, o arquiteto das contingências, logo, sabe exatamente como conduzir a História a fim de que Seus propósitos sejam alcançados. Como dizia Lutero: Deixe Deus ser Deus! Ele não nos deve explicação alguma. 

Cristianismo x Islamismo: o inevitável Choque de Civilizações

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"Nenhum de vocês crê verdadeiramente até que deseje aos outros o que deseja para si mesmo."Maomé, fundador do Islamismo

Por Hermes C. Fernandes

O mundo ocidental tem assistido horrorizado às barbáries perpetradas pelo mais cruel grupo terrorista dos últimos tempos: o Estado Islâmico. Diferentemente de outras redes terroristas como a Al-Qaeda, o EI tem empregado recursos dramáticos na execução de prisioneiros, filmando e difundindo pelas redes sociais imagens de decapitações em massa, afogamentos e incinerações de prisioneiros confinados em gaiolas, homossexuais empurrados do alto de edifícios, além de destruição de sítios arqueológicos importantes. Tudo isso, somado ao radicalismo religioso de alguns grupos do Islã têm despertado ojeriza por parte das sociedades ocidentais.

Lembro-me de que pouco depois dos atentados às Torres Gêmeas, fui visitar minha irmã Odília que morava em Newark, cidade vizinha à Nova Iorque. Na manhã do ataque terrorista, ela tinha uma entrevista de emprego lá, mas graças à providência divina, perdeu a hora. Ao acordar, assistiu da janela do seu quarto à queda do World Trade Center. Foram dias de muita apreensão por parte da minha família que não conseguia contatá-la. Tão logo tive oportunidade, aproveitei minha ida à Flórida na companhia de um amigo para esticar até Nova Iorque. Na fila para embarcar, enquanto éramos minuciosamente revistados, mesmo depois de termos passado por detectores de metais, notamos que um homem que usava um turbante árabe passou direto. Todos na fila demonstraram preocupação com a cena seguindo-o indiscretamente com os olhos. Naqueles dias, qualquer um que embarcasse num voo comercial usando turbante era considerado um forte candidato a terrorista. Ao chegar na porta da aeronave, aquele homem abriu o paletó e exibiu à tripulação sua insígnia. Era um agente do FBI. Todos suspiraram aliviadamente. Mesmo assim, a tensão persistia. Durante todo o voo, duas comissárias de bordo se alternavam ao microfone, brindando-nos com um verdadeiro stand up comedy no afã de aliviar as tensões. Quando avistamos os arranha-céus da Big Apple pela janela, a tensão aumentou consideravelmente. Ninguém mais conseguia prestar a atenção nas comissárias. Bastou que as rodas do avião tocassem no solo para que os passageiros irrompessem num barulhento e demorado aplauso. Ufa! Havíamos sobrevivido.

Sinceramente, não queria estar na pele de um muçulmano que morasse ou pretendesse visitar os Estados Unidos naqueles dias.

Da última vez que morei com a minha família nos Estados Unidos, entre os anos de 2009 e 2011, meus filhos estudaram numa High School próxima de nossa casa em Lake Mary, na Flórida. Minha filha caçula, Revelyn, contou-me de sua preocupação com um colega Iraniano que era hostilizado pelos colegas. Como se não bastasse sua religião e nacionalidade, ele não sabia falar uma única palavra em inglês. Revelyn perguntou-me se haveria algum problema se ela se propusesse a ajudá-lo. Senti-me orgulhoso por sua iniciativa. Durante aquele período escolar, minha filha foi sua amiga e incentivadora.

Ser muçulmano não significa ser terrorista. Na verdade, ninguém deveria ser julgado por sua opção religiosa, nacionalidade ou etnia.

Enquanto minha filha fez amizade com um muçulmano, meu filho Rhuan fez amizade com uma jovem egípcia (bonita, por sinal), uma cristã copta, de uma família extremamente austera. Lembro-me do constrangimento que ele passou com o pai da menina ao visitá-la. Ele chegou em casa ofegante e visivelmente assustado, dizendo que nunca mais queria passar por aquilo novamente. O pai achou que ele queria pedi-la em namoro e praticamente o escorraçou da casa.

Quando estávamos para voltar para o Brasil, fizemos um Moving Sale, expondo nossos móveis e utensílios domésticos em nossa garagem com o objetivo de vendê-los por preços módicos. Nossa vizinhança era bem diversificada. Tínhamos vizinhos de várias partes do mundo, e muitos deles vieram checar nosso material. Chineses, judeus, mexicanos, porto-riquenhos, guatemaltecos e... egípcios. Isso mesmo. Aquela querida família encostou sua van em frente à nossa garagem e veio nos visitar. Não vieram para se despedir, nem para se desculpar pelo episódio em que meu filho foi escorraçado de sua casa, mas para aproveitar as pechinchas. Pechinchar é uma prática comum neste tipo de venda de garagem. Mas eles extrapolaram. O pai tinha um bloquinho nas mãos, onde anotava tudo, perguntando o preço de cada item. No fim, ele somou os valores e fez uma oferta bem inferior ao total. Tentei argumentar com ele, mas não deu. Acabei vencido pela sua insistência. Ele arrematou boa parte de nossas bugigangas. Até aí, tudo bem. Pelo menos nos livramos de tudo aquilo. O único problema é que eles ficaram de voltar mais tarde para pagar. Já faz quatro anos que retornamos ao Brasil e até agora, nada. Apesar do calote, eram cristãos coptas, da mesma tradição religiosa daqueles cristãos que foram decapitados pelo EI por não negarem sua fé em Jesus.

Jamais julgaria todos os cristãos coptas do mundo por causa da atitude daquela família. Assim como não julgo todas as igrejas brasileiras tomando por base algumas que usam os veículos de comunicação de maneira agressiva e antiética.

Posso assegurar que a maioria dos seguidores de Maomé não aprova o que tem sido feito em nome de sua fé por grupos fundamentalistas radicais. São homens e mulheres de bem, zelosos de suas tradições e valores, que trabalham com afinco para garantir a subsistência de suas famílias.

Assim como há maus cristãos, também há maus muçulmanos. Que direito temos de medir uns pelos outros?

Nem todo muçulmano é terrorista, como nem todo pastor é um explorador da fé, e nem todo padre é pedófilo. Cada um deve ser avaliado de per si. Pelos frutos conhecereis a árvore, alertou-nos Jesus.

E quanto ao EI? Como deveríamos nos posicionar quanto a esta milícia terrorista? Deveríamos pagar com a mesma moeda?

O EI é para o Islã o que as Cruzadas foram para o Cristianismo. Foram necessários séculos para que alcançássemos um grau de civilidade que nos permitisse perceber o quão distante estávamos daquilo que Jesus nos ensinara. E o que dizer da Santa Inquisição? Quantos foram condenados por tribunais eclesiásticos, sendo torturados com requinte de crueldade e queimados vivos por serem considerados hereges! Por que digo isso? Para relembrar que temos telhado de vidro.

O Islamismo é uma religião bem mais nova que o Cristianismo. Eu diria que é a caçula dentre as grandes religiões monoteístas. É inevitável que haja grupos sectários que não entenderam bem a proposta de sua religião. Quando digo “não entenderam bem”, estou afirmando que há muitas maneiras de se entender. Se nem a Bíblia está imune a interpretações equivocadas, que dirá o Alcorão. O problema não é o livro ou a religião em si, mas o estado do coração humano, carregado de ódio e preconceito.

Para que o ciclo do ódio seja quebrado, faz-se necessário apelarmos ao perdão, não à vingança.

Recentemente, foi criada a primeira brigada cristã iraquiana com a tarefa de retomar as cidades e localidades cristãs das mãos dos jihadistas do EI.

Os novos soldados marcharam e saltaram sobre pneus em chamas diante de uma fileira de autoridades curdas e assírias em Fishkabur, no nordeste do Iraque, lembrando cenas de produções cinematográficas americanas.

Após a invasão americana de 2003, muitos cristãos iraquianos deixaram o país, enquanto outros preferiram manter a discrição em um momento em que o país mergulhava na violência. Porém, alguns destes remanescentes decidiram tomar as armas nos últimos meses, formando várias milícias cristãs.

Não demoraria muito para que, imbuídos de um sentimento revanchista, as milícias cristãs se espelhassem em seus próprios inimigos. No dia 28 de maio de 2015, um soldado cristão membro das forças curdas decapitou um militante do EI na Síria. A decapitação do jihadista teria sido um ato de vingança pela morte de centenas de cristãos pelas mãos do EI, incluindo homens, mulheres e crianças. O soldado cristão escolheu matá-lo usando o mesmo método brutal de execução que se tornou uma marca do grupo terrorista, adicionando-se a isso o fato de ter sido obrigado a cavar a própria cova antes de ser executado.

O Observatório Sírio dos Direitos Humanos, uma ONG exilada, sediada no Reino Unido, destacou que há muita discussão se “as ações do soldado cristão sírio não-identificado foram corretas ou morais sob a ótica do cristianismo”. Ainda segundo o artigo publicado pela ONG, se  “o motivo da decapitação foi uma vingança, o assassinato poderia ser interpretado como um crime de guerra”.[1]

Quem diria...uma ONG tendo que aguçar nossa consciência, lembrando-nos que condutas como esta destoam completamente do que foi ensinado por Jesus.

Em abril de 2012, o polêmico pastor norte-americano Terry Jones queimou exemplares do Alcorão, além de uma representação do profeta Maomé para protestar contra a prisão do pastor Youcef Nadarkhani no Irã. O Pentágono veio a público pedir que o pastor reconsiderasse os atos, alegando que seu inconsequente protesto poderia prejudicar soldados americanos no Afeganistão. Em 2010, ele já havia ameaçado fazer o mesmo, mas foi dissuadido pelas autoridades. Como previsto, o insano protesto provocou uma onda de violência no Afeganistão e no Oriente Médio.

Em 11 de setembro de 2013, Terry Jones foi detido na Flórida antes de queimar 2.998 exemplares do Alcorão como protesto pela passagem do décimo segundo ano de aniversário dos atentados que derrubaram as Torres Gêmeas, matando número equivalente de pessoas.

Por favor, alguém avise a este pastor que se sua intenção é a de chamar a atenção para si, ele conseguiu. Mas como efeito colateral, ele só fez aumentar a animosidade entre o mundo islâmico e o "grande Satã" (maneira como alguns islâmicos radicais se referem aos EUA).

Definitivamente, não precisamos de novas cruzadas. Aliás, jamais precisamos delas. Em vez disso, carecemos de homens e mulheres dispostos a levar a sério os ensinamentos de Jesus, permitindo que seu amor extrapole as fronteiras religiosas.

Jamais nos esqueçamos de que, na qualidade de seguidores de Cristo, “as armas de nossas milícias não são carnais, mas poderosas em Deus para destruição de fortalezas” (2 Co. 10:4). Portanto, em vez de balas, bombas, espadas, nosso arsenal é composto de amor, perdão, acolhimento e oração. As fortalezas contra as quais marchamos são as do preconceito, do ódio, do desamor e de tudo aquilo que atenta contra a dignidade humana.

Em meio a tanto ódio, sempre nos surpreendemos com lampejos de amor.

No primeiro dia de fevereiro de 2011, o mundo foi impactado por uma foto postada no twitter em que cristãos coptas do Egito faziam um cordão de isolamento para proteger os muçulmanos em sua hora de oração em plena Praça Tahrir no coração da cidade do Cairo. Milhares de egípcios saíram às ruas para protestar contra o governo, sendo duramente recebidos por forças policiais. Chegada a hora em que os muçulmanos tradicionalmente se ajoelham em direção a Meca para orar, os cristãos presentes ao protesto formaram uma corrente humana para protegê-los dos cassetetes da polícia.

São exemplos como este que nos fazem voltar a ter esperança no convívio pacífico entre os homens.

Estes cristãos coptas decidiram viver o mandamento de Jesus às últimas consequências. Cada golpe que levavam nas costas para proteger os membros de uma religião considerada rival fazia-os lembrar das palavras de Jesus: “Amai-vos uns aos outros...”

Pouco mais de dois anos depois, em agosto de 2013, muçulmanos se uniram aos cristãos para protegerem suas igrejas de serem destruídas. Naqueles turbulentos dias, dezenas de igrejas e escolas, além de casas e lojas pertencentes a cristãos foram atacados no Egito por um grupo chamado Irmandade Muçulmana. Em um dos ataques, membros deste grupo jogaram coquetéis molotovs num centro comunitário cristão que ajuda crianças de rua, sejam elas cristãs ou muçulmanas. Apesar de ninguém ter ficado ferido, este ataque causou consternação entre muçulmanos e cristãos. Depois deste ataque, uma multidão formada por pessoas de ambas as religiões dirigiu-se a uma igreja para impedir que fosse depredada. Esta atitude desencadeou uma onda do bem em que cristãos e muçulmanos se uniram para apagar incêndios em igrejas ou conter ataques em outras cidades. Vigílias eram feitas ao redor de templos cristãos para impedir que fossem depredados.

Não precisamos concordar em tudo para que somemos esforços pelo bem comum. Mas, por mais constrangimento que possa causar em alguns, o fato é que muçulmanos e cristãos têm mais em comum do que a maioria esteja disposta a admitir.

O Deus a quem veneram é identificado como o mesmo que revelou-se a Abraão. "Allah" é simplesmente a palavra árabe para "Deus" (que também não é nome próprio). Basta pegar uma Bíblia ou Torá escritas em árabe, para constatar isso. É interessante reparar que o som da palavra hebraica "El" (de onde provém "El Shaday" e outros nomes compostos usados pelos hebreus em referência a Deus), assemelha-se mais ao som da palavra "Allah" do que o vocábulo português "Deus", que por sua vez se origina do vocábulo grego "Théos" usado fartamente nas epístolas paulinas. Isso se deve ao fato de que tanto o árabe, quanto o hebraico e o aramaico serem línguas semitas. Os hebreus comumente se referiam a Deus como "Eloha" ou em sua forma majestática "Elohim". Alguns acreditam que a palavra "Allah" seria uma corruptela de "Eloha."[2]

Apesar de judaísmo, cristianismo e islamismo terem conceitos diferentes acerca de Deus, eles O identificam como o Criador dos céus e da terra, sendo considerados "Fés Abraâmicas". Tanto judeus quanto muçulmanos, por exemplo, rejeitam as crenças cristãs da Trindade e da Encarnação Divina.  

Mesmo que não reconheçam a divindade de Jesus, prezam-no como o Messias[3] e um grande profeta. Seu respeito por Ele é tamanho, que cada vez que pronunciam o Seu nome, repetem a frase “Que a bênção e a paz de Deus estejam sobre ele”. Entre muitas coisas, eles creem em Seu nascimento virginal, nos milagres descritos nos evangelhos, em Sua ascensão ao céu e em Seu retorno no último dia. Eles também creem que não serão os únicos a serem salvos, “mas também os seguidores de outras religiões divinas e monoteístas quando praticam e seguem as suas doutrinas autênticas e puras as quais foram reveladas aos profetas Moisés e Jesus filho de Maria.”[4]e Obviamente que temos inúmeras diferenças que não podem ser desprezadas. Todavia, isso não nos impede de amá-los e respeitá-los em sua própria fé.

Uma das coisas que mais aborrecem a comunidade islâmica é o desrespeito à figura de Maomé, seu profeta. É difícil para um muçulmano compreender a razão pela qual Maomé tem sido execrado pelos cristãos, enquanto eles fazem questão de honrar a figura de Jesus.

Alguns mais radicais demonstram ser capazes de qualquer coisa para vindicar a honra de seu profeta. Não admitem brincadeiras, piadinhas, caricaturas envolvendo aqueles que consideram o mais importante porta-voz de Deus para a humanidade.

Mesmo sendo irrestritamente a favor da liberdade de expressão, penso que deveríamos, ao menos, respeitar a sua devoção e evitar profanar o que lhes é tão caro. Não é porque estamos acostumados a ouvir piadinhas envolvendo a nossa fé que vamos nos achar no direito de fazer o mesmo com a fé alheia.

O que o mundo espera de nós é que sejamos coerente com aquilo que Jesus nos legou. “Nisso conhecerão que sois meus discípulos”, afirmou, “se vos amardes uns aos outros.”

Somente um choque de amor poderá evitar um choque de civilizações.[5]

Enquanto muitos cristãos preferem manter distância do mundo islâmico, temendo por sua vida, ou por puro preconceito, um número crescente de muçulmanos tem se convertido a Cristo através de sonhos. De acordo com Karel Sanders, missionário cristão na África do Sul, 42% dos recém convertidos entre africanos muçulmanos vieram a Cristo através de sonhos e visões. O fenômeno também tem ocorrido entre outras comunidades muçulmanas, como os Tausugs nas Filipinas, onde muitos fiéis relataram ter visto Jesus em seus sonhos após o Ramadã (mês em que os muçulmanos praticam um ritual de jejum). Há relatos no Iraque, na Turquia, no Turcomenistão e Quirguistão.

O mesmo Jesus que apareceu a Saulo de Tarso no caminho de Damasco, segue se manifestando pelo mundo afora, sem respeitar nossas convenções e conveniências.

Talvez isso seja um recado claro à igreja, de que o mundo islâmico tem grande importância para Cristo. Mas para apresentar-lhes o evangelho, temos antes que aprender a amá-los, compreender suas tradições, despojando-nos de nossos preconceitos e receios.



[1] http://www.ebc.com.br/observatorio-sirio-dos-direitos-humanos
[2]A palavra Alá está na origem de algumas palavras do português  como "oxalá" (w[a] shā-llāh, "queira Deus"), "olá", "olé" (w[a]-llāh, "por Deus") e "hala" (yā-llāh, "oh, Deus").
[3]Alcorão: 5:75
[4]Confira no site: http://www.ibeipr.com.br/perguntas_ver.php?id_pergunta=22
[5] Choque de civilizações é uma teoria proposta pelo cientista político Samuel P. Huntington segundo a qual as identidades culturais e religiosas dos povos serão a principal fonte de conflito no mundo pós-Guerra Fria

Você tem certeza que ama ou é amado?

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Por Hermes C. Fernandes

“O amor... não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade.” 1 Coríntios 13:5-6

Entre toda de descrição que Paulo dá acerca do amor, esta pequena porção capta minha atenção de maneira especial. Aqui são apresentadas seis características que, a meu ver, autenticam o amor.

Primeiro, o amor não se porta de maneira indecente, apelativa, inconveniente. Seu propósito jamais foi ferir os escrúpulos de quem quer que seja. Respeita-se a subjetividade alheia, seus valores morais, suas preferências. Desprovido desta característica, o amor se tornaria um insulto. Não se pode confundir a intimidade promovida pelo amor com invasão de privacidade. A comunhão entre seres não atenta contra a dignidade e individualidade, antes, as preserva.

Nossos interesses devem estar abaixo do interesse de quem se ama. Temos o direito de expor nossos desejos, sem, contudo, impô-los, antes, fazendo-os passar pelo crivo do outro. O outro sempre terá a última palavra. Caso esta não expresse a nossa própria vontade, isto não será motivo de irritação. Afinal, a felicidade do amado sempre tem primazia sobre a satisfação do amante.

Na maioria das vezes, a irritação ocorre quando nutrimos expectativas sobre-humanas de alguém, impossíveis de serem correspondidas. Quem ama se nega a irritar-se por reconhecer suas próprias limitações no outro, ainda que reveladas em áreas distintas.

O desprovido de amor sempre suspeita mal do seu semelhante. Se este demonstrar bom caráter, suspeita-se de sua integridade: “Ele não é tão bom quanto parece! Deve estar escondendo algo”. Se for criativo e inteligente, suspeita-se de sua autenticidade: “Duvido que a ideia tenha sido dele. provavelmente copiou de alguém”. Se for próspero, suspeita-se de sua honestidade: “Deve ter roubado ou trapaceado”. Se for generoso, suspeita-se de sua motivação: “Deve querer algo em troca”. Porém, o verdadeiro amor jamais suspeita mal, nem perde seu tempo procurando chifres em cavalos. Em vez disso, ele aposta na integridade, autenticidade, honestidade e na boa motivação do outro, sem buscar qualquer razão para duvidar.

É insuportável conviver com quem suspeita de tudo e de todos. Quando não acusa diretamente, faz insinuações infundadas, atentando contra a credibilidade do outro. Quem ama, buscará preservar a reputação do seu semelhante.

Semelhantemente, quem ama jamais torce contra o outro, nem comemora a sua derrota, sentindo-se vindicado e deixando escapar um “bem feito!”. E, se porventura, o outro alcançar algum êxito, quem ama não o invejará, tampouco se sentirá traído por Deus ao permitir isso. Caso tenha sido ofendido e perdoou, seu perdão será validado pela alegria que sentirá assistindo à vitória de quem o ofendeu. 

A resposta cristã à causa dos imigrantes e refugiados

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“Considero-me estrangeiro em qualquer país, alheio a qualquer raça.
Pois a terra é minha pátria e a humanidade toda é meu povo.”
Khalil Gibran



A imagem do corpo de uma criança de no máximo dois anos de idade, estirada na areia de uma praia em Bodrum na Turquia, chocou o mundo inteiro, e tornou-se símbolo do drama vivido por refugiados que tentam chegar a qualquer custo à Europa. O menino que vestia bermuda azul, camiseta vermelha e sapatos pretos encharcados, era provavelmente um dos cerca de doze refugiados sírios que morreram afogados após o naufrágio de seus botes próximo à península de Bodrum, balneário turístico pontilhado de resorts de luxo. Os refugiados provavelmente tentavam chegar à ilha de Kos na Grécia. Além dele, havia  ao menos uma mulher e outras cinco crianças que tiveram o mesmo fim. No mesmo dia, cerca de dois mil e quinhentos refugiados a bordo de sessenta botes e barcos precários lograram seu objetivo.

A Europa vive hoje uma das maiores ondas migratórias da história recente. Milhares de pessoas saem do norte da África, expondo suas vidas numa perigosa travessia do Mar Mediterrâneo em direção ao velho continente. Em apenas uma semana, ao menos quatro embarcações lotadas de imigrantes ilegais afundaram. Desde 1º de janeiro de 2015, a Organização Internacional de Migração (OIM) estima que cerca de duas mil pessoas morreram no trajeto. Em 2014 foram três mil e duzentos mortos. Nos últimos anos, a Europa recebeu a maioria dos refugiados do mundo, que deixam suas pátrias para escapar de conflitos como a guerra civil na Síria e na Líbia ou pelas dificuldades econômicas. De acordo com o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), cerca de 219 mil pessoas cruzaram o mar em busca de um vida melhor na Europa no ano passado. Na metade deste ano, o número já ultrapassa a casa de 300 mil.

A travessia do Mediterrâneo é empreendida por traficantes de pessoas em botes ou em embarcações superlotadas, sem qualquer requisito de segurança. A viagem chega a custar mais de R$ 10 mil por pessoa. Uma única embarcação pode render até US$ 1 milhão.

A imigração tem sido um tema polêmico na Europa, sobretudo devido ao avanço de partidos de extrema direita com seu discurso nacionalista, defendendo leis anti-imigração e usando a crise econômica como justificativa à xenofobia. Defender os direitos dos imigrantes pobres está cada vez mais difícil em um ambiente de perspectiva econômica sombria, com um número crescente de europeus desempregados, temendo a concorrência com os trabalhadores estrangeiros que costumam oferecer mão-de-obra bem mais barata.

Se a imigração ilegal na Europa se dá pelo mar, nos Estados Unidos acontece geralmente por terra através da extensa faixa fronteiriça com o México. Milhares de pessoas, incluindo crianças, oriundas de países como Guatemala, Honduras, El Salvador e Brasil são guiadas por traficantes de pessoas conhecidos como “coiotes” por regiões inóspitas, arriscando a vida pelo sonho americano. Não bastassem os perigos oferecidos pelo ambiente desértico, os imigrantes se expõem a assaltos e sequestros frequentes. Não é raro as autoridades de fronteira serem acionada para resgatar alguém.

Na contramão do que tem acontecido na Europa, o número de pessoas que tentam atravessar a fronteira dos Estados Unidos com o México diminuiu cerca de 55% entre os anos fiscais 2014 e 2015, de acordo com o Departamento de Segurança Nacional (DHS). Talvez isso se dê devido à crise econômica que o país atravessou desde 2008. Pude perceber uma inversão do fluxo quando ainda morava na Flórida e tinha que vir ao Brasil com certa frequência. Antes, os voos saíam lotados do Brasil para os EUA e voltavam com muitos assentos vagos. De um tempo para cá, observa-se o inverso. Os voos vão para os EUA parcialmente cheios e voltam repletos. Tem mais gente voltando do que indo. Antes, boa parte dos que iram tinha a intenção de ficar por lá. Hoje, vão para gastar suas economias. Não é à toa que o governo americano estuda suspender a necessidade de visto de turismo para brasileiros. Turistas brasileiros ocupam a terceira posição na lista dos que mais gastam nos EUA, ficando atrás apenas dos britânicos e japoneses, de acordo com o Departamento de Comércio Americano. Cálculos indicam que cerca de 1,4 milhão de brasileiros visitaram os EUA em 2014 e que este número deverá dobrar em 2016.

Só quem já teve a experiência de morar fora do país sabe mensurar a dor de imigrantes ilegais, seja pelo risco de ser deportado a qualquer instante, pela exploração sofrida (às vezes por parte dos próprios patrícios) ou por uma das mais cruéis faces do preconceito: a xenofobia. Mesmo um imigrante legal não fica imune a estas injustiças. Ao menor deslize, pode perder seu status migratório, ser preso e posteriormente enviado de volta ao seu país de origem. Milhares de brasileiros espalhados pelo mundo afora sabem do que estou falando.

Uma coisa é visitar um país estrangeiro com o objetivo de gastar. Outra coisa totalmente diferente é imigrar. Pude perceber isso com muita clareza nas duas vezes que morei nos EUA. Como visitante, era recebido com tapete vermelho e honras. Como imigrante, era visto como quem vinha para ocupar o lugar de um nativo. E isso levando em conta o fato de não ter ficado um único dia de maneira ilegal naquele país. Se quem está legal sofre, imagina quem está ilegal.

Não precisa morar fora para lidar com esta questão. Aqui mesmo no Brasil, deparamo-nos com um número crescente de imigrantes oriundos da África, do Caribe e da América Latina. Muitos deles vivem em condições subumanas, sendo submetidos a trabalhos forçados.

As razões que contribuem para o aumento do fluxo migratório entre a África e a Europa são diferentes das que estão por trás da multiplicação de imigrantes que temos visto no Brasil em anos recentes. Em vez de guerras, são as tragédias naturais como a que destruiu o Haiti em 2010. A única coisa em comum é a crise econômica.

Depois do terremoto que matou 230 mil pessoas e deixou 1,5 milhão de desabrigados, cerca de 56 mil haitianos já imigraram para o Brasil segundo o Ministério da Justiça. A maioria entra no país pelo Acre, seguindo de ônibus para os estados do Sul e do Sudeste. Muitos deles têm que se contentar com subempregos. Alguns se queixam que para muitos brasileiros, os haitianos são vistos como escravos.

Na madrugada do dia 2 de agosto de 2015, seis haitianos sofreram um ataque na região central de São Paulo. O agressor que estava em um carro desferiu tiros de chumbinho contra os imigrantes. Três deles ficaram com projéteis alojados no corpo e tiveram que ser operados no Hospital Municipal do Tatuapé, na zona leste, para remoção da munição.

A suspeita é de que os crimes teriam sido motivados por xenofobia. Este tipo de discriminação tem sido fomentado pelo crescente discurso conservador com características nacionalistas que nos remete aos tempos áureos do nazismo na Alemanha. Foi em nome de um nacionalismo doentio que Hitler teria promovido o mais monstruoso programa de eugenia da história, o genocídio conhecido como Holocausto em que milhões de judeus, negros, ciganos e outras minorias foram dizimados.
O problema da imigração numa perspectiva bíblica

Gostaria de propor um exame da questão da imigração sob duas perspectivas, uma bíblica e outra política.

Durante o tempo em que morei com minha família nos Estados Unidos, encontrei muitos brasileiros cristãos naturalizados americanos, ou já em posse de seu Green Card, que apoiavam a iniciativa do governo de perseguir os ilegais. Segundo eles, os imigrantes indocumentados estariam cometendo um tipo de pecado, por desobedecerem às leis do Estado. Ora, apesar de este tipo de postura estar embasado no texto bíblico, carece de um exame mais profundo da questão. Há vários precedentes bíblicos de pessoas retas que em algum momento de suas vidas foram imigrantes. A principal delas é o próprio Jesus, que fugindo da perseguição de Herodes, foi levado pelos seus pais para o Egito, onde viveu os primeiros anos de sua infância. Um Deus que conhece na pele o que é viver em terra alheia, sendo vítima de todo tipo de preconceito cultural e racial, pode perfeitamente identificar-se com aqueles que vivem a mesma situação. Será que ele viveu legalmente no Egito? Bem, se viveu escondido, como diz a Escritura, logo, viveu na clandestinidade.

E o que dizer de Moisés? Pelo decreto de Faraó, todos os recém-nascidos dentre os hebreus deveriam morrer. Mas as parteiras o desobedeceram deliberadamente. Por algum tempo, Moisés, além de filho de imigrantes, viveu na ilegalidade, até ser descoberto e adotado pela filha do monarca egípcio.

Poderíamos apontar outros precedentes bíblicos, mas em vez disso, que tal buscar a instrução dada por Deus quanto ao trato que deve ser dispensado ao imigrante?
Logo durante a organização civil do povo hebreu, Deus ordena:

“O estrangeiro não afligirás, nem o oprimirás, pois estrangeiros fostes na terra do Egito.”[1]

O Supremo Legislador chama Seu povo à consciência!

- Lembrem-se de que vocês também foram imigrantes. Não tratem o estrangeiro da maneira como vocês foram tratados no Egito!

Além do mandamento claro, Deus ainda adverte:

“Se de alguma maneira os afligirdes, e eles clamarem a mim, eu certamente ouvirei o seu clamor. A minha ira se acenderá.”[2]

Ora, tanto o Brasil, quanto os Estados Unidos são países construídos por imigrantes. Os mesmos americanos que vociferam contra os ilegais são filhos e netos daqueles que deixaram a Europa, a Ásia e a África em busca de oportunidades na América. O próprio presidente Barack Obama é filho de imigrante, o que gerou enormes expectativas por parte da comunidade de imigrantes de que a tão sonhada reforma migratória finalmente saísse. 

Muitos acham que a decadência moral e espiritual da América se deva à proibição de se fazer orações nas escolas, como antigamente, e a remoção de símbolos cristãos dos edifícios públicos. Pode até ser que isso tenha colaborado (tenho minhas dúvidas). Porém, não encontramos advertências bíblicas de que a ira de Deus se acenderia caso as crianças não orassem mais nas escolas, ou tivessem que aprender outra teoria que não fosse o criacionismo. Em vez disso, a advertência de Deus diz respeito ao tratamento dado aos estrangeiros. Pelo jeito, tem muita gente coando mosquito e engolindo camelos.

Outros alegam que leis migratórias mais duras coibiriam o aumento de criminalidade, diretamente ligado à imigração ilegal. Afinal, dizem eles, uma significativa parcela de crimes é praticada por estrangeiros. Ora, este raciocínio, além de preconceituoso, é raso e falacioso. Por que jovens imigrantes se envolvem com o crime? Não será pelo fato de não poderem concluir seus estudos? Ou ainda por não terem acesso ao mercado de trabalho formal? Quiçá estejamos invertendo a ordem, enxergando causas onde há efeitos, e efeitos onde há causas.

Quantos jovens imigrantes são vítimas de bullying nas escolas americana? Pergunte aos meus filhos. Eles te dirão o que testemunharam. Se isso não é afligir o imigrante, o que é, então? Com quem estas crianças aprendem a desprezar colegas de outras etnias ou nacionalidades? Muitos ouvem seus pais acusarem os imigrantes por estarem desempregados, e acabam descarregando suas frustrações nos colegas da escola.

Não basta simplesmente não afligir o imigrante. A orientação bíblica vai além:

“Como o natural entre vós será o estrangeiro que peregrina convosco. Amá-lo-eis como a vós mesmos, pois fostes estrangeiros na terra do Egito. Eu sou o Senhor vosso Deus.”[3]

O imigrante precisa ser aceito, amado, acolhido. E mais: Deve ser tratado como se fosse nativo. Em momento algum Deus ordena que se dê privilégios aos imigrantes, e sim, que seja tratado sem discriminação. Caso contrário, o juízo de Deus vem.

Deve-se amar o estrangeiro pelo simples fato de Deus mesmo amá-lo.[4]

O trato que Deus ordenou que Seu povo dispensasse ao estrangeiro era de tal ordem, que é usado como referência para o trato que devemos dispensar a nossos irmãos, quando estes atravessarem alguma dificuldade econômica:

 “Quando teu irmão empobrecer e as suas forças decaírem, sustentá-lo-ás como a um estrangeiro ou peregrino, para que viva contigo.”[5]

Quem diria... Em vez de o estrangeiro ser tratado como irmão, o irmão que deveria ser tratado como estrangeiro. Porém, hoje, tratar um irmão como se fosse um estrangeiro, seria considerado um total descaso, dado o desprezo com que tratamos àqueles que consideramos diferentes de nós.

Portanto, não se pode tomar o estrangeiro como bode expiatório da crise econômica. É comum justificar a perseguição aos imigrantes alegando que estes estejam tomando as vagas de emprego que poderiam ser ocupadas pelos nativos. Será que o americano, por exemplo, estaria disposto a assumir o tipo de serviço exercido pela mão-de-obra estrangeira? Será que o europeu típico se ‘rebaixaria’ a fazer o que um imigrante africano faz?

Um censo recente apontou que a população latina dos EUA alcançou a casa dos 50 milhões. A divulgação desse dado desencadeou um debate em torno do capital político representado por este enorme contingente. Os latinos podem ter sido a “chave” das eleições de 2012.  Já há mais latinos do que negros no EUA. Se todos os imigrantes latinos fossem legalizados e com isso, obtivessem o direito ao voto, poderiam decidir qualquer eleição. A perseguição aos imigrantes, sobretudo, de origem latina, tem o sórdido objetivo de diminuir sua influência política. Algo semelhante ao que Faraó intentava, ao ordenar a morte dos infantes hebreus.

Do ponto de vista econômico, uma reforma migratória mais dura equivaleria a dar um tiro no pé. Só em 2009, os brasileiros injetaram mais de 4 bilhões de dólares na economia americana. No ano seguinte, teriam sido mais de 10 bilhões. Não são só os pastores brasileiros que atuam naquele país que estão preocupados. O comércio, a indústria hoteleira, e até os parques têm razões de sobra para colocarem as barbas de molho. Imagine, por exemplo, se os brasileiros, que hoje são responsáveis pelo segundo maior número de visitantes de Orlando, resolvessem boicotar a cidade? Não se esqueçam de que a Disney não é exclusividade da Flórida. Também há parques na Europa e na Ásia.

Urge que se levante alguém com o cacife profético de Martin Luther King, para conclamar a população latina a unir-se em busca de seus direitos civis. Brasileiros e hispanos estão no mesmo barco. Somos todos latinos, com nossas convergências culturais, e não podemos desperdiçar a oportunidade histórica de lutarmos pelas próximas gerações. Aquele país ainda será governado por um presidente de origem latina. Quem viver, verá.

Por outro lado, o Brasil também tem recebido uma enxurrada de imigrantes. Semelhante à terra do Tio Sam, nosso país também foi construído por imigrantes oriundos de várias partes do mundo. Por que daríamos boas vindas aos que vêm da Europa, e não acolheríamos com o mesmo calor os que vêm de um país dilacerado como Haiti?





[1]Êxodo 22:21
[2]Êxodo 22:23-24a
[3]Levítico 19:34
[4]Deuteronômio 10:17-19
[5] Levítico 25:35

Pão e circo! A indústria eclesiástica de entretenimento

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Por Hermes C. Fernandes

Vivemos na Era do Entretenimento, e não poucas vezes confundimos a sensação de sermos entretidos com a genuína alegria. Foram os romanos que concluíram que a melhor maneira de manter a ordem social do império era distraindo seus cidadãos com todo tipo de entretenimento. O império gastou fortunas na construção de estádios, teatros, banhos públicos, etc. Tudo para garantir a boa ordem. Surgia, então, o lema pão & circo, tão vastamente adotado por outros modelos de domínio político ao longo da História.

Você sabia que muitas leis importantes, contrárias ao bem comum, são votadas discretamente durante o período de comemorações populares, como os eventos esportivos de grande magnitude? Aproveita-se enquanto o povo está distraído, celebrando, entretido, para engendrar todo tipo de projetos danosos à população.

Portanto, podemos afirmar que o entretenimento serve à manutenção do Status Quo. Porém, o reino de Deus levanta outra bandeira, a da alegria. Contrariando o espírito do império romano, Paulo escreve aos seus cidadãos: “Pois o reino de Deus não é comida nem bebida, mas JUSTIÇA, PAZ e ALEGRIA no Espírito Santo” (Rm.14:17). Era como se Paulo dissesse: O Reino de Deus não é Pão nem Circo! Em vez disso, a proposta do reino de Deus se resume na tríade: Justiça, paz e alegria.

Poderíamos falar muito mais sobre a justiça e a paz. Porém neste ensaio, quero ater-me à alegria, revelando-a como antítese do entretenimento.

Enquanto o entretenimento serve ao Status Quo, fazendo nuvem de fumaça para que ninguém perceba todo tipo de injustiça cometida, a alegria no Espírito é resultado da implementação da justiça, que por sua vez, produz também a paz. Veja o que diz o profeta Isaías: “E o efeito da justiça será paz, e a operação da justiça, repouso e segurança para sempre” (Is.32:17). O sábio Salomão dá o arremate: “A execução da justiça é alegria para o justo” (Pv.21:15). Assim como a Trindade Divina é indissolúvel, esta tríade também o é. Sem justiça não há paz, e sem paz, não há alegria.

As pessoas se entretêm para esquecer os problemas. A alegria do Espírito é a celebração consciente da paz e da justiça.

Esta alegria pode ser celebrada mesmo antes que se veja manifestada a justiça do reino, pois é alimentada pela certeza de que em breve ela se manifestará plenamente. Como cristãos, nossos olhos se voltam para o futuro, nos fazendo vislumbrar uma Era em que a justiça e a paz se beijarão (Sl.85:10). Nossa celebração, portanto, é movida pela fé, pela certeza de que Deus tem as rédeas da História bem seguras em Suas mãos, e que, por fim, a justiça prevalecerá contra a iniqüidade, e o amor sobre o ódio. No dizer de Salomão, “a esperança dos justos é alegria” (Pv.10:28). Portanto, ela é a celebração antecipada que se justifica na certeza da esperança e da fé. Assim como Mirian fez ressoar seus tamborins tão logo os hebreus atravessaram o Mar Vermelho, quarenta anos antes de adentrarem a Terra Prometida, os cristãos celebram a justiça do Reino de Deus, antes mesmo que se manifeste plenamente entre os homens.

Não há nada de mais entreter-se. O que não se deve é eleger o entretenimento como o objetivo de nossa existência. Quem não sonha com uma casa na praia, deitado numa rede estendida na varanda, tomando água de coco? Se acharmos que isso é que é felicidade, estamos conformados aos valores sobre os quais nossa civilização foi edificada. Estamos na contramão do Reino de Deus.

O alvo de nossa existência deve ser atingir o propósito estabelecido por Deus para as nossas vidas. A felicidade tão sonhada deve ser encarada como um bônus, e não como um alvo supremo a ser perseguido. Já foi dito que felicidade não é o destino, mas a jornada. Encontramos a felicidade à medida que percebemos que nossa existência cumpre a um propósito maior e mais abrangente que ela.

Deveríamos nos envergonhar de ter elegido coisas banais como aquilo que nos traz alegria. Posses materiais, formação intelectual, e tantas outras coisas deveriam ser vistos como instrumentos pelos quais podemos servir aos outros, e não como bens supremos.

Nossa relação com Deus não deve ser pautada na expectativa de resultados benéficos para nós mesmos. Nem sempre nossos anseios serão alcançados.

Veja a conclusão a que chega o profeta Habacuque:
“Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide, ainda que o produto da oliveira falhe, e os campos não produzam mantimento, ainda que as ovelhas sejam exterminadas, e nos currais não haja gado, todavia eu me alegrei no Senhor, exultarei no Deus da minha salvação” (Hab. 3:17-18).
Um dos efeitos colaterais da chamada teologia da prosperidade é a profunda frustração experimentada pelos crentes quando suas expectativas não são alcançadas. Para eles, Deus é como um gênio da lâmpada, que existe para atender aos seus pedidos.

Habacuque nos convida a experimentar uma relação com Deus, onde nossa alegria é preservada independente dos resultados. Qualquer um poderia parafrasear esta oração, contextualizando-a à sua realidade. “Ainda que eu fosse demitido do meu emprego... que meu casamento resultasse num divórcio... que meu corpo se fragilizasse a ponto de adoecer... todavia eu me alegrarei no Senhor! Nada mais subversivo que isso! Isso explica como os cristãos primitivos eram capazes de entregar seus corpos ao martírio, sem com isso se deprimirem, ou mesmo, acusarem a Deus de ser injusto.

Deus é a fonte de nossa alegria. Todas as demais coisas são passageiras, e quando muito, meros canais pelos quais Deus manifesta Seus cuidados. Às vezes esses canais ficam obstruídos, porém a fonte jamais deixa de jorrar.

Quando Davi se viu ameaçado de perder tudo, inclusive seu reino, por causa do seu pecado, ele orou:
“Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito reto. Não me lances fora da tua presença, e não retires de mim o teu Espírito Santo. Torna a dar-me a ALEGRIA DA TUA SALVAÇÃO, e sustém-me com um espírito voluntário. Então ensinarei aos transgressores os teus caminhos, e os pecadores a ti se converterão”(Salmos 51:10-13).
Ele não fez questão de preservar seu trono, suas posses, sua posição. Em vez disso, Davi suplicou para que o Espírito de Deus não Se lhe ausentasse. Rogou para que lhe fosse restituída a alegria da salvação.

Hoje em dia, fala-se muito em restituição. As pessoas oram como se cobrassem de Deus: Senhor, eu quero de volta o que é meu! Quanto atrevimento! Sabe o que elas estão declarando com isso? Que seus corações estão nas coisas que possuíam, e que eventualmente vieram a perder.

Já ouviu alguém rogando por este tipo de restituição? Senhor, restitui-me a alegria da tua salvação! Não se trata da salvação em si, uma vez que esta é um dom irrevogável. Ninguém é salvo segunda vez (no sentido soteriológico da palavra). Mas trata-se da alegria desta salvação.

Quando perdemos a alegria da salvação, começamos a buscar compensação. É como uma mesa em que uma das pernas está mais curta que as outras, precisando de um calço. O que tem empurrado muita gente para o pecado é a ausência desta alegria. Então, compensam na pornografia, no caso extraconjugal, na jogatina, etc.

Sabe por que muitas igrejas só enchem quando oferecem algum tipo de entretenimento aos seus membros? Simplesmente porque esses perderam a alegria de Sua salvação. Os pastores são obrigados a recorrer a todo tipo de estratégia, quer campanhas mirabolantes, bailes gospel, e outros. A palavra por si só já não exerce qualquer atração sobre tais cristãos. Bem diferente de Jeremias, que declarou: “Achadas as tuas palavras, logo as comi; elas me foram gozo e alegria no coração, pois pelo teu nome me chamo, ó Senhor, Deus dos Exércitos.”(Jeremias 15:16).

O completo desinteresse dos cristãos pela Palavra revela o quanto perderam da alegria da salvação. Alguns cultos têm uma hora e meia de música e apenas dez minutos dedicados à Palavra. E quando o pastor começa a pregar, as pessoas começam a bocejar de sono, se levantam para ir ao banheiro, conversam entre si. É uma calamidade!

Outros só se alegram com o espetáculo. Tem que haver exorcismo, com demônios sendo subjugados, com manifestações extraordinárias. Sem isso, as pessoas não se dão por satisfeitas. O pastor parece encarnar o personagem principal do filme "O Gladiador". O púlpito se torna a arena, onde os poderes das trevas são desbancados pelo poder da unção na vida do homem de Deus.

Quando os discípulos voltaram de sua primeira empreitada missionárias, contavam com alegria sobre os sinais que haviam protagonizado. Como que jogando um balde de água fria em seu entusiasmo, Jesus disse:
“Mas não vos alegreis porque os espíritos se vos submetem, alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus. Naquela mesma hora ALEGROU-SE Jesus no Espírito Santo, e disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste às criancinhas. Assim é, ó Pai, porque assim te aprouve. Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém sabe quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar. Voltando-se para os discípulos, disse-lhes em particular: Bem-aventurados os olhos que vêem o que vós vedes. Pois vos digo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vedes, e não o viram, e ouvir o que ouvis, e não o ouviram”(Lc. 10:20-24).
É claro que há um elemento espetacular no anúncio das boas novas do Reino. Jesus disse que se os espíritos se Lhe submetiam, era porque era chegado o Reino dos Céus. Até aí, tudo bem. O problema é quando o espetáculo se torna um fim em si mesmo. Ficamos viciados nisso. Torna-se mais um entretenimento. Em vez disso, devemos nos alegrar por ter nossos nomes arrolados no céu. O que significa isso? Alegrar-se na salvação que nos alcançou em Cristo Jesus. Alegrar-nos por havermos sido escolhidos a dedo por Deus, a fim de que por nós Sua justiça e paz alcancem a todos.

Algo me chama a atenção nesse texto de Lucas: “Naquela mesma hora alegrou-se Jesus no Espírito Santo”. Isso te diz alguma coisa? O que provocou em Jesus tamanha alegria? Basta ler a continuação do texto para obtermos a resposta. Jesus agradece ao Pai por haver escondido tais coisas aos sábios e revelado aos pequeninos. E voltando para discípulos, parabenizou-os porque muitos reis e profetas gostariam de ver o que eles viam, e ouvir o que ouviam. A alegria sentida e expressada por Jesus se devia à revelação que o Pai Lhe confiara, e agora havia sido partilhada com os Seus.

Pastores, não se deixem seduzir pelos aplausos! Não façam da pregação uma performance em busca de auto-afirmação.

A mesma alegria que sentimos ao devorarmos a Palavra, alimentando-nos dela, deveríamos sentir quando a compartilhamos com os demais. Quão gratificante é ver o brilho nos olhos, o semblante de satisfação naqueles que a recebem. Não tem dinheiro que pague. Este é o meu salário como pregador. Nossa alegria aumenta cada vez que a partilhamos com os demais.

Sense8: o próximo passo da evolução humana e o surgimento da Koinosfera

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Por Hermes C. Fernandes

Nesta semana, terminei de assistir à primeira temporada de uma das séries mais incrivelmente originais que já assisti desde Lost. Apesar das cenas muito fortes, que certamente feririam os escrúpulos de boa parte dos cristãos, Sense8 tem uma fotografia impecável, com locações belíssimas em oito países diferentes, além de atores excepcionais com sotaques bem acentuados de seus respectivos países. O título da série é um trocadilho com a palavra inglesa sensate, algo próximo de sensitivo, ou seja, alguém dotado de consciência amplificada. Trata-se de uma série norte-americana de ficção científica com boa dose de drama, dirigida, escrita e produzida por Andy e Lana Wachowski e J. Michael Straczynski.

Confesso que relutei em assistir à série completa depois dos dois primeiros capítulos. Mas fui convencido pelo meu filho a assisti-la até o final. Nenhuma série ou produção cinematográfica provocou-me reações tão diversas. Meu moralismo foi posto à prova. Porém, posso afirmar que valeu a pena.

Sense8 conta a história de oito pessoas nascidas na mesma data, porém, oriundas de culturas totalmente diferentes e espalhadas pelo mundo afora. Subitamente, todos têm a mesma visão da morte violenta de uma mulher, e a partir daí, paulatinamente, descobrem estar mental e emocionalmente ligados entre si, sendo capazes de se comunicar, sentir e apoderar-se do conhecimento, linguagem e habilidades uns dos outros. A esse “dom” é dado o nome de Sensate.

Segundo J. Michael Straczynski, co-criador de Sense8, a ideia que deu origem à série parte da premissa de que a evolução envolveria a criação de círculos cada vez maiores de pertencimento e empatia. O que começou lá trás, ligando indivíduos a seus núcleos familiares, estendendo-se posteriormente às suas tribos, cidades e nações, alcançaria o seu apogeu quando conectasse pessoas de culturas diferentes em várias partes do globo, mesmo que jamais tenham se visto antes.

O argumento sobre o qual a trama é desenvolvida me remeteu a duas teorias, a da Noosfera e a do Inconsciente Coletivo. A teoria da Noosfera foi originalmente desenvolvida pelo geoquímico russo Vladimir Vernadsky, e refere-se à esfera do pensamento humano. O termo tem origem no vocábulo grego “nous” que significa mente. De acordo com esta teoria, a noosfera seria a terceira etapa do desenvolvimento da Terra, precedida pela geosfera (matéria inanimada) e pela biosfera (vida biológica). Assim como o surgimento da vida provocou mudanças significativas na geosfera, o surgimento do conhecimento humano também alterou a biosfera.

Este conceito foi ampliado pelo teólogo cristão e paleontólogo francês Teilhard de Chardin, segundo o qual a Noosfera seria o próximo degrau evolutivo do mundo em que emergiria uma espécie de cérebro planetário ou superconsciência, onde todas as mentes estariam interligadas, de maneira análoga aos computadores conectados à internet. Essa mudança caracterizaria a próxima Era Geológica denominada “Psicozoica”. Chardin buscava conciliar a teologia cristã com a evolução de Darwin. Para o padre jesuíta, Deus conduziu todo o processo evolutivo, desde o caos primordial até o despertar da consciência humana sobre a Terra, estágio que deverá ser sucedido por uma Noogênese, que seria a integração de todo o pensamento humano numa única rede inteligente que cobriria todo o planeta. É a esta camada que ele chama de Noosfera. Na vanguarda de todo este processo existiria uma força que agiria a partir de dentro da matéria, orientando a evolução em direção a um ponto de convergência chamado de Ponto Ômega, que ele identifica como sendo o próprio Cristo.

Carl Jung, psiquiatra suíço, conhecido como o pai da psicologia analítica, defendia a existência de um inconsciente coletivo, que seria a camada mais profunda da psique. Para compreendermos o que seria o inconsciente coletivo, temos que entender o que é o inconsciente. De acordo com Sigmund Freud, o inconsciente seria a região da psique onde encontramos o que foi recalcado, escondido, esquecido. Tudo o que foi vivido, porém, esquecido, está lá armazenado. Às vezes, reaparece através dos sonhos, dos chamados atos falhos e até dos sintomas físicos ou psíquicos. Para o pai da psicanálise, o que chamamos de consciência seria apenas a ponta de um iceberg. O inconsciente seria a parte submersa. O inconsciente não seria apenas o porão da psique, mas as bases, os alicerces sobre os quais a consciência é erigida.

Já o Inconsciente Coletivo não representa o que fora vivido pelo indivíduo, mas pela a humanidade como um todo. É o resíduo psíquico da evolução do homem, acumulado em consequência de experiências repetidas por várias gerações. Os arquétipos são os componentes estruturais do Inconsciente Coletivo. Um arquétipo é uma forma de pensamento universal com imagens que podem ser transmitidas hereditariamente como uma espécie de memória genética. Ao perceber que a transmissão de conteúdos psíquicos por hereditariedade não poderia ser comprovada cientificamente, Jung sugeriu que os arquétipos não seriam propriamente imagens, mas tão-somente a predisposição da psique de gerar certas imagens. Os arquétipos, portanto, seriam estruturais psíquicas herdadas que, ao serem preenchidas com as memórias e percepções do próprio indivíduo, desencadeariam a formação de determinadas imagens. Assim, a forma seria universal, porém, o conteúdo seria específico de cada indivíduo.

Há uma conexão profunda entre os pensamentos de Jung e de Chardin. Ambos acreditavam no poder exercido pelo futuro sobre a mente humana. Enquanto para Freud, tudo poderia ser explicado a partir do passado, para Jung, o presente não seria determinado apenas pelo passado (causalidade), mas também pelo futuro (teleologia). Algo bem parecido com a ideia de um Ponto Ômega em Chardin, que nos atrai na direção do porvir. Em ambos, o destino do ser humano é essencialmente guiado pelo alvo. Digamos que o passado tenha sido apenas o arco que arremessou a flecha. Mas o arqueiro não o fez a ermo. Em Jung, a personalidade deve ser compreendida em termos do seu destino, e não de sua origem apenas.

Em seu livro “Estudos sobre Psicologia Analítica”, Jung escreve:

“Se o material psíquico acumulado no inconsciente individual pode ser alçado à consciência, não é demais acreditar que o mesmo se dê com o inconsciente coletivo.”

Ora, não seria de se esperar que se emergisse uma consciência coletiva? Não seria esta a Noosfera defendida por Chardin?

Tanto Jung, quanto Chardin eram cristãos. Jung, de origem protestante, filho de pastor. Chardin, sacerdote jesuíta. Não se pode, portanto, negar a influência do pensamento cristão nestes dois gigantes do século XX. Ambos tentaram compreender o fenômeno da espiritualidade a partir de uma abordagem que se pretendia científica.

Haveria nas Escrituras algum indício de que o Criador pretenda conduzir-nos a um novo degrau de evolução? Poderíamos encontrar em suas páginas algo acerca do surgimento de uma Noosfera?

Antes de prosseguir em nossa investigação sobre o tema, proponho uma digressão. Estamos entrando no terreno sagrado da subjetividade. Portanto, sugiro que descalcemos nossos pés de toda e qualquer presunção. Sigamos à risca a recomendação de Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.”

Nenhuma teoria, por mais elaborada que seja, tem a palavra final quando se trata da alma humana. Por isso, nossas sandálias não nos servem aqui.

Quando Moisés apascentava o rebanho de seu sobro no deserto, teve uma visão em que um arbusto se incendiava, porém, não se consumia. Suas folhas e ramos permaneciam intactos. O inusitado fenômeno fisgou sua atenção, de modo que não resistiu à curiosidade e resolveu se aproximar para conferir. Provavelmente, Moisés se perguntou se aquilo seria real ou apenas fruto de sua imaginação. De repente, do meio da sarça ouviu-se uma misteriosa voz: “Não te chegues para cá; tira as sandálias de teus pés; porque o lugar em que pisas é terra santa.”[1]

O que Deus queria dizer com “terra santa”? Será que se tratava de um território demarcado pela divindade? Se fosse este o caso, por que Moisés, a exemplo do que fizeram outros patriarcas hebreus, não edificou ali um altar? Era de se esperar, uma vez que a voz se apresentou como sendo o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó, seus ancestrais. Talvez até lhe tenha ocorrido a ideia. Porém, o restante da fala de Deus fê-lo perceber que a o território sagrado a que se referia era outro e não uma localização geográfica específica. Observe:

“Tenho visto atentamente a aflição do meu povo, que está no Egito, e tenho ouvido o seu clamor por causa dos seus exatores, porque conheci as suas dores. Portanto desci para livrá-lo da mão dos egípcios, e para fazê-lo subir daquela terra, a uma terra boa e larga, a uma terra que mana leite e mel.” Êxodo 3:7-8a

O Deus dos patriarcas não abandonara Seu povo à própria sorte. Pelo contrário. Ele observava atentamente a sua aflição sob o regime escravagista imposto pelos egípcios. Se ficasse só na observação, Deus não passaria de um voyeur sádico assistindo apático ao desenrolar da trama humana. Ele diz que também ouvia o clamor dos hebreus. Mas também não era suficiente ver e ouvir. Não bastaria nem mesmo ser empático. Ele declara conhecer as suas dores. Por isso, resolveu dar um passo além, descendo para livrá-los. Imagine: uma divindade que desce, que se rebaixa, que pisa o chão da existência, só para intervir em favor do Seu povo. Isso é mais do que empatia, é compaixão. E repare que Ele desce para fazê-los subir. Terra santa é todo solo onde Deus resolve pisar. Terra santa é toda causa que Ele decide assumir. Terra santa é a alteridade, a subjetividade com suas idiossincrasias. Contrariando Sartre, o existencialista francês, o outro não é o inferno, mas um terreno sagrado.

O Deus revelado nas Escrituras não é uma divindade apática, que se mantém distante do dilema humano. Em vez disso, mergulha de cabeça na existência, intervindo para livrar Sua criação e elevá-la juntamente com Ele.

Moisés estava sendo comissionado a participar desta intervenção divina, servindo-lhe de porta-voz. Sua experiência como príncipe do Egito não lhe serviria. Ele teria pisar descalço nesse solo sagrado.

Descalçar os pés também aponta para vulnerabilidade de nossa condição humana. Somos chamados a abraçar esta condição, sem nos proteger. Chamados a conhecer a dor humana em toda a sua intensidade.  Parafraseando Caetano Veloso, somos enviados ao mundo como Moisés a Faraó, para conhecer in loco com cada um a dor e a delícia de ser o que é.

Não há aqui lugar para presunção, nem precaução desmedida. Quem está na chuva é para se molhar.

O calçar as sandálias da preparação do evangelho da paz conforme recomendado por Paulo[2] é justamente descalçar-se, engrossando assim o número de paradoxos encontrado nos evangelhos e epístolas. Paradoxos do tipo o menor será o maior, os últimos serão os primeiros, quando se está fraco é que se é forte, o poder se aperfeiçoa na fraqueza, quem quiser salvar-se acabará se perdendo e quem se deixar perder acabará se salvando, etc.

A palavra ouvida por Moisés naquele dia só viria a se cumprir cabalmente quando Deus Se fizesse um de nós na pessoa de Seu Filho Jesus Cristo. Paulo nos retrata isso no processo que a teologia chama de Kenósis[3]:

“Portanto, se há algum conforto em Cristo, se alguma consolação de amor, se alguma comunhão no Espírito, se alguns entranháveis afetos e compaixões, completai a minha alegria, para que sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa. Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo. Não atente cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros. De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.”
Filipenses 2:1-8

Assim como Moisés, o Filho de Deus também teve que se descalçar para experimentar a condição humana. Talvez por isso, ao vê-lo vir ao seu encontro para ser batizado, João Batista tenha dito que não era digno de desatar Suas sandálias. Foi a partir daí que Ele iniciou Seu ministério terreno.

Paulo toma a Kenósis de Cristo como uma convocação a que também a experimentemos. Somos chamados a descalçar os pés e a pisar no solo sagrado da subjetividade, que inclui tanto a consciência, quanto o inconsciente. Nossos pressupostos, preconceitos, técnicas, teorias, presunções, devem ser postos de lado para não comprometer nossa abordagem. Repare bem na recomendação do apóstolo: “Se há algum conforto em Cristo, se alguma consolação de amor, se alguma comunhão no Espírito, se alguns entranháveis afetos e compaixões...” O que nos oferece conforto nesta empreitada é a certeza de Sua companhia. Não estamos sós. É a Sua presença que torna sagrado o terreno em que pisamos. É a convicção de que somos amados que nos consola. É o Seu Espírito que possibilita a comunhão entre nós e os demais. Ele pavimenta o caminho que nos faz acessar o outro. Comunhão é koinonia, palavra grega que significa “comunicação”, “ter algo em comum”. Esta comunhão patrocinada pelo Espírito provoca em nós o que Paulo chama de “entranháveis afetos”; isto é, somos intimamente afetados por aquilo que afeta os demais. Não apenas vemos e ouvimos, mas também participamos da sua dor. Não é algo de pele, superficial, mas visceral. 

Acho que nesta passagem, Paulo vai mais longe do que Chardin. Em vez de uma noosfera, que seria, por definição, uma esfera de pensamentos, o apóstolo nos propõe o que eu ousaria chamar de koinosfera: uma esfera onde todas as coisas inerentes à nossa condição humana se tornem comuns, a começar pelos sentimentos. Como bem disse Jung, “quando pensamos, fazêmo-lo com o fim de julgar ou chegar a uma conclusão; quando sentimos, é para atribuir um valor pessoal a qualquer coisa que fazemos.”

Não se trata apenas de saber o que outro sabe, de crer no que o outro crê, mas de sentir o que o outro sente. Isso só é possível quando nos abrimos ao mesmo sentimento que houve em Cristo, que sendo em forma de Deus, preferiu rebaixar-se à condição humana, esvaziando-se por completo. Ele desceu todos os degraus, fazendo-se escravo desprovido de qualquer direito, entregando-se para morrer como um meliante, mesmo sem jamais ter cometido nada que o fizesse merecer aquilo.

O evangelho nos propõe dar um passo além da empatia. Digamos, para fins didáticos, que empatia seria o equivalente a calçar as sandálias do outro. Compaixão é descalçar-se para pisar o mesmo chão. A empatia nos faz entender o que o outro passa. A compaixão nos faz sentir o que o outro sente. Por que não basta calçar as sandálias do outro? Por que a empatia não é suficiente? Talvez Jung tenha a resposta: “Uns sapatos que ficam bem numa pessoa são pequenos para uma outra; não existe uma receita para a vida que sirva para todos.”

Nunca daremos conta de entender plenamente o outro. O outro é, por assim dizer, incognoscível. Um mistério que só é superado pelo mysterium tremendum: Deus! Qualquer tentativa neste sentido constitui-se numa profanação de um território sagrado. Portanto, resta-nos uma abordagem reverente que busque sintonizar-nos com os seus sentimentos, ainda que não logremos decodificá-los.

O amor derramado profusamente em nossos corações através da concessão do Espírito Santo[4] nos habilita a estar conectados uns aos outros num nível que jamais teria sido possível de outra maneira. No dizer do apóstolo, temos agora a mente de Cristo.[5] Estamos aptos a ver o que nossos olhos não viram, a ouvir o que nossos ouvidos jamais ouviram e a sentir o que teve origem no coração de Deus e daqueles que com Ele estão conectados pelo Espírito.[6] Comunhão! Esta é a palavra. Infelizmente, o seu significado ficou restrito ao relacionamento entre Deus e o homem. Porém, o mesmo apóstolo que disse que “nossa comunhão é com o Pai, e com seu Filho Jesus Cristo”[7], também afirmou que “o que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão conosco”, e que “se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros.”[8] Obviamente, esta comunhão é possibilitada quando compartilhamos o evangelho com os demais. Porém, ela não para aí. Não se trata de partilhar sua fé apenas. Paulo escreve aos Tessalonicenses que estes lhes eram tão afeiçoados, que de boa vontade ele queria partilhar-lhes não somente o evangelho, mas a sua própria alma.[9]

Quando partilhamos o evangelho, tudo quanto queremos é que as pessoas sejam partícipes da mesma alegria que nos invadiu a alma no momento em que ouvimos a boa nova. Porém, antes de apresentar-lhes a razão de nossa esperança, devemos nos abrir a receber deles a razão de sua angústia. Comunhão é uma via de mão dupla.

Repare, por exemplo, na recomendação do escritor sagrado:

“Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles, dos maltratados, como sendo-o vós mesmos também no corpo.” Hebreus 13:3

Não basta uma simples lembrança. Isso seria muito raso. Devemos, antes, nos imaginar presos e maltratados juntamente com eles. Enquanto não nos dispusermos a sentir suas dores, não poderemos compartilhar-lhes nossa alegria. E com isso, nossa alegria jamais será plena. Ou não é isso que Paulo diz na passagem em que aborda a Kenósis de Cristo? Ao mencionar os tais“afetos entranháveis”, ele arremata: “Completai a minha alegria, para que sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa.” E um pouco abaixo, ele diz: “Não atente cada um somente para o que é seu, mas cada qual também para o que é dos outros. De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus.”[10]

Este era o padrão seguido pelos cristãos primitivos, que em vez de estarem preocupados com o que possuíam, preocupavam-se com o que podiam repartir com os demais. Não por uma imposição dos apóstolos, mas por nutrirem uns pelos outros o mesmo sentimento que houve em seu mestre. Lucas, o evangelista, dá testemunho disso em seu relato:

“Era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas eram compartilhadas.” Atos 4:32

Ninguém era obrigado a nada. Tudo era feito com absoluta espontaneidade, uma vez que o evangelho não trabalha com imposição. Algo compulsório não poderia ser fruto de uma consciência constrangida pelo amor. Lembremo-nos de que “o amor de Cristo nos constrange”[11], de modo que não desejamos mais viver para nós mesmos.

Foi este amor que fez com que os gálatas acolhessem a Paulo num dos momentos mais críticos de sua vida, quando estava acometido de uma enfermidade nos olhos, talvez até contagiosa. Repare a intensidade de seu relato:

“E vós sabeis que primeiro vos anunciei o evangelho estando em fraqueza da carne. Embora minha enfermidade na carne vos fosse uma tentação, não me rejeitastes nem me desprezastes; antes me recebestes como a um anjo de Deus, como ao próprio Cristo Jesus. Qual é, logo, a vossa alegria? Dou-vos testemunho de que, se possível fora, teríeis arrancado os vossos olhos, e os teríeis dado a mim.” Gálatas 4:13-15

Onde impera o amor, não há porque disfarçar nossas fraquezas. Somos levados a acolher uns aos outros independentemente de sua condição física, emocional, financeira ou espiritual. Porém, isso não significa ser indiferente ao sofrimento do outro. Pelo contrário. Os gálatas se dispunham a fazer qualquer coisa para atenuar o sofrimento de seu mentor espiritual.

Que bom seria se os líderes espirituais de nosso tempo se desvencilhassem desta espiritualidade de fachada, sempre preocupados em parecer bem aos olhos de seus fiéis, como se qualquer admissão de fraqueza atentasse contra a credibilidade de seus ministérios. Foi ninguém menos que o grande rei Davi quem disse que quanto mais se expunha ante os seus súditos, mais eles o honrariam.

O mundo não busca líderes impecáveis, opulentos, mas francos e coerentes.

Tais quais os líderes são os que os seguem. Daí vermos tantos cristãos intragáveis que arrotam arrogância e acabam vacinando as pessoas à sua volta contra o evangelho. Como disse o dramaturgo romeno Eugène Ionesco, "ideologias nos separam, sonhos e angústias nos unem".


Em Sense8, somente oito pessoas são dotadas do dom que as faz partilhar dos mesmos sentimentos. Porém, a proposta de Cristo vai muito além disso. Um dia, todos os homens sentir-se-ão ligados uns aos outros, de modo que a injustiça feito a um, será como se houvesse sido sofrida por todos. Somente assim, este mundo poderá se tornar naquilo com que seu criador sonhou na eternidade. 





[1]Êxodo 3:1-8a
[2]Efésios 6:15
[3]Kenósis – Esvaziamento
[4]Romanos 5:5
[5] 1 Coríntios 2:16
[6] 1 Coríntios 2:9-10
[7] 1 João 1:3
[8] 1 João 1:7
[9]1Tessalonicenses 2:8
[10]Filipenses 2:2,4
[11] 2 Coríntios 5:14
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